Como um Trovão, em análise

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  • Título Original: The Place Beyond the Pines
  • Realizador: Derek Cianfrance
  • Elenco: Ryan Gosling, Bradley Cooper, Eva Mendes
  • ZON | 2013 | Drama/Crime| 140 min

Classificação:

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Derek Cianfrance é um dos mais promissores realizadores desta nova vaga de autores independentes. “Blue Valentine” foi o filme que nos captou a atenção pela beleza trágica com que nos falava de uma relação amorosa deteriorada. “Como Um Trovão” foi o filme que se seguiu. Regressa portanto com Ryan Gosling ao leme nuns ligeiros furos abaixo, por comparação com o seu anterior trabalho, mas novamente num filme sobre o destino, os valores familiares e a fatalidade das relações humanas.

No enredo de “Como Um Trovão” encontramos Luke (Ryan Gosling) que ganha a vida a realizar performances de motas em feiras populares que viajam de cidade em cidade. Ao passar por Schenectady em Nova Iorque, Luke tenta reaproximar-se da sua ex-namorada Romina (Eva Mendes) e descobre que durante a sua ausência por um ano, ela teve um filho seu, Jason. Luke resolve desistir da sua vida na estrada para sustentar a família, conseguindo um emprego como mecânico de automóveis. Ao perceber o talento e ambição de Luke, o seu novo chefe, Robin (Ben Mendelsohn), propõe-lhe sociedade numa série de perigosos assaltos a bancos que o leva numa espiral criminosa e a um confronto com o polícia Avery Cross (Bradley Cooper).

PLACE BEYOND THE PINES

Numa primeira análise, estaríamos à espera de ver um Ryan Gosling como foco permanente ao longo do filme (é o que sugerem os trailers e a sinopse), mas isso não acontece, para nossa surpresa. A presença de Gosling é constante no primeiro terço, permite desencadear uma segunda parte bem diferente da primeira e é um personagem que comanda o último terço, embora não fisicamente.

Talvez seja na surpresa que “Como Um Trovão” perca alguma das suas qualidades. Por exemplo, quem assiste ao primeiro “capítulo” e vê o seu desfecho, fica sujeito a sentir-se desconectado do segundo ato, que embora esteja articulado ao primeiro, é bastante diferente na sua forma. Enquanto no segmento de Ryan Gosling se via um seguimento das temáticas familiares e amorosas de “Blue Valentine”, no segundo ato – que se foca na personagem de Bradley Cooper – há uma atenção maior no lado mais policial e menos dramático, e talvez por isso seja difícil perceber as opções de Cianfrance em confrontar estes dois mundos de forma tão espontânea e tão pouco justificada – junte-se também a queda de qualidade do primeiro para o segundo ato.

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É claro que um filme não se avalia a dois terços da sua duração, e no último ato Derek Cianfrance junta magistralmente as peças que faltavam, oferecendo-nos uma perspetiva mais abrangente da história que conta. Se numa primeira instância nos falou da decadência, da pobreza de espírito, da família desmoronada, acaba depois por nos mostrar o outro lado: a ascensão, a fama, a família aparentemente perfeita liderada por um herói. E no fim, mostra-nos o impacto das ações anteriores para nos provar que os frutos de uma família liderada por um herói ou de outra liderada por um criminoso podem não diferir tanto como possamos pensar.

O filme de Derek Cianfrance beneficia também de uma dose de performances de encher o olho: Ryan Gosling, que por força das circunstâncias, aparece menos tempo do que aquilo que desejaríamos, ainda assim arranca uma prestação intensa e magnética, pese embora esta partilhe algumas semelhanças com as suas personagens anteriores (a pausa na carreira vem mesmo a calhar para Gosling); Bradley Cooper parece ter aprendido com Matthew McConaughey a arte de transformar um ator relativamente fraco num performer com futuro promissor, muito por fruto da qualidade na escolha de papéis (recordemos “Guia Para Um Final Feliz”); e entre outros tantos personagens mais secundários, a grande surpresa acaba por surgir no último terço com a prestação do jovem Dane DeHaan (catapultado para a fama na sua tremenda aparição em “Crónica”) cuja personagem cativa o nosso olhar através dos seus eletrizantes gestos que refletem a carga emocional que carrega.

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“Como um Trovão” usufrui dos silêncios que Cianfrance já havia deixado transparecer em “Blue Valentine”, que muito ajudam o filme na sua tarefa de imprimir o novelo emocional frio, cru e feroz que apesar de não ser muito exteriorizado através de gritos de revolta ou choros compulsivos, se sente que vive permanentemente naqueles desafortunados personagens. E quando os silêncios dão lugar ao som subtil e melancólico do seu main titles, o filme ganha uma outra dimensão – como é belo ver Ryan Gosling ou Dane DeHaan a vaguear por entre os pinhais.

Apesar de sofrer de alguns clichés já bem patentes em filmes com temáticas semelhantes e de possuir uma duração excessivamente extensa, “Como Um Trovão” recorre às suas profundas personagens para esconder os seus defeitos. Mérito aqui, não só para o elenco, mas também para a habilidade de Derek Cianfrance na escrita do argumento – que apesar de nem sempre parecer devidamente articulado e com objetivos definidos, é capaz de criar personagens complexas que mereçam a nossa permanente preocupação.

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Já como realizador, Cianfrance é sempre melhor no drama do que no thriller e talvez por isso os seus primeiros quarenta minutos – que estavam próximos da perfeição – contrastam demasiado com o restante filme – que se torna sucessivamente mais apressado e com um ritmo mais irregular.

Apesar de tudo, “Como Um Trovão” faz sempre jus ao seu lema: “Se correres como um relâmpago, vais estourar como um trovão.” É, no fundo, tudo baseado nas leis da Física: primeiro avista-se o relâmpago e espera-se pelo som, depois Cianfrance estoura o espectador com ruídos ensurdecedores. Silenciosos, mas ensurdecedores.


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