Mountainhead – Análise
[Nota do editor: este artigo inclui spoilers] O primeiro filme do criador da aclamada série Succession, Mountainhead, chegou ao streaming no passado sábado (31), trazendo para os ecrãs temas bastante familiares ao realizador: o dinheiro e o poder.
Randall Garrett (Steve Carell), Venis Parish (Cory Michael Smith), Jeffrey Abredazi (Ramy Youssef) e Hugo Van Yalk (Jason Schwartzman). Eis os quatro bilionários que “Mountainhead”, da HBO Max, nos apresenta em retiro numa mansão luxuosa entre as montanhas de Utah, nos EUA.
No entanto, enquanto todos procuram (supostamente) divertir-se nestas férias, completamente alheados da realidade (não fossem então magnatas), o mundo enfrenta uma crise sem igual. Crise essa, na verdade, instigada pelos sucessores do atual ChatGPT… Os quais, afinal, estão mais próximos de nós do que imaginaríamos – ou até já se encontram mesmo ao nosso lado…
Mountainhead: uma irrealidade ao fim e ao cabo bem real
Venis, mais conhecido por ‘Ven’, é o CEO da Traam. Trata-se de uma rede social que, após atualização recente, passou a possibilitar a criação e partilha de imagens geradas por Inteligência Artificial. Mais concretamente ‘deepfakes’ praticamente indistinguíveis da realidade. Jeff, por sua vez, é dono de outra empresa de IA: a Bilter. Esta, por outro lado, especializa-se na verificação de factos e no combate à desinformação. Neste sentido, Parish é o mais rico do grupo e a ele logo se segue Abredazi.
Já Randall e ‘Souper’ – alcunha de Hugo por ser o menos abonado dos quatro ‘tech bros’, visto que ‘Souper’ remete para ‘sopa comunitária’, como explicam no filme – têm outras posições… Mas igualmente lucrativas, atenção: o primeiro vive dos investimentos que faz em tecnologias militares e de vigilância, sendo já um veterano no meio agora empenhado em encontrar uma cura transumanista para o seu cancro terminal, e o segundo possui uma ‘super-app’ de ‘lifestyle’, a Slowmo, que almeja que atinja o estatuto de unicórnio. Ou seja, de ‘startup’ que alcance uma valorização de mercado acima de 1 bilião de dólares.
Estes homens, idênticos aos verdadeiros ‘Elon Musks’ e ‘Mark Zuckerbergs’ da contemporaneidade, possuem egos do tamanho do mundo, por isso acreditam que o podem mudar em questão de segundos. E de facto, e infelizmente sobretudo, podem devido à sua fortuna incalculável que num futuro próximo, – talvez já presente (?)) – como nos mostra “Mountainhead”, permitir-lhes-á adentrar na política internacional sem consequências, falando sobre o cometimento de conspirações, mais precisamente golpes de estado, como se fossem meras jogadas de xadrez.
Efetivamente, para estes ‘pseudo-reis à Silicon Valley‘ tudo na vida não passa de lances daquele jogo onde o único propósito é ganhar dinheiro… Mesmo que o tabuleiro quebre.
Primeiro filme de Jesse Armstrong tenta morder os bilionários… Mas não crava os dentes
O crítico Vítor Carvalho, depois de ver o trailer do filme, deixou uma pergunta no ar: “(…) ainda não sabemos se “Mountainhead” será uma sátira pura, um thriller de sobrevivência ou uma metáfora sobre o colapso do capitalismo tardio”. Ora, no fundo, acaba por ser um pouco de todos. E essa hibridez no género até podia ser uma mais-valia, mas, neste caso, na maioria das vezes apenas desemboca em momentos de cacofonia – ainda que resulte noutros.
A componente satírica de “Mountainhead” muitas vezes resvala para uma comédia leviana, perdendo, assim, o seu propósito e, por sua vez, o seu impacto. Com efeito, são várias as cenas em que não percebemos ao certo para onde é que o realizador nos quer levar (se é que nos quer levar a algum lado).
Os diálogos entre as personagens são tão absurdos e egoístas que nos levam a questionar se não estaremos a perder QI com a visualização da obra. Claro que tal indagação é o resultado de um trabalho meritório por parte de Armstrong, que é também o guionista da longa-metragem. Mas o facto dos diálogos surtirem o efeito desejado não chega para vingar “Mountainhead”.
O seu ‘pacing’ começa a tornar-se aborrecido e repetitivo. Deste modo, a curiosidade e o interesse que nos restam servem somente para descortinar os diálogos… E não necessariamente para aguardarmos pelo desfecho daqueles tamanhos egocêntricos.
Em suma, “Mountainhead” quer ser ‘eat the rich’, mas não lhe chega sequer aos calcanhares.
Já viste Mountainhead? Gostaste?
Mountainhead
Conclusão
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Concluindo, “Mountainhead” parece (?) ter várias pretensões… Mas que não passam disso mesmo. Atira para todos os lugares e por isso não acerta em cheio em lado algum. O seu final não surpreende ninguém, pois não é de suspeitar que aqueles homens não sejam confiáveis, principalmente quando Jesse Armstrong os caracteriza, desde o início até ao final do filme, como altamente umbiguistas e, sob consequência direta (e óbvia), detestáveis. O único pelo qual sentimos alguma empatia é Jeffrey. No entanto, esse sentimento rapidamente se dissipa, dado que, apesar de ele ser mais consciente que os outros três, não faz absolutamente nada para demover o mundo do seu curso rumo ao fim dos tempos.