Queer – Análise
Estreou no passado dia 19, nos cinemas nacionais, o filme “Queer”, do célebre diretor italiano Luca Guadagnino, que nos traz um retrato e uma jornada crua e intimista sobre desejo, identidade e marginalidade. Baseado na obra homónima de William S. Burroughs, “Queer” (2024) é uma incursão densa e melancólica da paixão e do Homem.
“Queer” é um retrato decadente da alma humana
O filme desenrola-se na Cidade do México dos anos 50, onde Lee, um americano deslocado, vagueia entre bares sombrios, paixões não correspondidas e uma procura incessante por conexão.
Daniel Craig, num dos papéis mais desafiantes da sua carreira, entrega uma performance notável (digna de indicação a Óscar), contida mas intensa, onde mergulha no fundo da mente perturbada do protagonista. Além deste, destaque grande para a atuação sublime de Drew Starkey, que demonstrou, enquanto Eugene, o porquê de ser uma das grandes promessas de Hollywood.
Guadagnino mantém-se fiel à essência literária da obra de Burroughs, mas recusa-se a transformar o filme numa simples adaptação passiva. Pelo contrário, imprime-lhe a sua assinatura estilística: câmaras que espreitam discretamente, cores desgastadas, e uma sensação de desejo constante — mas muitas vezes frustrado. “Queer” não é um filme sobre prazer; é um filme sobre a ausência dele.
Atmosfera sufocante e beleza decadente
A fotografia é magistral, captando com precisão a textura do calor e da decadência. Cada plano parece respirar com dificuldade, reflectindo o desconforto existencial de Lee. O ambiente — povoado por personagens ambíguas, sombras densas e música jazz que flutua no ar — serve como uma prisão sensorial para o protagonista, e por arrasto, para o espectador.
O ritmo do filme é propositadamente arrastado. Guadagnino quer que sintamos o tédio, a repetição, a alienação de Lee. Para alguns, este poderá ser um ponto fraco — “Queer” exige paciência. No entanto, essa lentidão torna-se essencial para compreendermos o ciclo de obsessão, rejeição e autodestruição que consome o personagem principal. A relação entre Lee e Allerton é o epicentro emocional do filme, uma dança desequilibrada entre desejo e indiferença.
O corpo como território político e íntimo
Para além da história individual, “Queer” funciona como comentário social. Num tempo em que a homossexualidade era criminalizada e abafada, o filme não romantiza a marginalização, mas também não se vitimiza. É uma visão honesta e por vezes brutal da sexualidade vivida na sombra — não como bandeira, mas como condição. A nudez, os gestos, os olhares: tudo é político, mesmo quando profundamente pessoal.
Depois dos êxitos “Challengers”, “Call Me By Your Name”, “Bones and All”, e “Suspiria”, Luca Guadagnino volta a acertar em cheio, num filme diferente, irreverente, e cheio de subtextos para os mais atentos. Um dos grandes diretores da atualidade. “Queer” já está nas salas de cinema em Portugal.
A arte de atuar, numa premissa imersa de emoções
- Para quem estiver disposto a mergulhar, “Queer” oferece uma experiência cinematográfica singular- incrivelmente honesta. Um filme que aborda temas profundos e humanos, numa estrutura bem definida do início ao fim. É de salientar a cinematografia perfeita, os elementos audiovisuais, e, acima de tudo, as atuações de Daniel Craig e Drew Starkey, que encheram o olho durante toda a obra. 80/100
Overall
8/10User Review
( votes)Pros
- O Melhor: A atuação de Daniel Craig é soberba e digna de indicação ao Óscar (o que não aconteceu). A estrela norte-americana, mostrou, mais uma vez, a sua versatilidade na sétima arte, ao incorporar um retrato frio e sublime do Homem, e de todas as emoções superficiais e intrusivas. Incrível.
Cons
- O Pior: apesar de ser bem compreensível e bonito visualmente, em certas partes de “Queer” nota-se um arrastar quase entediante, que pode desviar o público da premissa. A duração do filme poderia ser bem menor.