Berlinale 66 (Dia 3): Dolorosos Caminhos Para a Liberdade

 

O documentarista italiano Gianfranco Rossi, apresentou ‘Fuocoammare’, um filme sobre o quotidiano da ilha de Lampedusa, um pretexto para abordar a questão dos refugiados que aportam à ilha diariamente. Na competição oficial também a francesa Mia Hansen-Love, estreou ‘L’avenir’, com Isabel Huppert numa professora de filosofia a reflectir sobre a vida e a liberdade.

O premiado documentarista Gianfranco Rosi (Sacro GRA foi Leão de Ouro em Veneza 2013) estreou na competição oficial Fuocoammare, um filme que captura com subtileza a vida na ilha italiana de Lampedusa, um dos pontos de chegada de milhares de refugiados do Médio Oriente e África, à procura de uma nova vida na Europa. Na verdade, haveria mais do que uma história para ir directamente ao assunto, só que Rosi prefere ir por outros caminhos menos óbvios e aí está a subtil grandiosidade deste Fuocoammare. Samuele tem doze anos e vive nesta bela ilha no Mediterrâneo, e como todos os miúdos da sua idade, nem sempre gosta de ir à escola, já que é melhor andar pelas rochas da costa ou brincar com a sua fisga. Só que a Lampedusa é o destino de milhares de homens, mulheres e crianças que tentam fazer a travessia da África, para o continente europeu, em barcos pequenos e decrépitos.

O jovem Samuele é o mote.
O jovem Samuele é o mote.

‘…Gianfranco Rosi aproxima-nos deste lugar tão real quanto simbólico, como a canção romântica ‘Fuocoammare’…’

A histórica ilha de Lampedusa (veio-me agora a memória de outra Europa de Tomaz di Lampeduza e de O Leopardo de Visconti) tornou-se ao longo da história uma espécie de metáfora da esperança e liberdade, mas agora da tragédia de vidas perdidas e corpos puxados para fora da água. Todos os dias os habitantes de Lampedusa são testemunhas da maior tragédia humanitária dos nossos tempos. Inteligentemente Gianfranco Rosi aproxima-nos deste lugar tão real quanto simbólico, como a canção romântica ‘Fuocoammare’, que dá título ao documentário. E nas observações diretas da vida quotidiana da ilha, mostra-nos mais do que imagens chocantes, o mundo emocional dos seus habitantes, que vivem num permanente estado de emergência e de alerta humanitário, como o extraordinário médico, que actua em várias especialidades. Fuocoammare é um belíssimo documentário livre de comentários ou denúncias, que vai descrevendo como os dois mundos se tocam e como se tenta diminuir a tragédia. Dando lugar ao espectador para julgar.

 
 

L'avenir
Isabelle Huppert é Nathalie.

Na sua quinta longa-metragem L’avenir, a realizadora francesa Mia Hansen-Love, deixou para trás o tema da juventude e em vez disso, explorou a meia-idade, através de um poderoso retrato de uma mulher, que dá a volta à vida com uma certa ironia. Nathalie (mais uma notável interpretação de Isabelle Huppert) ensina filosofia numa escola secundária de Paris. É uma mulher apaixonada pelo seu trabalho e gosta particularmente do prazer de pensar. Casada e com dois filhos, divide seu tempo entre a família, ex-alunos e velha mãe possessiva e hipocondríaca. Um dia, o marido de Nathalie anuncia-lhe que a vai deixar por outra mulher e a mãe morre. Com a liberdade que lhe é imposta Nathalie acaba felizmente por reinventar sua vida.

L'avenir
O filme trata a meia-idade.

‘A personagem de Nathalie retrata muito bem uma geração que está na casa dos 50…’

L’avenir é um filme muito interessante que gira à volta das questões da felicidade e da solidão, mas sobretudo sobre o valor relativo das coisas (e dos afectos!!), contra formas de vida mais ou menos estabelecidas e seguras: agora nada é definitivo, portanto é preciso estarmos preparados para a mudança. A personagem de Nathalie retrata muito bem uma geração que está na casa dos 50, que busca novas alternativas para a vida, que só a madurez e sabedoria da idade, lhe pode dar. L’avenir, mostra curiosamente como a filosofia pode ser prática e aplicada a nossa vida quotidiana.

 

JVM

 


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