O Conselheiro, em análise

 

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  • Título Original: The Counselor
  • Realizador: Ridley Scott
  • Elenco: Michael Fassbender, Brad Pitt, Javier Bardem, Cameron Diaz, Penelope Cruz
  • Género: Thriller
  • Big Picture | 2013 | 117 min

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De vez em quando aparece um filme que queremos tanto gostar que a perspetiva da desilusão perante oportunidades perdidas pode assemelhar-se a um valente soco nos rins.

Dizer que a expectativa era alta para “O Conselheiro” é um eufemismo mirrado. Com Ridley Scott a realizar uma história escrita especificamente para o grande ecrã por Cormac McCarthy (autor de “Este País Não é para Velhos” e “A Estrada”) e interpretada por Michael Fassbender, Javier Bardem, Brad Pitt, Penélope Cruz, Cameron Diaz e um par de chitas, o que havia para correr mal?

Aparentemente, muitas coisas.

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O intenso thriller revolve sobre um advogado criminalista que, ao ser atraído para o emocionante e perigoso mundo do tráfico de droga, percebe que a sua decisão momentânea o conduz a uma espiral descendente de acontecimentos imparáveis e de consequências fatais.

Há coisas boas em “O Conselheiro”, mas o “O Conselheiro” não é um filme brilhante. É antes uma “besta” estranha, uma mistura artística de considerações filosóficas e a brutalidade da violência. E não obstante o facto de ficar longe, como um todo, da soma de algumas partes incríveis, ainda se constitui como um visionamento estimulante, quase místico.

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O Conselheiro” surge vestido e revestido para matar. A fotografia e acompanhante direção artística queimadas pelo sol e sexualidade pungentes elevam-se com uma elegância cool que transpõe o título de Ridley Scott para um dos filmes com melhor aspeto do ano. A sensação que fica é que a temperatura sobe tanto que seríamos capazes de moldar ferro com ele.

O argumento confronta a audiência com retratos por vezes explícitos e sempre desconfortáveis da mais profunda escuridão da natureza humana. Entre o remoinho fatídico dos acontecimentos, parece procurar-se um quê de tragédia Shakespeariana, mas Ridley Scott parece demasiado enamorado com o seu argumentista e o elenco para entender como tudo se deveria juntar em harmonia.

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Assim, os acontecimentos flutuam alucinatoriamente entre uma profundidade poderosa e humor negro com ritmo, para ocasionalmente decair em trejeitos desajeitados. Depois há ainda a colisão da tentativa por parte dos atores de uma interpretação natural e um diálogo profundamente estilizado.

O niilismo, a ganância, o embate do bem e do mal e do caçador e da presa, a morte, as consequências das escolhas humanas tornam a abrangência temática de “O Conselheiro” tão gulosa como as questões filosóficas e morais que tenta levantar, recuperando mesmo muitas das questões exploradas em “Este País não é para Velhos”. Um dos seus problemas é que tenta ser mais ressonante do que consegue ser, perdido numa qualquer enfatuação que nutre por si mesmo – mas essa nem sequer é a mais grave das suas moléstias.

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O verdadeiro infortúnio surge, curiosamente, no enredo, ou antes nos tecidos conectivos que (não) o unem. Na verdade, o que parece é que este se desenrola à boleia de uma série de conversas fascinantes e enigmáticas, mas que não têm uma história coerente que as suporte, tornando “O Conselheiro” um exercício cativante no papel mas perdido e infelizmente diluído no meio cinematográfico.

Os “porquês” e os “comos” – por exemplo, da escolha do Conselheiro em embarcar na fatídica negociata; afinal ele tem tudo o que um homem pode desejar – são totalmente excluídos de uma equação vaga adornada de linguagem pretensiosa. É desapontante que tamanho pedigree acabe obstinadamente fixado em tornar cada vez mais enigmática uma história povoada com personagens com cabelos excêntricos que quase não existe, enquanto encontra formas criativas para decepar cabeças humanas.

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Se estivéssemos removidos do background da história, seríamos tentados a dizer que o livro era certamente melhor que o filme – mas neste caso, não existe livro.

No quadro geral observamos pinceladas vívidas e intrigantes do que “poderia ter sido” e que nos colocam em suspense, salivando pelo que virá a seguir.

É pena que, tirando-se a prova dos nove, o resultado esteja longe de dar certo.

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