A Criança N.º 44, em análise

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 FICHA TÉCNICA

  • Título Original: Child 44
  • Realizador: Daniel Espinosa
  • Elenco: Tom Hardy, Gary Oldman, Noomi Rapace
  • Género: Drama, Thriller
  • 2015 | 137 min

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A Criança N.º 44 é adaptado do livro de Tom Rob Smith, publicado em 2008, um best-seller cuja força, em parte ficcional, em parte originária da realidade, residiu na sua teia policial de alicerçada construção. The Guardian declarou-o uma “constrangedora história de detectives”; The Sunday Telegraph elevou-o a uma “estreia memorável”, acrescentando que “a atmosfera de paranóia e medo paralisantes é retratada de forma brilhante e persistentemente severa”.

Tal como a obra, a produção de Ridley Scott aborda os crimes de Andrei Chikatilo, também conhecido como Butcher of Rostov, condenado por 52 crimes na União Soviética.

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Num só campo de batalha, são apresentados, de um lado, a Rússia de Stalin, o herói de guerra e a caça aos traidores. Do outro lado, aparecem a liberdade, o amor e a confiança. No centro, sucedem-se crimes hediondos, à espera de ser esclarecidos.

Indigitado para desvendar traições perpetradas por opositores ao regime de Stalin, está Leo Demidov (Tom Hardy), órfão cujos progenitores morreram na Ucrânia, tendo ele encontrado uma nova família no exército russo. Como marido, Leo, casado com Raisa (Noomi Rapace) faz constantemente passar a imagem de pilar protector e parceiro imaculado. Como herói de guerra, e em comparação com Vasili (Joel Kinnaman) sobressai pelo carácter sensível e intolerante à violência.

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A sucessão de crimes que, subitamente, aterra na Rússia – existirão homicídios no Paraíso, na sociedade que proclama ser o Eden? – transporta Leo para outro patamar de investigação e, isto, a par de uma peculiar acusação de traição bem próxima da sua pessoa. A reacção àquela acusação mudará o trajecto de Leo, as suas relações com colegas e superiores, pois o motor das mesmas é a lealdade partidária, o patriotismo soviético.

O sueco D. Espinosa é daqueles realizadores que, muito embora e até aqui, não se recordem pelos marcantes feitos cinéfilos, sabem filmar uma cena com paixão. Uma paixão visceral. Aponta-se, desde logo, para os primeiros minutos de filme – a captura de Anatoly (Jason Clarke); e, já talvez com umas boas duas horas de visionamento, a luta dentro de um comboio, onde participam Raisa e Leo.

E esta consideração leva-nos a Nicolas Winding Refn (Drive, Only God Forgives, Bronson, Valhalla Rising). É certo que Espinosa limita-se a beber umas gotas da capacidade para a crueza de N. W. Refn, mas é notório o contágio entre países de origem. O arrebatamento de luzes, câmara, acção, a este nível, converge.

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Infelizmente, as sólidas representações, em especial a de Tom Hardy – quando se prepara para um papel, não aceita ficar aquém, nem da película nem do restante cast – e a pujante carga de acção inerente a algumas das cenas captadas por D. Espinosa, não escondem a imperfeição no tratamento do script.

A mistura de vários plots – aqui uns mais cativantes do que outros – exige uma noção e gestão de tempo que se compadeça com uma plena cobertura do enredo. A realização falha o seu objectivo, ao não culminar numa satisfatória ou clara explicação de cada uma das histórias em causa, deixando uma sensação de incompletude, dúvidas, questões parcialmente respondidas.

Excepcionalmente, ainda no âmbito do argumento, é francamente bem construído o percurso emocional de Raisa e Leo, a passo e passo deslindado, conduzindo-nos a conclusões que dão sentido ao campo da acção/reacção do lado feminino.

“Certainly paradise, whatever, wherever it be, contains flaws. (Paradisical flaws, if you like.) If it did not, it would be incapable of drawing the hearts of men or angels.” 

– Henry Miller, “Big Sur And the Oranges of Hieronymus Bosch”

Sofia Melo Esteves

 

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