Cinema Europeu? Sim, Por Favor | À Sombra das Mulheres

Auxiliando-se de uma espécie de quadrado amoroso protagonizado por Clotilde Courau, Stanislas Merhar, Lena Paugam e Mounir Margoum, Philippe Garrel traz-nos em À Sombra das Mulheres um drama familiar sobre o medo e o ciúme que toldam relações de amor… e desamor. 

Pierre e Manon são casados há já algum tempo. Ele é realizador e está a trabalhar num documentário sobre um herói da Segunda Grande Guerra; ela tem um emprego em “part-time”. O dinheiro escasseia e eles vão subsistindo como podem ao dia-a-dia. Um dia, ele conhece Elisabeth, uma rapariga mais jovem, com quem inicia uma relação extraconjugal. Manon, por seu lado, também lhe é infiel com um outro homem. Apesar de ambos se continuarem a amar e da sua traição não resultar da paixão por outras pessoas, nada entre eles se manterá intacto…
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São uns económicos 73 minutos que chegam para uma sóbria exploração de observações microsópicas da infidelidade parisiense que tanto vai buscar à saudosa Nouvelle Vague para inspiração dos seus trabalhos, mas também aos nostálgicos romances dos anos 60 – o narrador em voice-over (que não curiosamente é o filho, Louis Garrel), os apartamentos apertados e desarrumados, as relações condenadas, o preto-e-branco, as performances são profundamente naturalistas.

Não sendo uma comédia assumida – apresentando-se, antes de mais, como um drama romântico – À Sombra das Mulheres tem, no entanto, muitas observações satíricas e dolorosamente irónicas a fazer das suas figuras centrais, ainda que caminhe com cuidado entre os estilhaços das relações quebradas para não vilanizar ninguém. De facto, e não obstante o título, demora-se a investigar a psique masculina de formas altamente desconfortáveis e enervantes – e Garrel orquestra tudo isto de forma tão positivamente inexpressiva que a linha entre o ridículo e o estritamente cruel é difícil de distinguir, particularmente na atitude hipócrita de Pierre em relação à companheira Manon.

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Mas ainda estranham a nossa classificação de “comédia escondida”? Experimentem então observar o que Garrel quer mostrar com a ridicularização da parelha profissional entre Manon e Pierre – a primeira que o idolatra como um génio do seu tempo, o segundo o “realizador” limitado que nada dirige a não ser questões básicas que qualquer jornalista faria. A cereja no topo do bolo é um dos mais agradáveis twists de Garrel que neste texto não arruinaremos.

Perante o impiedoso império dos blockbusters de Hollywood, é uma espécie de exemplar da Resistência Francesa, naturalista, sóbrio, onde a salvação do mundo substitui a ascensão de um grupo de super-heróis por um sorriso tardio. Aqui há Cinema.


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