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76º Festival de Cannes | O Triunfo de Indiana Jones

‘Indiana Jones e o Marcador do Destino’, de James Mangold (fora da competição), teve a sua apoteose aqui em Cannes, que culminou com a entrega da Palma de Ouro Honorária para o veterano Harrison Ford (80 anos). O filme é uma combinação de nostalgia e aventura de outros tempos, sem ser demasiado preso aos filmes anteriores. 

‘Indiana Jones e o Marcador do Destino’, de James Mangold é um belo último capítulo da saga e uma grande conquista, que decerto modo fez passar o gosto amargo que o pobre quarto capítulo deixou na boca dos fãs. É também o primeiro filme a não ser dirigido por Steven Spielberg, nem co-escrito por George Lucas. O resultado são 2h34 de pura diversão, assente num argumento inteligente e até de certo modo erudito e filosófico, cheio de malabarismos com o tempo, tudo para com Indiana Jones, perseguirmos um objeto mítico. A História, a Arqueologia, sobretudo as invenções de Arquimedes entrelaçam-se com as difíceis e quase impossíveis tarefas de Indiana Jones sempre de uma forma muito divertida. As cenas de ação são espectaculares e alternam muitas vezes com momentos de ternura entre as personagens — como as com o miudinho e o jovem Ethann Isidoree muita nostalgia para o espectador, sem caírem demasiado nas linhas de referência dos filmes anteriores da saga.

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VÊ TRAILER DE ‘INDIANA JONES E O MARCADOR DO DESTINO’

Assim, ‘Indiana Jones e o Marcador do Destino’ traz de volta os nazis, que, desde sua derrota na II Guerra Mundial, prestaram muitos serviços ao cinema, tornando-se uma espécie de mestres do mal — Hanna Arendt tem toda a razão e os filmes agradecem-lhe — e uma aposta segura na bolsa dramatúrgica da indústria de Hollywood, com excepção para os russos e a Guerra Fria. Mads Mikkelsen interpreta o papel de um ‘cientista bastardo’ e cumpre friamente esse papel, encarnando uma personagem inspirada em Wernher von Braun, um engenheiro aero-espacial nazi, recrutado no pós-guerra pelo exército americano e que decerto modo é o grande responsável por os EUA, terem chegado à Lua. Esta sinistra personagem disputa com Indy — entre a derrota nazi e a Guerra Fria — a recuperação de uma antiga calculadora feita pelo matemático Arquimedes: a Antikythera, um dispositivo que permite viajar no tempo para entre outras coisas, corrigir os erros do Führer e assim garantir a continuidade do Terceiro Reich. Indiana Jones naturalmente, opõe-se a isso, ajudado pela sua afilhada chamada Helena Shaw (Phoebe Waller-Bridge, a também protagonista da série ‘Fleabag’), que não vê desde a adolescência e que o deixa empolgado. Depois é o costume: humor, acção, criptas escuras, implausibilidades com fartura e uma travessia pelo mundo que passa por Marrocos, Grécia, Sicília e até a antiga Siracusa numa cena magistral, que vale seu peso em pipocas, desculpem-me os mais puristas!

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Festival de Cannes 2023
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Harrisson Ford (80 anos) é que continua a ser o maior, seja rejuvenescido tanto para os largos minutos de flashback no início, igualzinho a 1981 em ‘Os Salteadores da Arca Perdida’, quanto agora exibindo as suas rugas (e o seu tronco nu, em cuecas), numa personagem que ficará para a ‘eternidade’, a ser um dos grandes heróis e ícones do cinema de aventuras. De olhar carrancudo e ao mesmo tempo de gozo, Harrison Ford consegue neste filme manter-se habitual, mas ligeiramente mais ‘amolecido’, o suficiente para não se tornar tão intragável, como antes, tanto na saga Indiana Jones, como na figura de Rick Deckard, de ‘Blade Runner—Perigo Eminente’ (1982), outra das suas grandes personagens. Ele, domina, mas já não é um déspota, permitindo aos seus parceiros de aventuras, que existam e reforcem a complexidade do drama. É o caso da tal afilhada Helena Shaw (Waller-Bridge) que com ele enfrenta heróis e vilões — incluindo esse doce e ao mesmo tempo sádico Jürgen Voller (Mads Mikkelsen) — com a mesma determinação que Indy. Ela é uma personagem feminina muito importante, tão erudita quanto pronta para dar uns ‘socos e pontapés’. Não admiraria muito, tal como se fala em relação a 007 James Bond, que Waller-Bridge possa encarnar por exemplo, um spin-off, com essa parceira, super-heroína, dando uma continuidade feminina, à saga de Indiana Jones. Mas há ainda, além da ‘surpresa’ do aparecimento de John Rhys-Davies, novos protagonistas encarnados por Antonio Banderas e Toby Jones, que saem por culpa do argumento de cena demasiado depressa, como todos os secundários ‘bons-na-fita’. Indiana Jones não seria a mesma coisa sem Harrison Ford, que merece esta homenagem que lhe foi prestada pelo festival com a Palma de Honra, perante uma multidão entusiasmada e agradecida ao seu talento e diversão. Com este ‘Indiana Jones e o Marcador do Destino’, de James Mangold, vira-se definitivamente uma página sobre o que encarnava esta lenda aventureira: por um lado, o espírito da infância e aventura; por outro lado, um imaginário da história do século XX. Porém, o mundo real, parece que está a precisar de um Indiana Jones.

JVM

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