Por Detrás do Candelabro, em análise

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  • Título Original: Behind the Candelabra
  • Realizador:  Steven Soderbergh
  • Elenco: Michael Douglas, Matt Damon
  • ZON | 2013 | Drama/Comédia| 118 min

Classificação:

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Sinónimo de espetáculo, extravagância e candelabros, Liberace foi um artista de renome mundial, com um talento que o tornou querido do público e lhe permitiu conquistar uma base leal de fãs ao longo de uma carreira de 40 anos.

Liberace (Michael Douglas) viveu luxuosamente e teve uma vida de excessos, dentro e fora do palco. No verão de 1977 conhece o jovem e belo Scott Thorson (Matt Damon) e, apesar da diferença de idades e de pertencerem a mundos opostos, os dois envolvem-se numa secreta relação amorosa durante cinco anos. O filme de Soderbergh conta a história desse relacionamento tempestuoso – desde o primeiro encontro nos bastidores do Las Vegas Hilton até à amarga e pública separação.

Surpreendentemente desprezado pela distribuição americana – que recusou exibir o filme por o achar “demasiado gay” – o suposto último filme na carreira de Steven Soderbergh encontrou bom porto na HBO que o resgatou para a televisão, tendo também competido pela Palma de Ouro no Festival de Cannes deste ano. É com profunda estranheza que vemos uma obra tão marcante na carreira de um realizador tão polivalente, a estrear no “pequeno ecrã”. “Por Detrás do Candelabro” merecia outro tipo de tratamento.  Mas deixemo-nos de rodeios ou reflexões mais extensas e vamos diretamente aos atributos que tornam “Por Detrás do Candelabro” numa das melhores obras deste ano.

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Logo em primeiro lugar, Michael Douglas que desafia, a cada minuto, os limites do trabalho de ator. É sublime na reconstituição de Liberace: um olhar profundo, tão humano e tão insensível, um gesto excêntrico seguido de um sorriso sincero, mas sempre com um tom de voz que evidencia a paixão que sente pelos presentes humanos que a vida lhe oferece nas folgas da solidão. Porque o que vemos é só isso: um homem perdidamente só na extravagância do seu kitsch palaciano, onde vive alienado do mundo exterior. E Douglas é espantoso nessa recriação minuciosa e arrebatadora. O Óscar seria dele este ano. Por força das circunstâncias, Michael Douglas terá de se contentar com o merecidíssimo e não menos prestigiante Emmy.

Quase ao nível de Douglas, surge em apoio Matt Damon num dos mais completos (e também num dos melhores) papéis de toda a sua carreira. Sem medo de ferir susceptibilidades, Soderbergh coloca em Damon a tarefa de ser o “presente humano”, jovem e incauto, que Liberace usufrui na plenitude. Damon é o filho, irmão, amante, melhor amigo, mas bem lá no fundo, é a representação mais aproximada do amor que Liberace nunca soube experienciar na totalidade.

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A certa altura Liberace diz “I love you not only for what you are, but for what I am when I’m with you.” É neste ponto que Steven Soderbergh assume claramente que este não é só uma fábula moral sobre a homossexualidade, sobre preconceitos mesquinhos amplamente analisados no cinema moderno ou simplesmente sobre os caprichos da alta sociedade. Sem margem para dúvida, assume que fala dominantemente sobre amor, somente do amor, sem olhar a géneros ou intervenientes e sem se importar em demonstrar um gesto afetuoso mais polémico. Afinal o que será o amor senão a nossa influência positiva nas ações do próximo?

O filme de Soderbergh debruça-se sobre o que há ‘por detrás do candelabro’ que Liberace exibe por cima do seu piano durante as suas performances. Esse excêntrico candelabro funciona como uma simbólica janela de intimidade, de onde podemos observar a vida de Liberace sem a futilidade da primeira aparência. Para lá da ‘janela’, o que vemos é algo tremendamente divertido e despretensioso, sem deixar de nos comover e até chocar.

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Soderbergh sabe como envolver a audiência, e mesmo para aqueles com mentes mais fechadas, o filme tem o dom de as abrir, nem que seja milimetricamente. Numa primeira etapa, apoia-se no humor de alguns gestos mais burlescos e, depois de estarmos tão imersos naquele ambiente, dá o derradeiro golpe emocional de tal forma que, naquele momento, já somos incapazes de não nos preocuparmos com o destino daquele casal fútil mas verdadeiro – a simbologia e a beleza da cena final colocam-na já numa das melhores do ano.

No fim, resta-nos apenas esperar que a decisão de Steven Soderbergh em abandonar o Cinema não seja – e isto sem qualquer conotação política – uma decisão irrevogável. O Cinema precisa de Soderbergh e nós, cinéfilos apaixonados, precisamos do seu Cinema.

DR

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