Força Maior, em análise

 

força maior

 FICHA TÉCNICA

  • Título Original: Turist
  • Realizador: Ruben Östlund
  • Elenco: Johannes Kuhnke, Lisa Loven Kongsli, Clara Wettergren
  • Género: Drama
  • Alambique | 2015 | Suécia | 120 min

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Se “Em Parte Incerta” é o apunhalar macabro do coração da instituição do casamento, “Força Maior” é a tempestade que o precede.

Ebba e Tomas decidem passar cinco dias de férias a esquiar nos Alpes franceses com os seus dois filhos, Harry e Vera. Tomas tenta dedicar mais tempo à família, já que Ebba acha que trabalha demais. Mas quando os quatro almoçam num restaurante nas montanhas, uma avalanche aproxima-se inesperadamente e ameaça soterrar o local. Um impulso instintivo ditará o futuro da dinâmica desta família.

Os peões organizam-se em jogo a ritmo calmo mas seguro para aquela que tem tudo para ser uma história comum de sobrevivência, um melodrama onde o núcleo parental trabalha conjuntamente para resolver uma situação de crise.

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Contudo, o realizador Ruben Östlund não podia estar menos interessado em oferecer-nos um produto de digestão rápida ao qual já estamos habituados. Em vez disso, um enredo de catástrofe natural é substituído por uma exposição de cataclismo humano, onde o terror não se encontra nas forças desconhecidas da natureza mas nos recantos mais sombrios dos instintos humanos.

O absurdo e o angustiante tomam as rédeas à medida que “Força Maior”, um exame profundo à gestão da crise num casal com traços desconfortáveis de hilariante deboche, nos desarma e despe perante a confrontação com as consequências de uma escolha escorregadia. Não temos para onde fugir, e as questões que são colocadas na ficção, rapidamente ganham alojamento nos recantos do nosso cérebro – como reagiria? O que faria? Que tipo de pessoa sou? Um herói ou um sobrevivente?

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O retrato da família perfeita é rapidamente distorcido pelo fantasma da disfunção, e a queda, em câmara lenta, do castelo de cartas é absolutamente fascinante. A premissa é extraordinariamente rica em poder dramático, e Östlund explora-o com uma precisão cirúrgica. O tema do instinto de sobrevivência que vive por debaixo da capa de segurança do comportamento civilizado e politicamente (e socialmente) correto não é propriamente novo, mas o facto de ser criado e alimentado por um acontecimento tão mundano faz parte do seu fascínio.

Enquanto somos pontualmente assaltados pelo tempestuoso concerto de Vivaldi, a linguagem visual de Östlund diz-nos tanto como os seus diálogos, alternando entre planos magistrais do exterior nas imensas pistas de ski e segmentos apertados da família no hotel, onde todos se amontoam, mal cabendo no enquadramento.

Além de uma edição peculiar e do pecado da recorrência de alguma repetição, o filme tem ainda um fecho que tem sido celebremente discutido como despropositado ou estranho, alicerçando-se num bizarro acontecimento num autocarro para, quiçá, deixar no ar a possibilidade da vulnerabilidade no plano matriarcal. O final é aberto à interpretação, mas talvez também um formalismo necessário à estrutura de um filme que se edifica a partir das questões que (nos) coloca.

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Como um livro de conclusões por explorar, “Força Maior” é um ensaio de traços subtis mas cortantes sobre as nossas hipocrisias, e uma obra de implicações desconfortáveis e reflexões de tirar o sono empacotada numa sátira brutal à masculinidade do séc. XXI.

E parece que este país não é para homenzinhos.

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