71º Festival de Cannes | João Salaviza e Renée Nader Massora
A dupla luso-brasileira João Salaviza e Renée Nader Messora ganharam o Prémio Especial do Júri da secção Un Certain Regard, do 71º Festival de Cannes, com o filme “Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos”. Logo após terem recebido o prémio e à saída da Sala Debussy, falaram para a MHD.
O filme luso-brasileiro “Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos”, de João Salaviza e Renée Nader Messora, apresentado na secção Un Certain Regard, foi um dos filmes mais bonitos apresentados na 71ª Festival de Cannes. Trata-se de um filme sobre uma comunidade indígena do Brasil e um belo poema visual, marcado por um equilíbrio perfeito entre o drama e a intriga real.
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Embora possa parecer à partida um documentário “Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos”, é uma história de ficção inspirada no dia-a-dia dos índios Krahô; o filme nasceu da experiência dos dois cineastas luso-brasileiros, que viveram quase um ano em Pedra Branca, uma aldeia do povo Krahô, localizada em pleno cerrado brasileiro, no Estado de Tocatins, não muito longe da capital Brasília.
João Salaviza, já ganhou a Palma de Ouro 2009, com a curta-metragem “Arena”; e Renée Nader Messora, foi sua assistente de realização em “Montanha”, a sua primeira longa-metragem de 2015. Dada a proximidade e esta fantástica experiência cinematográfica e de vida, eles formam agora um casal. Fruto desta intensa e íntima colaboração de meses a fio de filmagens e convívio com os índios “Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos” tornou-se numa jornada que começa e acaba numa bela cachoeira mágica, aninhada no meio da majestosa e escura floresta do cerrado. E este círculo narrativo combina com o tema cíclico que atravessa todo filme e a história de partida e regresso às origens.
Ihjãc é um jovem índio Krahô, que vive com a sua jovem mulher e o seu filho bebé numa pequena aldeia, na orla da floresta. No seu caminho para um ritual que marca o fim do período de luto e que permitirá que o espírito de seu pai passe para o reino dos mortos, Ihjãc começa a ouvir uma voz (a do pai, claro!) que o encoraja a entrar na água da cachoeira. O seu filho de meses não para de chorar. Incomodado com o choro do bebé, com o contacto com o falecido pai e apreensivo em seguir a vida xamã (ou de chefe) da aldeia, Ihjãc arranja um pretexto para partir para a cidade mais próxima dos brancos, à procura de outra oportunidade de vida.
No entanto, a sociedade brasileira moderna também ‘não entende os índios’. Em última análise, até parece a sua própria comunidade, que está lentamente a desaparecer, com a cada vez maior proximidade dos brancos. Se no início, Ihjãc não sente a contaminação da cidade moderna, rapidamente esta e as suas instituições rejeitam-no e mandam-no de volta a casa, para continuar a enfrentar a sua dor e a de seu povo.
“Chuva é Cantoria na Aldeia dos Mortos” destaca-se ainda pela impressionante fotografia, edição cuidada e uma extraordinária paisagem sonora tanto na floresta como na cidade.
José Vieira Mendes (em Cannes)