Vodafone Paredes de Coura 2019 | Num dia excelente, a caçada foi dos Deerhunter
Black Midi, Deerhunter, Spiritualized, grandes atuações no terceiro dia do Paredes de Coura. O cabeça de cartaz, Father John Misty, acabou por ficar para trás.
Não há melhor sensação do que, depois de um intensivo dia de festival, encontrarmos sérias dificuldades em eleger o melhor concerto do dia. A terceira jornada do Vodafone Paredes de Coura encheu-nos as medidas e a boa notícia é que hoje há mais.
OS BLACK MIDI ARRASARAM O PALCO SECUNDÁRIO DO PAREDES DE COURA
Abertas as hostilidades por volta das seis, foi só às oito e meia, com a subida ao palco Vodafone.fm dos Black Midi, que as coisas se tornaram realmente interessantes. O nome “Black Midi” soara toda a tarde pelo recinto do festival e agora, à frente do palco secundário, reunia-se a maior multidão até então vista naquele palco. Ao som de uma intensa e, desde logo, cativante introdução, a banda londrina entrou em palco, desta vez sem macacões, nem bonés, nem disfarces ou reservas de qualquer espécie. Mal acabada a introdução surgiram as primeiras malhas ruidosas, acompanhadas pela bateria de Morgan Simpson, que marcavam o aparecimento de “953”.
Conhecidos pelo poder das suas atuações ao vivo, os Black Midi tinham gerado altas expectativas. Ansiávamos por os ver entrar nos seus delírios ferozes que abrem portas à sua criatividade e improvisação. O ritmo bem marcado pela bateria parece ser o motor desta improvisação. Brincando com o tempo, o baterista coordena a explosão de guitarras que fazem o público vibrar.
O concerto mal começara e já atravessam o ar os crowd sufers transportados pelas mãos daqueles que, daí a pouco, formariam um intenso mosh pit. Nele vinha a verdade ao de cima, diferenciando-se bem quem conhecia a banda que tinha pela frente de quem só procurava mais um momento de anarquia. Quando “Talking Heads” ou “Speedway” surgiram, alguns arruaceiros não souberam adaptar-se à mudança de ritmo e acabaram perdidos num círculo já desfeito.
A voz de Geordie Greep era também um dos guias nesta jornada pelo universo rockeiro que os Black Midi nos proporcionavam, nomeadamente no crescente “Of Schlagenheim”. Não faltou nada ao intenso concerto dos Black Midi, sem dúvida um dos melhores do festival. Já mais do que seduzidos pelo seu álbum de estreia, rendemo-nos agora incondicionalmente à banda. Aguardamos ansiosos o que virá a seguir e esperamos continuar a vê-los por Paredes de Coura nos próximos anos.
OS DEERHUNTER CAÇARAM O TROFÉU
Abandonámos o palco (desta vez só em título) secundário para regressar ao Vodafone e abraçar os Deerhunter que aí vinham. Como esperado, o novo disco dos Deerhunter (no qual Bradford Cox tanto orgulho tem) marcou forte presença nesta performance e recordou-nos o quanto é sempre diferente, e por vezes melhor, ouvir uma banda tocar ao vivo. Em “Death in Midsummer” ou “No One’s Sleeping” cantámos em uníssono com o vocalista, em momentos de total rendição à música e ao seu efusivo intérprete.
Há sempre espaço, contudo, para os temas do passado, os tais clássicos da banda, que todos conhecem e não abdicam de ouvir. “Agoraphobia”, “Desire Lines” ou “Helicopter” soaram tão familiares e reconfortantes que, aos primeiros indícios da coda que se aproximava, já sofríamos por antecipação. Tentávamos captar aquele momento na íntegra, com todos os sentidos apurados, para guardar aquela boa memória para sempre. E, sim, é verdade. “Coronado” não falhou e acabou por surgir, em mais um momento triunfante do concerto: “In my heart, I feel so high/I want to know the answers why”. Como foi bom viver estas palavras, ali, frente a frente com Bradford Cox.
Os Deerhunter não eram os cabeças de cartaz mas deram o melhor concerto do dia. Bradford Cox conquistou-nos a todos e aquela sonoridade tão característica da banda, resultante da mistura do rock experimental com uma ou outra intrusão pop, transportou-nos para outra galáxia, deixando-nos na posição ideal para os Spiritualized.
VIAJÁMOS ESTÁTICOS AO SOM DOS SPIRITUALIZED
Se antes contáramos com uma efusiva atuação que nos fez projetar as vozes num sonoro coro, agora chegava Jason Pierce, que, depois de confortavelmente sentado na ponta do palco com a guitarra ao colo, jamais se levantou até ao final do concerto. Mas isto só prova que para divagar pelo espaço não são necessárias grandes agitações. Bastou “Come Together” do clássico Ladies and gentlemen we are floating in space ou “A Perfect Miracle” do mais recente And Nothing Hurt para cedermos tudo e deixarmo-nos guiar pela imperiosa, irresistível voz de Pierce.
Além da figura do venerado cantautor, em grande destaque, encontrava-se um grupo de três vocalistas femininas, responsáveis por completar harmonicamente a voz de Jason Pierce, contribuindo para a intensificação daquela componente gospel tão fulcral à sonoridade da banda. Entre estalar de dedos sonoros e movimentos teatrais, as cantoras contribuíram para trazer o movimento que Pierce nem sequer se lembrava (para quê?) de oferecer. Foi com toda a sinceridade que, no final da banda, a acompanhámos no cover de “Oh happy day”.
FATHER JOHN MISTY NÃO DESLUMBROU
Para acabar a noite no palco principal chegou a vez do tão esperado Father John Misty. Num animado espetáculo, o cantautor e antigo baterista dos Fleet Foxes (que actuaram ainda o ano passado neste mesmo festival) contou com uma pequena orquestra para produzir a atmosfera sonora que se desprende dos seus temas. Josh Tillman estava animado e descontraído, cantou descalço, dançou, brincou com o microfone. Tivemos direito a canções mais antigas mas também a faixas do novo álbum, que todos os fãs cantaram de cor.
As condições pareciam prometer um concerto memorável mas não foi assim. O som do microfone, demasiado baixo na mistura no início da atuação, não ajudou. Para quem já não era grande fã, as imagens que acompanhavam o concerto também não foram muito apelativas e a verdade é que depois de três concertos fora de série como Black Midi, Spiritualized e Deerhunter, Father John Misty limitou-se a dar uma atuação buliçosa que deleitou os seus mais acérrimos entusiastas mas que não chegou a todos.
Para fechar da melhor forma o penúltimo dia de festival, ainda aproveitámos o After Hours, ao som ritmado de Peaking Lights. Nesta terceira noite do Vodafone Paredes de Coura, não faltaram grandes concertos que se sobrepuseram ao cabeça de cartaz. Hoje será o último dia de festival e podemos contar com as promessas de Patti Smith, Mitski, Suede, bem como outras atuações que, com certeza, darão que falar.