68ª Berlinale | Dia 6 Entre Romy e Utøya
O atentado na ilha de Utøya, Noruega no verão de 2011 foi passado agora a filme intitulado “U-July 22”, do realizador norueguês Erik Poppe “A Escolha do Rei”). Em “3 Days en Quiberon”, da alemã Emily Atef, vemos o início da agonia de Romy Schneider, que deram origem às famosas fotografias de Robert Lebeck.
O dia 22 de julho de 2011, é talvez um dos dias mais negros da história da Noruega, com dois atentados terroristas, no espaço de poucas horas, que chocaram o mundo inteiro. Quando cerca de quinhentos jovens participavam num acampamento de verão do Partido Trabalhista Norueguês, na ilha de Utøya, foram atacados por um extremista de direita fortemente armado. O atentado provocou a morte de cerca de 69 desses jovens. Foi efectivamente uma tragédia que abalou a Noruega e um trauma que ficou até hoje. O realizador Erik Poppe — foi candidato aos Óscares de Melhor Filme de Língua Estrangeira 2017, com “A Escolha do Rei” — atreveu-se a tentar em 90’ reconstituir esse trágico evento, num filme, obviamente ficcionado e baseado em testemunhos dos jovens que estavam em Utøya, nesse fatídico verão de 2011.

“U-July 22” abre com imagens documentais de Oslo onde, pouco horas antes, o mesmo atacante, segundo as investigações da polícia, fez igualmente explodir um carro-bomba, matando oito pessoas. Mas a ficção ou a recriação do incidente, centra-se na ilha e na forma como os jovens adolescentes fogem apavorados e desesperados — e todos com recurso a telemóveis —, e como estranhamente não vemos aparecer ajuda ou intervenção das autoridades, nem dos prováveis adultos presentes no campo; e como aqueles miúdos entre os 12-19 anos resistiram a um tiroteio constante, que na realidade demorou cerca de 72 minutos. Em “U-July 22”, a câmera segue nervosamente Kaja (Andrea Berntzen), uma jovem de 19 anos que está no acampamento com a sua irmã mais nova Emilie (Elli Rhiannon Müller Osbourne). O filme começa basicamente com as duas miúdas discutindo porque Emilie já sem muita vontade de estar no acampamento, prefere ficar na tenda e não ir ao churrasco que ia acontecer naquele momento. Quando Kaja se encaminha para a refeição, começa o tiroteio.

Este primeiro tiro marca o início dessa tragédia filmada num um único plano-sequência, como se fosse visto pelos olhos das vítimas e que nós os espectadores acompanhamos. Sobretudo vemos uma desesperada busca de Kaja pela irmã Emilie, pela floresta e pelas acidentadas margens do lago, acompanhada de outros garotos. O filme é um pouco minimalista e aborrecido, apesar de ser feito de câmera em punho e nervosamente numa única sequência. Mas é n o mínimo marcante pois fica-nos na retina, o medo nos olhos dos jovens, — e isso é bem conseguido pelos jovens actores que complementam certas incoerências do argumento — que não sabem muito bem o que está a acontecer: fogem para a floresta e para as margens do lago e sobretudo, a sua desesperada esperança de que o resgate chegue a qualquer momento. Já que o assassino desconhecido, que vemos apenas uma vez de relance, parece estar cada vez mais perto para os abater, como se fossem bonecos de um videogame.

A actriz austríaca Romy Schneider — foi a jovem princesa Sissi aos 15 anos — trabalhou com Orson Wells e Luchino Visconti, e outros símbolos do cinema da época, tornou-se uma estrela de cinema na década de 60, mas acabou por se envolver em escândalos e pouca sorte na vida: três divórcios — um deles com Alan Delon — romances escaldantes bastante publicitados; o suicídio do seu marido, o ator e director de teatro Harry Meyen, a morte acidental do seu filho de 14 nos ferros das grades de casa; e o seu próprio desaparecimento aos 43 anos de idade. Foi-se a mulher ficou o mito e a realizadora berlinense Emily Atef faz-lhe uma curiosa abordagem em “3 Days in Quiberion”, um filme que não é nem biopic, nem um documentário. Trata-se antes de um retrato ficcional — com Maria Baüer no papel da actriz — feito a partir dos famosos retratos de Robert Lebeck (Robert Gwisdek) e da última entrevista — onde revela muito da sua vida privada — que a atriz deu em vida à revista alemão Stern em 1981, quando se recuperava num hotel spa da costa Bretanha, França.
VÊ TRAILER DE “3 DIAS EM QUIBERON”
Efectivamente as fotografias de Robert Lebeck feitas a Romy Schneider — eram amigos muitos chegados — tornaram-se mundialmente famosas, não só pela beleza da actriz mas também pela forma como elas capturam a natureza contraditória da atriz, a sua exuberância, excessos, melancolia e dor. Lebeck tirou igualmente as fotografias que acompanharam esta lendária entrevista, que Romy Schneider concedeu ao jornalista Michael Jürgs (Charlie Hübner) , — que dá uma lição de jornalismo e ética profissional — da revista Stern, em Quiberon, apesar de muitos conflitos anteriores com a imprensa alemã. A atriz foi para esta cidade balnear bretã para se recuperar, convidando a sua amiga íntima de muitos anos Hilde (Birgit Minichmayr), para lhe fazer companhia. A entrevista e as fotografias a preto e branco são a base deste filme que captura muito bem a atmosfera especial desses três dias em que Romy Schneider descobre sua alma e se revela demasiado, até a um ponto de ruptura. Quanto mais a atriz se expõe e mais permite revelar a pessoa que está por trás da celebridade, mais a dinâmica deste quarteto entra em conflito. Hilde está preocupada em proteger a sua amiga quando ela começa a quebrar reserva em relação à sua vida privada. Face às perguntas colocadas, pelo cínico repórter Schneider responde com uma sinceridade desarmante. Nas várias sessões fotográficas para a entrevista, com Lebeck, que fazem parte do filme consegue-se redescobrir, muitos dos diferentes rostos Romy Schneider. “3 Days in Quiberon”, é um excelente e multifacetado retrato de Romy Schneider onde surge através de uma atriz muito convincente e parecida com a verdadeira Romy Schneider. Em “3 Days in Quiberion”, a realizadora Emily Atef mostra-nos afinal uma mulher muito dada e carente que acredita que não foi admirada ou entendida como merecia.
JVM
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