Classic Fever | Bando à Parte (1964)
Referência estética e simbólica para cineastas de todo o mundo, o cinema de Jean-Luc Godard é um manual sagrado sobre como romper com a tradição e ser bem-sucedido.
Apesar de o incluirmos, pela segunda vez, nesta amalgama de hinos aos clássicos do cinema, há que sublinhar que a sua grandeza provém exatamente por pertencer a uma nova escola que nega vários cânones já estabelecidos na a 7ª arte. Senhoras e senhores, bem-vindos ao Bando à Parte.
O QUE É QUE VOU RELEMBRAR HOJE?
Bando à Parte (1964), de Jean-Luc Godard, baseado no romance de Dolores Hitchens e protagonizado por Anna Karina, Sami Frey e Claude Brasseur.
Espreita também o nosso artigo sobre o filme O Acossado, igualmente realizado por Jean-Luc Godard.
MAS AFINAL DO QUE SE TRATA?
Bando à Parte envolve o espetador dentro de um cenário nos subúrbios parisienses enquanto nos narra a tentativa de dois amigos, Arthur e Franz, roubarem uma boa quantia de dinheiro a um inquilino que mora na casa da sua nova amiga e paixão comum, Odile.
PORQUE É QUE NÃO O POSSO PERDER?
Porque é um ícone. Apesar de, visto de cima, girar em torno de uma tentativa de assalto consentido, em lupa, Bando à Parte retrata a insólita e incomum relação de três amigos e as tentativas empregadas pelos membros masculinos de ficarem com a miúda. Odile, por sua vez, é frágil, ambiciona o amor e encontra-se dividida entre dois peculiares rapazes que têm um gosto especialmente apurado por filmes de série B.
Refletindo a insatisfação com o ser e a dor de estar vivo à qual Godard nos habitou, Bando à Parte é simultaneamente frio, poético e frenético. Aceitando “falhas” de raccord intencionalmente e utilizando diferentes takes e planos, a edição arquiteta na perfeição toda a beleza que deve ser retirada da experiência: o ensaio do amor, da inocência, da descoberta.
O próprio conterrâneo e amigo de Jean-Luc, François Truffaut realizara dois anos antes um filme tematicamente parecido (e igualmente bonito) – Jules e Jim, que é muitas vezes comparado com Bando à Parte, especialmente no retrato do triângulo amoroso. Realizado em 1964, Bande à Part, no título original, é uma das mais belas referências da Nouvelle Vague francesa, onde imperava a edição inesperada, o argumento e diálogos irreverentes e um tanto aleatórios e, claro, todo o amoralismo da época.
Se não estão convencidos, note-se que esta obra é narrada pelo próprio realizador, que foi dela que surgiu uma das danças parisienses mais famosas do último século, a “Madison dance”, e que foi por sua causa que os guardas do Louvre começaram a ter pesadelos com jovens a correr pelos vastos corredores – cena que mais tarde foi deliciosamente retratada em Os Sonhadores, de Bernando Bertolucci.
UMA FRASE PARA A POSTERIDADE
“A minute of silence can last a long time… a whole eternity.”
PARA FICAR NO OLHO E NO OUVIDO (DA MENTE)