Death Stranding 2: On the Beach – Análise
Hideo Kojima está de volta com Death Stranding 2. Estranho, intenso, único. Inesquecível!
Lançado em 2019, Death Stranding marcou a primeira grande produção independente de Hideo Kojima após a sua saída da Konami. Com o apoio da Sony e desenvolvido pelo estúdio Kojima Productions, o jogo foi inicialmente recebido com críticas divididas.
A sua jogabilidade, focada em entregas e conexões humanas, foi vista por muitos como monótona, principalmente para os que tinham pouca ajuda de outros jogadores online. Contudo, com a chegada da pandemia em 2020, a sua mensagem adquiriu um novo significado: a importância das ligações humanas em tempos de isolamento. Temos de estar próximos, a qualquer custo.
A história decorre num mundo pós-apocalíptico, onde entidades sobrenaturais e fenómenos catastróficos empurraram a humanidade para o colapso. Neste cenário, o jogador assume o papel de Sam Bridges, um mensageiro encarregado de reconectar comunidades através da entrega de recursos. Ao invés de armas, o jogo oferece cordas como símbolo de ligação, numa metáfora retirada da obra “A Corda”, de Kobo Abe.
Kojima utiliza este conceito para refletir sobre a reconstrução da sociedade através de laços humanos, substituindo a violência pela cooperação. E claro, não vai faltar a futura luta entre a mente humana e a Inteligência Artificial…
Estranho e único, tal como se esperava
O jogo apresenta ainda uma forte componente filosófica e espiritual, afinal de contas, estamos a falar de Kojima. A ligação entre mães e filhos através do cordão umbilical é reinterpretada como uma ponte entre o mundo dos vivos e dos mortos. Neste contexto, as mulheres grávidas são representadas como símbolos de esperança e continuação, com inspiração em muitas obras literárias que exploraram o mesmo conceito.
O próprio Kojima partilhou que a perda da sua mãe durante o desenvolvimento do jogo influenciou diretamente esta abordagem intimista e pessoal da morte e da perda. De todos os temas aqui presentes, o luto, perda e saudade, fazem a mistura que nos acompanha, e por vezes levamos um murro no estômago.
Com Death Stranding 2: On The Beach, Kojima continua a explorar estas temáticas, agora a partir da perspectiva dos que ficam para trás. A nova narrativa começa com Sam e Lou como fugitivos numa região remota dos EUA, mas rapidamente evolui para uma jornada global liderada por Fragile, que leva os jogadores até ao México e à Austrália.
Nestes novos territórios, Kojima aborda o luto segundo diferentes tradições culturais – como o Día de Los Muertos mexicano e os rituais aborígenes australianos – ampliando a reflexão sobre a morte para temas como a perda cultural, o esquecimento e a impossibilidade de viver certas experiências. Isto sem nunca esquecer o que ficou por dizer…
Morte, Luto, Saudade…
Visualmente, On The Beach reforça as emoções da narrativa através da direção artística. O contraste entre o deserto árido do início do jogo e os tons vibrantes da Austrália sugere uma evolução emocional: da desesperança ao renascimento. Ainda que mais povoado e variado, o novo mundo continua a ser solitário. Desta vez, porém, Sam revela-se mais vulnerável e introspectivo, permitindo uma aproximação mais emocional ao jogador.
De um ponto de vista técnico, é dos jogos mais bonitos a nível visual e dos mais incríveis a nível de efeitos visuais. Usem um bom sistema de som e vão perceber o que estou a dizer-vos. O jogo enche a nossa sala e o nosso corpo vibra.
Kojima aprofunda também a metalinguagem e a estrutura narrativa típica das suas obras. Com longos diálogos filosóficos e momentos de introspeção, o jogo desafia as convenções do meio, oscilando entre cinema e videojogo.
Esta abordagem poderá não agradar a todos, mas é precisamente esse compromisso com a autenticidade que define o estilo de Kojima. No entanto, é aqui que está um dos pontos mais controversos do jogo: o seu ritmo. Vão existir momentos em que a quebra do ritmo da história principal nos deixa perdidos, quer seja por um diálogo demasiado extenso ou por missões que nos fazem esquecer o que realmente é importante.
Primeiro é difícil, depois é especial
Durante a campanha, há momentos de estranheza e de alívio cómico, por vezes dissonantes face ao tom sombrio do primeiro jogo, mas, uma vez mais, estamos a falar de Kojima. Sim, tem momento para rirmos, outros para chorarmos, e alguns em que é simplesmente “parvo” ou absurdo o que está a acontecer. Mas no fim, tudo isto está incrivelmente ligado com a realidade. Contudo, Kojima desafia-nos a esperar, tal como fez em todos os seus anteriores jogos, na esperança de que no fim tudo fará sentido.
E de facto, Death Stranding 2 entrega todas as respostas, mas fá-lo com subtileza, valorizando o processo e o “porquê” em detrimento do “o quê”. Preparem-se para as últimas 3 ou 4 horas, onde tudo se revela e garanto-vos que provavelmente não irão adivinhar metade do que passará pelos vossos olhos.
A nível de jogabilidade Kojima faz uma clara mistura entre Metal Gear Solid V, com o seu mundo aberto e o stealth mode, e a estranheza de Death Stranding. Apesar de não inovar como MGS V fez, Death Stranding 2 é um claro salto em relação ao jogo anterior, até porque é muito menos monótono. Aqui há muitos carros, motas! Isto faz uma diferença enorme.
No fim de contas, Death Stranding 2 é uma experiência singular, emocionalmente densa e visualmente deslumbrante. Reafirma a postura de Hideo Kojima e a sua capacidade de inovar dentro da indústria, com uma obra que questiona a vida, a morte e, acima de tudo, a importância de nos ligarmos – mesmo quando tudo parece perdido. Não agradará a todos, muitos provavelmente desistirão a meio, sem nunca verem as últimas horas que marcam qualquer jogador.
Resumindo, Death Stranding 2 é um bom jogo, com falhas e boas inovações, mas é uma história verdadeiramente assombrosa e que marca quem a experiência. Um jogo que mais do que jogado, deve ser vivido. Melhor jogo de Kojima? Não, porque Metal Gear Solid é demasiado bom, mas não é isso que interessa. O que interessa é a mensagem clara para os nossos tempos de guerra e inovação digital, é o passar de sentimentos, a introspeção que deveremos fazer. No fim, um dos jogos mais marcantes da vida da Playstation 5.
Estás preparado para a mente de Kojima?