The Surfer | Análise
[Nota do editor: Este artigo inclui spoilers do filme] Estreado no Festival de Cannes de 2024, The Surfer chegou agora às salas de cinema portuguesas (a 10 de julho). Trata-se da obra mais recente de Nicolas Cage e apresenta-o em pujança nos ecrãs – como já é, aliás, apanágio do ator.
Nicolas Kim Coppola (61) é um famoso ator e produtor de cinema norte-americano. Ele pertence à (também) célebre família Coppola, uma das mais influentes e distintas de Hollywood.
No entanto, para evitar acusações de nepotismo, ou seja, de favoritismo na indústria do entretenimento devido ao seu apelido, o ator decidiu adotar o nome artístico de Nicolas Cage. Para a escolha do mesmo ele inspirou-se, por sinal, no super-herói Luke Cage, da Marvel, e no compositor John Cage.
“Leaving Las Vegas” (1995), longa-metragem pela qual ganhou o Óscar de Melhor Ator, “Face/Off” (1997), a franquia “National Treasure” (2004 e 2007) são alguns dos seus projetos mais conhecidos. De facto, é enquanto ator que Cage é mais promissor.
The Surfer: quando o mar é palco de ego inflado
Um homem retorna à sua cidade natal na Austrália, uma estância balnear, com o objetivo de mostrar o lugar ao seu filho (Finn Little) e, sobretudo, surfar com ele naquele mar maravilhoso… Na verdade, o protagonista vê-o como idílico: fá-lo lembrar dos seus doces tempos de infância e, por isso, está empenhado em comprar uma casa aqui.
Contudo, um grupo de surfistas locais confronta-o, ameaçando a concretização daqueles simples desejos. Eles afirmam, com modos territorialistas, que “só quem vive em Luna Bay pode surfar em Luna Bay”… E podem ter a certeza que vão deixar isso bem claro.
Em The Surfer, território e testosterona empurram-se até ao limite e afogam-se no ridículo
Realizado pelo irlandês Lorcan Finnegan, – mais popular pelo seu “Vivarium” (2019) – “The Surfer” explora os múltiplos e complexos meandros da masculinidade tóxica. O culto à força física e a virilidade compulsória são os mais explorados, quer pela hipérbole, quer pelo humor, frequentemente combinados. E Nicolas Cage, como o “The Surfer”, é a epítome dessa hipérbole – e desse humor.
Levado à degradação máxima pelo conflito que encetou com aquele gangue de surfistas maníacos por querer permanecer naquele destino turístico – o que, por sua vez, despoletou o seu ego de macho alfa, dado que esse foi ferido e humilhado pelo grupo à frente do filho – o ator brilha como ninguém nesta produção. Mesmo que a sua personagem tresande a lixo.
No fundo, ele personifica a estupidez daquela cultura superficial e violenta (a da masculinidade tóxica, entenda-se) que jamais abdica dos seus fins, que insiste em lutar apenas “porque é homem”… Que, enfim, não desiste de brigar, ponto. São vários os momentos ao longo do filme em que me questionei: por que razão é que ele se sujeita a tamanho vexame?
Se para mergulhar e surfar numa praia belíssima precisar de comer ratos, beber água não potável e comer ovos de um tatu-bola ele fá-lo. É como a personagem Scally (Julian McMahon), ‘líder’ daquele grupo de surfistas alucinados, os Bay Boys, diz: “Before you can surf, you must suffer”. Quer dizer, “Antes de puderes surfar, deves sofrer”.
Este thriller ambíguo de Lorcan Finnegan provoca emoções contraditórias
São várias as vezes ao longo do filme em que pensei: não é tudo isto extremamente arbitrário? Mas talvez seja mesmo essa a intenção (?).
“The Surfer” faz rir. Todavia, também me causou perplexidade: parece estar a correr desenfreadamente sem qualquer meta à vista.
A par do suprarreferido tema da masculinidade tóxica, a longa-metragem agudiza a experiência dessa cultura por Cage ao colocá-lo a sofrer, em pleno ecrã, uma crise de meia-idade. Enfim, ambas se alimentam (não existem dúvidas): são as duas responsáveis pela total deterioração do surfista.
Não obstante, senti que falta mais diálogo, mais profundidade. A violência e a comédia não chegaram para vingar aqueles assuntos… A não ser que o objetivo tenha sido, simplesmente, o de ‘memificar’ tudo isto numa obra de cinema.
Ainda assim, trata-se de uma experiência cinemática que vale a pena, na medida em que representa mais uma oportunidade para vermos Nicolas Cage no seu habitual estilo de atuação: exuberante, excêntrico, desmedido… Só como ele sabe fazer.
Já viste The Surfer? Concordas com a minha opinião?
The Surfer
Conclusão
- Em suma, The Surfer não aprofunda os temas que apresenta. Contudo, oferece-nos uma narrativa carregada de tensão – em algumas cenas mais do que outras – e de humor ácido e, sobretudo, mais uma performance intensa e irreverente de Nicolas Cage, que nunca dispensamos assistir. Entre o absurdo, o dramático e o humorístico, o ator entrega-se a uma caricatura brilhante que qualquer fã seu irá adorar.