DocLisboa ’16 | Do Not Touch Me!, em análise

Em Do Not Touch Me! acompanhamos um grupo de adolescentes sicilianos no verão que antecede o começo de uma nova etapa nas suas vidas, o secundário.

Do Not Touch Me! é uma escolha bastante interessante para este filme que constitui a mais recente obra da cineasta italiana Ludovica Tortora de Falco. É que, ao contrário do que a exclamação negativa do título possa indicar, este é um filme onde tais epítetos de distanciamento e pudor estão bem longe de se manifestar. De facto, a câmara de Falco é perspicaz na captura dos toques e linguagem corporal dos seus protagonistas adolescentes, como que registando e tentando capturar o fulgor passageiro da sua juventude numa idade de transições e atribulado crescimento.

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Indo buscar a sua estética à crueza do cinema verité, a realizadora aproxima-se e filma o quotidiano de um grupo de jovens durante um verão em Palermo. Com luz natural, enquadramentos improvisados e desconfortáveis composições limitadas por espaços pequenos, Do Not Touch Me! alcança esse tão elusivo tom de realismo casual, apesar do filme estar bastante longe dos pretensiosismos do cinema “fly on the wall”. Aliás, são muitas as ocasiões em que a cineasta interroga Fabrizio, o protagonista de 13 anos, e este lhe responde diretamente para a objetiva. Mesmo quando, por exemplo, o vemos em casa da namorada a ouvir música no telemóvel narcoléptico dela, a presença da câmara e sua ligeira intrusão é inquestionável. É um testamento à relação de intimidade amigável entre a cineasta e os sujeitos e, por consequência, a audiência e os jovens, que nunca entendemos este filme como uma obra de desconcertante voyeurismo.

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Para além da omnipresença invisível e subentendida de Falco, mais nenhum adulto aparece em cena, dando a entender que estes miúdos vivem numa espécie de limbo. Não é somente a sua idade transitória que os coloca nesse lugar indefinível de espera, mas também esse isolamento que nunca os parece preocupar. De certo modo, eles são como as crianças que Peter Pan lidera na Terra do Nunca, mas aqui, ao invés da segunda estrela à direita, a ação decorre na Sicília, bem perto de Lampedusa, onde a crise dos refugiados está ao rubro e onde decorre um dos grandes documentários deste ano.

Mas, voltando ao conceito de limbo, há que se apontar como a idade dos protagonistas se reflete tanto nos seus corpos, como na sua atitude e situação atual. É que, quando encontramos Fabrizio e os seus amigos, eles estão prestes a terminar o ensino obrigatório e estão no precipício de um futuro incerto. Pela sua parte, o protagonista confessa à cineasta, numa conversa à luz azulada do crepúsculo siciliano, que está a pensar em ir para uma escola profissional de modo a arranjar trabalho como empregado de mesa. Mais tarde, e sem falar diretamente para a câmara, ele já conjetura que se calhar nem vai continuar a estudar, escandalizando a sua namorada que pensa em um dia ser uma advogada, ou talvez médica.

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Nessa conversa final entre Fabrizio, Aurora e outro dos seus amigos, vemos o trio na praia, divertindo-se entre as rochas e ondas, mais uma vez isolados do resto do mundo e com um futuro pela frente que apenas lhes apresenta incertezas, sonhos improváveis e resignação. Apesar da casualidade e modesto otimismo que caracterizam a maior parte deste filme, existe também uma contracorrente de melancolia na observação humilde e simplista de Falco, algo que é ainda mais salientado pela certeza que a própria adolescência e presente existência pacífica das personagens, não é mais que uma efemeridade com os dias contados. No entanto, também se tem de admitir que, não obstante algumas complexidades melancólicas, Do Not Touch Me! é uma obra de absoluta humildade e simplicidade, rejeitando criar qualquer tese ou opinião sobre as vidas que retrata o que é bastante desapontante. Com a riqueza de material aqui reunido, seria de esperar algo mais grandioso ou revelador que o que acabamos por ver, um documentário sólido e agradável mas que peca por uma grande falta de complexidade na sua observação e derradeiras conclusões.

O MELHOR: A franqueza e falta de julgamento da parte de Falco face aos comportamentos mais imaturos dos seus sujeitos.

O PIOR: A relativa falta de ambição que limita muito as possibilidades intelectuais e dramáticas do filme.


 

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Título Original: A Noi ci dicono
Realizador:  Ludovica Tortora de Falco

DocLisboa | Documentário | 2016 | 65 min

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