©Synca Creations

MOTELX 2025 | Chime – Análise

Na secção de retrospectiva Serviço de Quarto do 19.º MOTELX encontrámos “Chime”, uma obra coesa, que em 45 minutos consegue atingir mais do que muitas longas-metragens de duas horas. Este trata-se, claro está, de um filme de Kiyoshi Kurosawa, considerado um dos mestres contemporâneos do terror japonês.

Kiyoshi Kurosawa (“Tokyo Sonata”, “Cure”, “Pulse”) é tido, consensualmente, como uma das grandes vozes do cinema de terror contemporâneo, no Japão e além fronteiras. “Chime” reforça sem dúvida esta pretensão, e de que maneira. A obra, concluída em 2024 e gravada em apenas 5 dias, estreou no último ano no Festival de Berlim e a partir daí tem vindo a levar a cabo uma longa e bem-sucedida rota de festivais.

Da mundanidade ao terror com Kiyoshi Kurosawa

Chime no MOTELX
©MOTELX

Tudo começa numa aula de culinária, apenas mais uma aula insuspeita e comum. Isto até um aluno afirmar que consegue ouvir uma espécie de sino, um som intrusivo que entra pelo seu cérebro adentro. Este estudante acaba por se suicidar no decorrer de uma das aulas, o que lança progressivamente o caos na vida do professor desta turma.

Lê Também:
MOTELX 2025 | A Useful Ghost - Análise

O que se segue é tão perturbador quanto inesperado. Enquanto este sinal sonoro incómodo persiste ao longo da curta mas esplêndida obra, a nossa própria sanidade vai sendo colocada em causa juntamente com a do protagonista.

A rotina torna-se cada vez mais bizarra e um mal estar constante e crescente toma conta do espectador. Os intervenientes do filme começam a comportar-se de forma cada vez mais estranha, com manifestações de insanidade e violência a multiplicarem-se em sítios cada vez mais públicos.

Chime e a brutalidade do mercado de trabalho

Entretanto, “Chime” é também muito incisivo na sua crítica subtil mas brutal do mercado de trabalho e das suas exigências. Observamos, com reticência, a um longo processo de recrutamento que termina com o protagonista a ser mastigado e cuspido, sem cerimónia, pelos seus possíveis futuros empregadores.

A frustração vai escalando, escalando, até o incómodo, a estranheza e o desespero existencial se encontrarem e criarem uma famosa tempestade perfeita. Tudo isto enquanto o filme de Kiyoshi Kurosawa não nos dá quaisquer tréguas ao longo dos seus 45 minutos, com uma mistura de som e banda-sonora que nos arrastam para o enlouquecimento progressivo dos seus intervenientes.

“Chime” é uma peça reflexiva, que se eleva como proposta de terror ao nunca explicar as motivações ou ações dos personagens. Tal consegue ser frustrante noutro tipo de narrativas, mas aqui acabamos por ser recompensados pela natureza opaca do filme. Extrair significado da média-metragem de Kurosawa é um exercício individual e rico, inextinguível, como é o caso com as melhores peças de arte.

Lê Também:
MOTELX 2025 | The Piano Accident - Análise

O MOTELX decorreu entre os dias 9 e 15 de setembro. A nossa cobertura coloca em retrospetiva os melhores títulos do Festival Internacional de Cinema de Terror de Lisboa.

Conclusão

“Chime” é uma peça reflexiva, que se eleva como proposta de terror ao nunca explicar as motivações ou ações dos personagens. Um ruído persistente e acções insanas arriscam levar a nossa sanidade pelo caminho, no melhor dos sentidos. Kiyoshi Kurosawa prova o porquê de ser considerado um dos grandes mestres do terror japonês da atualidade.

Overall
89
Sending
User Review
0 (0 votes)

About The Author


Leave a Reply