"UglyDolls" | © Cinemundo

UglyDolls, em análise

UglyDolls” é um musical animado cheio de clichés e fórmulas, números musicais desinspirados, uma coleção de personagens felpudas e uma cidade para brinquedos cujo charme quase redime o filme.

Filmes feitos para um público infantil tendem a conter em si uma mensagem moral bem clara e facilmente assimilável. Pelo menos é isso que costuma acontecer no contexto de obras dos grandes estúdios de Hollywood, Pixar aparte. Uma celebração da diferença e crítica do preconceito social é talvez uma das fórmulas morais mais comuns deste tipo de filmes, o que é bastante irónico quando consideramos quão estandardizadas estas criações são, quanto a diferença é limada até se obter um produto final que apele ao máximo número de pessoas possível. Podemos chamar-lhe ironia, mas tão facilmente podemos chamar-lhe hipocrisia. “UglyDolls” é um exemplo particularmente gritante desta dinâmica.

Afinal, aplicar esta lógica a um produto de Hollywood cheio de personagens amorosas já é algo dúbio. Aplicar esta mensagem moral a um filme formulaico feito com base em brinquedos, basicamente um anúncio de hora e meia, é uma amálgama de contradições de proporções monumentais. Enfim, entendemos que muitos olharão para tais considerações e pensarão que nos estamos a preocupar em demasia com um filme para miúdos. Em resposta, diríamos que entretenimento para crianças pode ser simples, fácil de ver e divertido, sem ser ideologicamente incoerente. Bom cinema de entretenimento também pode ser boa Arte. “UglyDolls” não é em uma coisa nem outra.

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Inspirado nos brinquedos com o mesmo nome, “UglyDolls” conta a história de Moxy, uma boneca cor-de-rosa que vive em Uglyville. Nessa cidade só vivem bonecos coloridos com formas estranhas e, com grande regularidade, novos habitantes chegam à comunidade através de um misterioso cano na encosta de uma falésia. Como qualquer protagonista deste tipo de conto animado, Moxy anseia por algo mais na sua vida e deseja um dia ser o brinquedo de uma criança. O problema é que ninguém sabe o que há para além de Uglyville e os seus habitantes, apesar de partilharem o desejo por pertencer a um miúdo, chegam a duvidar que o mundo exterior exista.

Certo dia, Moxy convence um grupo de amigos a aventurarem-se pelo cano, em busca do mundo que deverá existir fora dos limites de Uglyville e, se possível, encontrar um modo de chegar às mãos de uma criança que precise de um brinquedo. Na sua odisseia, o grupo acaba por se deparar com uma nova comunidade, o Instituto da Perfeição. Aí vivem brinquedos antropomórficos cuidadosamente criados de modo a serem “perfeitos”. Qualquer marca de individualismo que vá além dos padrões de fábrica é um defeito imperdoável neste ambiente onde os bonecos competem para ganhar acesso ao mundo lá fora, onde chegarão ao seu propósito em vida, pertencer a uma criança.

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Os bonecos de Uglyville são um contraste colorido face à uniformidade regimental, mas têm de passar pelas mesmas provações que os outros se querem uma oportunidade de concretizarem os seus maiores desejos. Infelizmente, o líder do Instituto é um tirânico boneco loiro que dá pelo nome de Lou e controla os outros bonecos com punho de ferro. No mundo dele, imperfeição existe para ser aniquilada, individualismo é impensável e as nódoas são o inferno. Como é de esperar, os bonecos “feios” acabam por mostrar serem tão valiosos como os “perfeitos” e Lou é exposto como o monstro que realmente é, mostrando que mesmo aqueles que são belos e convencionais podem esconder grande maldade e que aqueles que são diferentes de nós devem ser tratados como iguais.

Dizer isso não é um spoiler, pois, afinal, esse é o modo como todos estes filmes acabam por se desenrolar. Apesar de putativamente celebrar a diferença, “UglyDolls” é tão pouco específico a nível narrativo e estético que é quase impossível discerni-lo de uma miríade de obras semelhantes. Reparem, por exemplo, que este filme é um musical, sendo que os números musicais são a única razão pela qual o enredo anémico se consegue esticar ao longo de 87 tortuosos minutos. O problema é que as canções são umas aberrações pop que não têm personalidade alguma e são quase miraculosamente esquecíveis. O facto de não moverem o enredo ou o desenvolvimento das personagens também contribui para que estes interlúdios musicados pareçam inteiramente negligenciáveis.

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Todo o filme é negligenciável. Nenhuma das suas ideias é original ou minimamente criativa, a história é tão perfuntória que se torna monótona e o design de personagens é igualmente desinspirado. Só mesmo a criação de Uglyville é que se safa desta montanha de mediocridade. Há algo de muito apelativo na mistura de formas e cores cuidadosamente construídas de modo a sugerirem desordem, mas a serem harmoniosos para o olho. A cidadezinha parece mesmo ser um espaço mágico para brinquedos e as texturas dadas às superfícies sugerem a qualidade diminuta de bonecos, mas não são demasiado realistas, mantendo assim o sentimento geral de fantasia infantil.

Infelizmente, em termos visuais, Uglyville é mesmo o único elemento positivo do filme. Não há nada de obviamente mau em “UglyDolls”, mas certos pormenores revelam as graves falhas da animação. Os bonecos do Instituto, por exemplo, têm cabeleiras que nunca parecem integradas com a cabeça de plástico, como se estivessem a flutuar ao invés de estarem coladas à superfície. Moxy e companhia, em contraste, são detalhadamente texturados, mas os mecanismos das suas caras são atrozes. Os olhos em nada se conjugam com o resto do corpo e a parte de cima da cara está completamente imóvel, mesmo quando as personagens se desmancham em expressões exageradas. Tudo isto são considerações técnicas, mas mostram quão medíocre o filme é, mesmo ao nível mais básico de animação de personagem. Enfim, “UglyDolls” é aquele tipo de produto que não ofende ninguém, não surpreende e não tenta sequer.

UglyDolls, em análise
UglyDolls

Movie title: UglyDolls

Date published: 5 de August de 2019

Director(s): Kelly Asbury

Actor(s): Kelly Clarkson, Pitbull, Ice-T, Blake Shelton, Leehom Wang, Wanda Sykes, Gabriel Iglesias, Emma Roberts, Kelly Asbury, Jane Lynch, Nick Jonas, Lizzo, Janelle Monáe, Charli XCX, Bebe Rexha, Enrique Santos

Genre: Animação, Comédia, Musical, 2019, 87 min

  • Cláudio Alves - 40
40

CONCLUSÃO:

“UglyDolls” é um triste esforço de cinema de animação comercial. Nem como um anúncio publicitário o filme funciona, sendo genuinamente aborrecido apesar de nem chegar a ter hora e meia.

O MELHOR: O design colorido de Uglyville.

O PIOR: A qualidade da animação de personagens e os números musicais perfuntórios.

CA

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