The Crown | 1ª temporada em análise

Numa era televisiva marcada pela ficção, violência e nudez, a Netflix e, principalmente, Peter Morgan surpreendem com o poderio dramático e realista de The Crown.

Um homem tosse sangue num lavatório e mais tarde pergunta ao médico se deve estar preocupado com esta situação. O ano é 1947, o indivíduo é o Rei George VI e o lavatório é no Palácio de Buckingham, na manhã do casamento da sua filha mais velha com Philip Mountbatten, membro da família real “estendida”, mas originário da Grécia.

Este é o ponto de partida de The Crown, o projeto mais ambicioso da Netflix, que ainda antes da sua estreia, em novembro, já dava que falar. O seu orçamento de 130 milhões apenas para os primeiros 10 episódios motivou o reboliço. É a série mais cara de sempre e tudo para acompanhar os primeiros anos do reinado de Elizabeth II: a sua vida pessoal e o momento político, social e económico do país e do mundo na época.

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The Crown segue os passos de Elizabeth a partir do seu casamento, em 1947, com Philip que recebe o título de duque de Edimburgo, para descontentamento da família real. A produção apresenta, de forma episódica, os conflitos vividos pela protagonista e os principais acontecimentos que moldaram a segunda metade do século XX.

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A primeira temporada estende-se até 1955, antes da Crise de Suez. A série constrói o seu drama em várias frentes, inteligentemente equilibrando os contextos familiar e político em cada capítulo. Conhecemos várias lutas, incluindo a saúde frágil e a personalidade do primeiro-ministro Winston Churchill (John Lithgow); os sentimentos de marginalização de Philip (Matt Smith); a vida amorosa da irmã Margaret (Vanessa Kirby); e as intrusões do príncipe Edward (Alex Jennings), que permanece adorado pelos cidadãos, mesmo que sua abdicação tenha esmagado a casa de Windsor.

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O argumento escrito por Peter Morgan, responsável pelo filme A Rainha de 2006, é o ponto mais forte de The Crown. A série apresenta uma história de privilégios com personagens que, à partida, seriam difíceis de atrair e relacionar com o público. Mas Peter Morgan consegue o impossível. O espetador preocupa-se com os dilemas de Elizabeth e de Philip, desde a troca de residência até à mudança de nome das crianças. Morgan conseguiu tornar estes símbolos intocáveis britânicos em pessoas reais, complexas, com sonhos e desejos, preocupações e sentimentos.

Também a preocupação pela composição estética e a recriação de cenários da época são impressionantes e merecem elogios. A produção teve o cuidado de apresentar o contexto histórico da forma mais fiel e luxuosa possível: os detalhes relativos ao design dos cenários, à caracterização dos figurinos e das localizações escolhidas não foram deixados de parte.

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Como Rainha Elizabeth II, Claire Foy tem o desempenho da sua carreira. Desde o primeiro momento que consegue atribuir humanidade à monarca, derrubando todos os preconceitos que giram ao redor da figura. A tenacidade em casar com Philip, a felicidade e jovialidade em família em contraposição com a obrigação e rigidez em se tornar rainha com apenas 25 anos.

Durante 10 episódios os espetadores assistem ao desenvolvimento de Elizabeth II e ao desaparecimento de Elizabeth Windsor, mulher, mãe, esposa, irmã e filha. Duas Elizabeths constantemente em conflito – a mulher e a coroa. Numa performance contida, mas incrivelmente expressiva – com movimentos faciais e corporais, cuidado com a postura e hesitação na voz – Foy convence ao desumanizar Elizabeth para se tornar no símbolo britânico.

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Mas Foy não está sozinha. Matt Smith entrega-se a Philip, dando humanidade e mágoa a uma figura que sofre ao ver a transformação de Elizabeth. Graças a Smith, o espetador sente empatia pela personagem e justifica a ambição e arrogância que vai adquirindo ao longo da temporada. O espetador vê Philip num debate interno entre as suas obrigações para com a monarquia e os seus ideais enquanto figura masculina – o momento em que tem de se ajoelhar perante Elizabeth.

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No entanto é John Lithgow que brilha em The Crown. O ator americano é simplesmente Winston Churchill. Arqueado, sempre sisudo e com um sotaque britânico à medida, Lithgow brilha ao dar vida a um homem que recusa parar e abandonar a vida política. É através dos seus olhos e do seu diálogo que o espetador percebe a importância da Monarquia enquanto instituição e símbolo. Nos últimos episódios da temporada John Lithgow rouba mesmo todas as atenções e é capaz de fazer a audiência se emocionar e se relacionar com a personagem.

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The Crown é o verdadeiro olhar do que se passa atrás de todo o conto da família real britânica. Embora a série criada por Peter Morgan ser excelente, esta série não é a típica produção da Netflix em que se possa fazer maratona de forma rápida. O ritmo é lento, os diálogos são pesados e os episódios estão carregados de marcos históricos.

No entanto é óbvio que The Crown é um claro triunfo para o serviço streaming. A série consegue prender os espetadores desde o primeiro episódio, marco difícil de alcançar para uma produção biográfica. Apenas resta esperar que Peter Morgan e a Netflix consigam continuar com a qualidade de The Crown.



the crownTítulo Original:
 The Crown

Criador:
 Peter Morgan

Elenco: Claire Foy, Matt Smith, Vanessa Kirby, John Lithgow, Alex Jennings, Jared Harris 
Netflix | Biográfico, Drama | 2016 | 60 min
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Catarina Fernandes

 

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