NOS Primavera Sound 2016, Dia 2 | Só Deus sabe o que seria de nós sem Brian Wilson

A chuva de quinta-feira decidiu ir cair para outras paragens. E então o sol brilhou e pôs-se para Brian Wilson. Haverá cenário mais idílico para uma viagem pelas memórias de um álbum de nome “Pet Sounds”? Pois claro que não. 

Uns pequenos precalços na viagem até ao Porto fizeram-nos chegar literalmente a correr para não perder as primeiras sílabas de Cass McCombs. E não perdemos. Com uma setlist recheada de canções de amor para serem declamadas diretamente aos corações dos presentes (“You’re not my dream girl. / You’re not my reality girl. /  You’re my dreams come true girl.”), McCombs apresentou o seu country-folk bonito e certeiro que, apesar de ser parco em hits de reconhecimento imediato (como é, por exemplo, a balada “County Line”), é melodioso e meloso o suficiente para um belo final de tarde no Parque da Cidade.

Seguimos para o Palco Super Bock onde os Destroyer e o seu frontman Dan Bejar já se estavam a preparar para subir. Calças largas, cerveja na mão e um arzinho de Bob Dylan pouco consciente – são estas as primeiras impressões de Bejar. Dali até ao fim, pouca coisa realmente mudou desde o primeiro contacto. Um concerto monocórdico que não aqueceu nem arrefeceu aqueles que estavam já à espera de Brian Wilson.

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Com um ar pálido que à primeira vista nos mereceu alguma preocupação e já sem conseguir andar autonomamente pelo próprio pé, apareceu então o mítico Brian Wilson para regojizo total dos milhares que ali prestavam vassalagem e reconhecimento a um dos nomes mais importantes da música de todos os tempos. E não era para menos: estavámos prestes a assistir a um momento histórico com a interpretação integral de “Pet Sounds”.

Apoiado em palco por um número considerável de músicos (entre eles, Al Jardine e Blondie Chaplin), Brian Wilson começou de forma pouco esperada por cantar (como podia) canções como “California Girls” ou “I Get Arround”, antes de arrancar com “Wouldn’t it Be Nice”, que abre o álbum dos Beach Boys que comemora este ano 50 anos do seu lançamento.

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O respeito sentido por aquele jovem de terceira idade era enorme, e sentia-se a cada ovação que se seguia a cada canção. Mas nem tudo era perfeito: a voz de Wilson já não é o que era e certos momentos-chave do concerto assemelhavam-se a uma qualquer interpretação de uma banda de covers. Tudo muda ali na transição para o b-side de “Pet Sounds”: primeiro com “Sloop John B” e depois com “a canção que Paul McCartney gosta muito”, “God Only Knows”. Aí, o delírio foi geral. Até ao fim, ainda foi possível ouvir “Barbara Ann” e fazer crowdsurf com “Surfin’ USA”. Um concerto que, não sendo perfeito em todas as suas vicissitudes, será guardado como tal nas memórias de quem lá esteve. Só Deus sabe o que seria da vida sem Brian Wilson e de nós sem o NOS Primavera Sound

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O post-punk das Savages atraía de seguida aqueles que saltavam a refeição noturna no Palco Super Bock. Nós, com medo da afluência em PJ Harvey, decidimos saciar a fome e espreitar as Savages depois. E pelo pouco que pudemos ver, havia ali intensidade espelhada em algumas descidas junto da audiência e até numa revelação final de que a escrita de “Fuckers” estava relacionada com a vinda da banda ao Porto, há três anos atrás.

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Seguiu-se PJ Harvey, a headliner deste segundo dia, em apresentação do seu mais recente álbum “The Hope Six Demolition Project”, que foi fonte de grande parte de uma setlist igual à que já havia apresentado no festival irmão em Barcelona. A britânica entra em palco sem tiques de vedeta, juntando-se à sua banda numa estrondosa marcha de abertura, de saxofone nas mãos e com os bombos a marcarem o ritmo à sua frente e atrás. Uma estrutura cénica ascende atrás dela e as cores e os sons multiplicam-se. A par de Sigur Rós, este será um dos concertos onde a minúcia visual é mais evidente. Essa minúcia é patente não só nos referidos elementos cénicos, mas sobretudo pela precisa localização dos músicos e dos seus instrumentos em palco, numa espécie de desenho tático para o sucesso.

Há depois as entrelinhas para lá das batidas (que som maravilhoso que se ouviu ontem) e das luzes: o comentário político (“England’s dancing days are done”, em “Let England Shake”) e humano, as preocupações com o mundo (“Here’s the highway pathway of death and destruction”, em “The Community of Hope”), a destruição, os lugares que viu e as suas experiências no Afeganistão e Kosovo.

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Depois do furacão PJ Harvey, restabelecíamos energias para receber os Beach House. As nuvens descobriam um céu parcialmente estrelado e a brisa do mar só confirmava que estávamos no local ideal para ver o duo de Baltimore. Tal não foi corroborado por parte da audiência que abandonou o recinto logo após PJ Harvey ou ainda no decurso de um atrasado concerto dos Beach House (isto porque, no palco ao lado, ainda tocavam Kiasmos).

Abrindo com a melhor canção do álbum de 2015 “Depression Cherry”, “Beyond Love”, Alex Scally e Victoria Legrande (quase sempre escondida de qualquer objetiva) subiram ao Palco NOS para espalhar amor e “sensibilidade” (diz Victoria já perto do fim: “nunca percam a vossa sensibilidade”). Deixando um pouco de lado o último álbum “Thank Your Lucky Stars”, também editado em 2015,  (reparamos apenas em “Rough Song” e a grande malha que é “Elegy to the Void”), o duo americano passou ainda por “Teen Dream” – tocando também “Take Care”, ultimamente ausente das suas setlists – e acabando com o minimalista “Days of Candy”.

E foi mesmo um dia de doces. Ninguém poderá ter saído pelas portas do NOS Primavera Sound, já de madrugada, sem se sentir uma criança a quem deram várias guloseimas. Ai os diabetes.


 


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