Ao Encontro de Mr. Banks, em análise

 

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  • Título Original: Saving Mr. Banks
  • Realizador: John Lee Hancock
  • Elenco: Emma Thompson, Tom Hanks, Annie Rose Buckley, Paul Giamatti, Jason Schwartzman
  • Género: Drama, Biografia
  • ZON | 2013 | 125 min

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“Olha só para eles. Gostam mais do pai do que de ti.”, diz o guarda-chuva falante de Mary Poppins nos derradeiros momentos do filme homónimo. Ao que Mary Poppins responde: “Assim é que deve ser”.

Esse diálogo surge a propósito da missão de ’salvamento’ à família Banks que Mary Poppins acabara de finalizar, conseguindo unir os filhos de Mr. Banks, Jane e Michael, a um pai aparentemente austero mas profundamente apaixonado.

Compreendemos, depois de vermos o novo filme de John Lee Hancock (que já nos tinha trazido “Um Sonho Possível”, com Sandra Bullock), que essa missão de salvamento tinha um alvo bastante mais concreto: Mr. Banks. E é ao encontro de Mr. Banks que este filme se dirige com uma doçura vertiginosa. Quem era o Mr. Banks? Porque é que ele precisava de ser salvo?

Embora não sendo excecional, fica difícil não olhar para “Ao Encontro de Mr. Banks” como complemento digno e essencial de “Mary Poppins”. Não se pense que aqui nos cingimos à dificuldade de Walt Disney (Tom Hanks) em cumprir o desejo das suas filhas que lhe imploraram que fizesse um filme a partir do seu livro favorito, “Mary Poppins” de P. L. Travers (Emma Thompson), a escritora inflexível que não tem qualquer intenção de deixar a sua adorada ama mágica ser atacada pela máquina de Hollywood. Se quisermos, “Ao Encontro de Mr. Banks” complementa “Mary Poppins” em duas vertentes distintas: a origem do filme e a origem da história.

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Recorrendo a flashbacks que vão interceptando a narrativa primordial (a luta pelos direitos do livro de ”Mary Poppins”), essas duas vertentes vão-se construindo mutuamente, sendo o presente (em 1961) sempre influenciado pelos fantasmas do passado de P. L. Travers, e vice-versa.

Passados 20 anos desde a primeira abordagem de Walt Disney a Travers, a intransigência permanece. Mas só com a descoberta do passado de Travers é que desvendamos o real motivo dessa relutância em transformar Mary Poppins em mais um dos símbolos da Disney. Mr. Banks, esse pai imperfeito mas apaixonado, precisava de ser salvo, da mesma forma que o pai de Travers também precisou no passado. A inflexibilidade de P. L. Travers em ceder “Mary Poppins” para Walt residiu sempre no respeito e admiração que teve para com o seu pai e que a impedia de confiar naquilo que Walt reservava para a adaptação cinematográfica da sua obra.

É uma pena que os flashbacks não sejam tão entusiasmantes como a narrativa-mãe. Apoiam-se facilmente no melodramatismo manipulativo (impulsionado pela belíssima composição de sons da autoria de Thomas Newman) que nos tenta levar às lágrimas através das problemáticas familiares que apresenta, e usufrui de uma construção narrativa demasiado académica (Colin Farrell é um exemplo claro de preguicite no erguer do seu personagem estereotipado).

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Bem mais interessante é a dinâmica que se vê nos bastidores de “Mary Poppins”: desde a criação das canções, diálogos, perfis dos personagens… conjuntos deliciosos de cenas onde se torna impreterível assistir primeiro ao filme de 1964 para se poder absorver todos os doces pormenores. Muita dessa dinâmica deve-se ao elenco secundário (com destaque para Bradley Whitford, B.J. Novak e Jason Schwartzman), mas fundamentalmente devido à interação entre Tom Hanks (apesar do seu Walt Disney ser um exemplo claro do politicamente correto) e Emma Thompson. É incompreensível o desdém da Academia pela prestação dessa senhora que aqui, como é seu habitual, é soberba na construção agridoce de uma escritora abalada por um passado denso e incapaz de encarar o frágil presente.

Há, no entanto, uma problemática maior que pode causar uma ‘comichão’ superlativa. Sabe-se que Walt Disney, apesar de todo o seu amor ao Cinema e à sua obra – Mickey, como se diz no filme, era da sua família – não foi, de todo, o símbolo do homem ideal. Também P. L. Travers não terá ficado tão satisfeita com o resultado final de “Mary Poppins” como o filme de John Lee Hancock sugere – muito pelo contrário. Curioso é que este é um filme feito pela Walt Disney baseado numa história onde o próprio Walt Disney intervém. Se perceberam o que acabamos de dizer, então é legítimo considerar “Ao Encontro de Mr. Banks” como uma obra extremamente pretensiosa que esconde os ‘podres’ desta relação mas exalta a versão dramática e adocicada dos factos.

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Mesmo assim, esse pretensiosismo não é um impedimento muito relevante para o avanço da história. O resultado é que, ao invés de uma perspetiva mais ácida – e mais real – dos acontecimentos, temos uma visão simpática, que não ofende ninguém e, ao jeito da Disney, se vê muito bem. Afinal, tal como Mary Poppins diz “a spoonful of sugar helps the medicine go down”.

Albert Einstein, Van Gogh, Roosevelt e Frida Kahlo, diz Travers a certa altura, todos tiveram dificuldades na vida e não foi isso que os impediu de fazer tudo o que qualquer pessoa pode fazer. É esta a mensagem necessária a subliminar que fica deste conto Disney: a certeza de que os nossos sonhos não podem ser condicionados pelas adversidades que a vida nos ofereceu. Não seria este um filme Disney se não fosse possível ler uma mensagem moral desta natureza.

Se me perguntarem se “Ao Encontro de Mr. Banks” foi supercalifragilisticexpialidocious, terei de responder de forma negativa. O ato de pronunciar essa mágica palavra que inspirou a geração Disney dos anos 60 obriga a que, mal os créditos comecem a rolar, não se tenha mais nada para dizer. Este não é o caso. “Ao Encontro de Mr. Banks” não é uma obra que nos deixe sem palavras, mas talvez nem fosse esse o seu objetivo. Por vezes, um doce sorriso nos lábios é tudo o que precisamos.

DR


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