"Bad Education" | © HBO

Bad Education, em análise

Estreado no Festival de Toronto do ano passado, “Bad Education” é um dos novos filmes distribuídos pela HBO e uma fascinante comédia negra sobre um dos maiores escândalos da Educação Americana.

Em 2004, foi descoberto que vários administradores, superintendentes e outros associados com o distrito escolar de Roslyn nos EUA, há haviam burlado os contribuintes em mais de 11 milhões de dólares. Despesas pessoais foram sistematicamente apontadas como investimento nas escolas do distrito. Inicialmente, a história foi reportada pelo jornal dos alunos da escola secundária de Roslyn, mas rapidamente outras publicações mais influentes vieram prestar atenção ao escândalo. Depois de uma investigação federal, várias pessoas envolvidas no roubo foram condenadas a vários anos de prisão.

Enquanto o escândalo se desenrolava, Mike Makowsky era um aluno numa das escolas do distrito. Anos depois dessa experiência, ele veio a tornar-se num argumentista de cinema e, quando a oportunidade se propôs, Makowsky decidiu escrever sobre aquele que foi o maior escândalo educativo na História dos EUA. Baseando-se num artigo de investigação da revista New York, ele concebeu um argumento focado em duas das principais figuras do esquema de roubo, o superintendente Frank Tassone e sua assistente Pam Gluckin. O resultado foi um guião que desconstrói o mito do sucesso na América, que pinta um retrato de ganância descontrolado e olha sem filtros o lado negro da prosperidade suburbana.

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Para encarar tal material, não havia melhor realizador que Cory Finley. A curta carreira deste cineasta tem sido dedicada uma recorrente exploração do grotesco e da podridão moral enraizada nas classes médias-altas dos EUA. A sua mise-en-scène é caracterizada por uma certa rigidez composicional, cheia de gestualidade repetida e uma teatralização dos ritmos da vida casual. O quotidiano é feito em ritual enervante no cinema de Finley, o inócuo ganha permutações sinistras e até o mais comum escritório pintado com a luz feia de lâmpadas fluorescentes se transfigura num templo à malevolência que se esconde por detrás de sorrisos insinceros.

Há uma afetação manienta nesta abordagem formal, uma perfeição grotesca, que é capaz de gerar risadas jocosas face à vileza medíocre das personagens. Para que isto funcione, os atores têm de estar em sintonia com o engenho formalista ou todo o edifício fílmico desmorona sob o peso da incoerência. Felizmente, Finley é tão bom criador de imagens fortes como é um sagaz encenador de atores. Também ajuda, pois claro, que o casting de “Bad Education” seja impecável, mesmo quando algumas das suas escolhas possam parecer meio estranhas. Não há melhor exemplo disso que o ator principal de toda esta trama.

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No superintendente Tassone, Hugh Jackman encontrou aquele que é talvez o melhor papel da sua carreira. Retratado como um homem gay em constante conflito com a sua identidade sexual e envelhecimento, o Frank Tassone de “Bad Education” é um manipulador de segunda categoria, cujas mentiras começam a descambar a partir do momento em que são questionadas. Longe de o retratar como um mestre da falsidade e do engano, Jackman salienta a qualidade febril de Tassone, a sua ansiedade corrosiva e a vontade desesperada de alcançar uma ideia de perfeição que está fora do alcance de qualquer ser humano. Há crueza no artifício maniento deste homem, algo mais real que a realidade e tão mais perturbador.

Infelizmente, a performance magistral de Jackman não nega os problemas representacionais que o filme encontra no seu retrato de Tassone. Nomeadamente, há uma tentativa de vilificar o modo como o homem lida com a sua sexualidade que cobrem o filme com uma certa pátina de puritanismo feio. Isso e um foco meio desajeitado em personagens fictícias do corpo estudantil são os maiores problemas de “Bad Education”. Um filme tão focado em questões de falsidade e corrupção devia ter mais cuidado com o modo como representa a realidade. Especialmente quando a realidade já é suficientemente sensacional para sustentar qualquer espetáculo cinematográfico.

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Fascinante, mas imperfeito, o filme não deixa de ser uma obra de cinema preciosa pela sua vontade de perfurar o mito da prosperidade americana. Há algo de estupendo no modo como a câmara de Finley captura a feiura de um sorriso perfeitamente branco, o horror de um facelift desnecessário ou a descontração relaxada com que pessoas roubam milhões de dólares sem um segundo de reflexão. O mais interessante é quanto as personagens parecem acreditar no seu mantra que justifica o crime, no desespero com que eles se agarram à ideia que a fartura enquanto modo de vida é uma necessidade irrevogável. No fim, as pessoas mais ludibriadas por estes criminosos são eles mesmos.

“Bad Education” está disponível para streaming através da plataforma da HBO Portugal. Não percas a oportunidade de ver esta aguçada comédia negra.

Bad Education, em análise
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Movie title: Bad Education

Date published: 12 de May de 2020

Director(s): Cory Finley

Actor(s): Hugh Jackman, Allison Janney, Geraldine Viswanathan, Annaleigh Ashford, Ray Romano, Rafael Casal, Alex Wolff

Genre: Biografia, Comédia, Crime, 2019, 108 min

  • Cláudio Alves - 75
  • Inês Serra - 75
  • Daniel Rodrigues - 65
72

CONCLUSÃO:

Como um sorriso artificialmente branqueado, “Bad Education” é uma risonha montra para falsa perfeição. Contando a história de um escândalo real, este filme da HBO rasga a fachada da prosperidade americana e mostra a feiura humana que tantas vezes se esconde por detrás da fortuna. Os atores, com destaque para Hugh Jackman e Allison Janney, são impecáveis na interpretação desta comédia negra do grotesco e do falso.

O MELHOR: A prestação inspirada de Hugh Jackman, especialmente quando tudo começa a correr mal para Tassone e a sua fachada imaculada resvala em pânico maníaco. Há uma cena que envolve um monólogo febril sobre automobilismo que é quiçá o melhor trabalho que o ator já fez na sua carreira em frente das câmaras.

O PIOR: O modo como o filme encara a sexualidade do seu protagonista.

CA

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