Berlinale 66 (Dia 2): Fugas Para a Frente

A competição aos Ursos começou hoje a sério, mas com um arranque um pouco frouxo e com três filmes pouco mais que interessantes, que tem em comum serem histórias de fugas: ‘Hedi’, uma primeira obra do tunisino Mohamed Ben Attia; ‘Midnight Special’, uma inusitada obra entre o thriller e a ficção cientifica da promessa norte-americana Jeff Nichols; e por último um filme frio e seco intitulado ‘Boris Without Beatrice’, do canadiano Denis Coté, que é normalmente um cineastas de emoções quentes e fortes.

Berlinale 66
Hedi, o filme tunisino.

‘…uma história pessoal que amplia um retrato de uma sociedade em convulsão, que procura romper com as tradições…’

O tunisino Mohamed Ben Attia estreou-se aqui na Belinale 66, com Hedi, um filme produzido pela dupla de realizadores belgas: Irmãos Dardenne. Trata-se de um drama romântico  sobre Hedi, um jovem tunisino, que não consegue escapar às decisões de uma mãe demasiado super-protetora. Incapaz de pensar pela sua própria cabeça, deixa que a mãe, estabeleça um casamento combinado. Um dia o patrão decide enviar Hedi para outra cidade, a poucos dias do seu casamento, acontece o esperado: no hotel em Mahdia, o jovem Hedi conhece uma animadora-turística chamada Rim e apaixona-se por ela com ela. Rim vai aparentemente fazer  com Hedi consiga escapar às sua prisões internas e externas. Hedi, de Mohamed Ben Attia, é filmado ao estilo intimista e observacional, típico dos dois mestres belgas que o ‘apadrinharam’, trata-se de uma história pessoal que amplia um retrato de uma sociedade em convulsão, que procura romper com as tradições, não apenas relativamente aos direitos das mulheres. Neste caso é sobre um jovem de vinte e poucos anos que oscila entre a felicidade e as dores da liberdade.

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‘Midnight Special’, parece-se com ‘E.T.’.

‘…Jeff Nichols mudou um bocadinho o seu género, de thriller psicológico, mas permanece fiel a si mesmo no essencial da sua obra anterior…’

Midnight Special, do cineasta do ‘novo suspense’ Jeff Nichols (Procurem Abrigo, 2011) é uma combinação entre a ficção científica e saga familiar. Nichols parece, no entanto insistir em explorar, algumas das paranóias da América, da violência e das vivências nas pequenas cidade do interior americano, mostrando por exemplo como as religiões mais conservadoras e as seitas têm grande influência, nas pessoas e depois logo no aparelho do Estado, algo que se vem tornando cada vez mais agressivo e limitador das liberdades individuais, sobretudo depois do 11-S. Roy (sempre Michael Shannon) enceta uma estranha fuga com o seu filho de oito anos de idade, perseguido pelo FBI, num ‘road movie’, que no início parece indecifrável mas que nos vai aproximando de uma história incrível, não sem algumas contradições. Aos poucos, vamo-nos apercebendo que o miúdo tem poderes extraordinários, e por isso usa uns óculos de proteção. Os extremistas religiosos estão interessados ​​no miúdo, bem como os funcionários do governo americano, todos o querem apanhar, numa história que faz lembrar, E.T. – O Extraterrestre. Em Midnight Special, o realizador Jeff Nichols mudou um bocadinho o seu género, de thriller psicológico, mas permanece fiel a si mesmo no essencial da sua obra anterior, juntando agora à violência inusitada, uma história de sacrifício de um pai para salvar um filho que pode mudar os destinos do mundo.

Berlinale 66
‘Boris Without Beatrice’, um retrato da sociedade canadiana.

‘…é de facto um   filme frio e seco, que tenta combinar com alguma precisão a sátira com um intrigante quadro da sociedade canadiana….’

Depois do brilhante Vic + Flo Viram Um Urso (que esteve aqui na competição da Berlinale 2013) o realizador canadiano Denis Coté faz com Boris Without Beatrice, uma nova incursão no thriller psicológico. Algures no Québec, o elegante Boris Malinovski (James Hyndman) atravessa uma fase da vida em que vai impondo a sua arrogância implacável, perante os outros. É um homem altamente sofisticado que só veste roupa de marca. No entanto, o seu asséptico mundo começa a vacilar quando sua esposa uma igualmente bem sucedida, ministra do governo canadiano, fica acamada com uma profunda depressão e cuidada numa casa de férias remota longe da cidade. Boris recebe telefonemas de um estranho que lhe pede para se encontrar na floresta no meio da noite. O misterioso homem (Denis Lavant) vai confrontando Boris com todo o tipo de perguntas que este preferia não ter que responder. Sente-se cada vez mais perseguido e começa a ter dificuldade em livrar-se dos seus demónios. Boris Without Beatrice, é de facto um   filme frio e seco, que tenta combinar com alguma precisão a sátira com um intrigante quadro da sociedade canadiana, e que leva o espectador para dentro da mente de um homem forçado a confrontar-se com os seus pecados (um rápido enriquecimento!!) e  que aos pouco vai perdendo o controle de sua vida. A história de Tártaro ou uma metáfora do ‘gigante com os pés de barro’.

JVM

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