"Asiáticos Doidos e Ricos" | © Warner Bros.

Asiáticos Doidos e Ricos, em análise

Aquando da sua estreia mundial em 2018, “Asiáticos Doidos e Ricos” não teve direito a uma distribuição nos cinemas portugueses. No entanto, esta comédia romântica de sucesso chegou agora à Netflix.

A história da comédia romântica, enquanto género cinematográfico, é uma odisseia atribulada, cheia de altos e baixos, reviravoltas e cismas culturais profundos. Os anos 20 e 30 do século XX foram o auge deste tipo de cinema, sendo um modelo narrativo que sobreviveu bem à transição do mudo para o sonoro. Nas décadas seguintes, histórias de amor com um toque humorístico continuaram a singrar, mas, com o nascimento do blockbuster nos anos 70, tudo mudou. A partir daí, a audiência ideal para a qual Hollywood afunilava seus maiores investimentos era composta por rapazes adolescentes, fazendo da comédia romântica um modelo cada vez menos seguro. O fim do século XX e início do XXI trouxe uma segunda era doirada, pelo menos em termos de viabilidade comercial, mas, aí por volta de 2011, tudo mudou novamente e a comédia romântica passou a estar fora de moda.

Hoje em dia, quando um filme assim alcança algum sucesso, é logo alvo de boa atenção crítica, sendo principalmente elogiado pela sua suposta renovação de um género morto. Assim aconteceu quando “Amor de Improviso” se tornou num improvável fenómeno e assim voltou a ocorrer quando “Asiáticos Doidos e Ricos” ganhou aclamação e até conquistou uma nomeação do prestigiado Sindicato dos Atores de Hollywood (SAG). O melhor de tudo é que, longe de tentar reinventar a comédia romântica, este mais recente triunfo alcançou a glória através da celebração dos apelos tradicionais do género. De facto, o tipo de cinema que melhor se compara a “Asiáticos Doidos e Ricos” é o escapismo doirado da Grande Depressão. Contudo, antes de elaborarmos tal analogia, talvez fosse melhor explicar um pouco a história do filme.

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© Warner Bros.

Baseado num romance de Kevin Kwan, “Asiáticos Doidos e Ricos” centra-se numa professora universitária Sino-Americana, Rachel Chu, que é inesperadamente convidada pelo seu charmoso namorado, Nick Young, a visitar a família dele em Singapura. Acontece que um grande amigo dele se vai casar e quer que Nick seja seu padrinho, levando com que o casal viaje até à Ásia, onde Rachel acaba por descobrir alguns segredos do amado. Nick Young não é um Nick Young qualquer, mas sim um dos membros da família mais abastada da região, uma dinastia bilionária cuja influência se estende sobre todo o continente asiático. O que era suposto ser uma visita inocente e relaxada, depressa se torna num jogo para ganhar a aprovação de uma linhagem de snobs endinheirados cuja matriarca, Eleanor, está particularmente decidida a desaprovar das escolhas amorosas do filme. Afinal, enquanto pobretanas e americana, Rachel simplesmente não vive no mesmo plano de existência dos Young.

Basicamente, a nossa professora é uma Cinderela dos tempos modernos e Nick é o príncipe encantado cujo amor ela tentará “merecer”. Até há uma espécie de fada-madrinha sob a forma de Peik Lin Goh, uma amiga de longa data de Rachel que logo se oferece para dar uma makeover personalizada à companheira. Tudo isto é cliché, mas “Asiáticos Doidos e Ricos” sabe como tornar isso numa mais-valia, encontrando dimensões inesperadas nestes lugares-comuns. Muito desse génio provém da interseção cultural e étnica em que o filme se encontra, adaptando uma história já muito contada a pessoas cuja vida raramente foi tão abertamente celebrada por Hollywood. Isso é especialmente fantástico no que se refere à personagem principal, cuja condição enquanto filha de imigrantes influencia o modo como ela encara o classismo vil de Eleanor Young.

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© Warner Bros.

Também ajuda, pois claro, que este tipo de narrativa seja o pretexto ideal para uma orgiástica explosão de luxo. Tal como os filmes da Grande Depressão, “Asiáticos Doidos e Ricos” não se envergonha do seu amor pela riqueza material, construindo inteiras sequências em torno da espetacularidade com que os Young vivem suas vidas. O casamento do clímax é de especial beleza, sendo uma produção digna dos palcos da Broadway, com figurinos ostentosos e uma passerelle de água incluídos. É um fausto que maravilha e entretém, mas há ainda um elemento humano que ancora toda esta loucura. Como já dissemos Rachel é uma personagem excelente e a performance de Constance Wu é ainda melhor. Com isso dito, há uma interpretação ainda mais sublime entre o elenco desta fita.

Trata-se de Michelle Yeoh como Eleanor Young, uma figura que foi habilmente alterada das suas origens literárias. No livro original, ela é uma caricatura histérica. No filme, ela é uma força da natureza tão cruel como magnética, uma mulher impiedosa que fará tudo o que for preciso para garantir a felicidade do filho. O problema encontra-se no facto que ela pensa saber o que é melhor para ele e isso nem sempre é o caso. Yeoh é imperiosa no papel, mas sabe quando mostrar o lado mais vulnerável da personagem. Numa cena estrondosa onde o mahjong serve de metáfora para o jogo de poderes entre Rachel e Eleanor, ambas as atrizes mostram o peso emocional da situação sem nunca exagerarem a expressão ou implorarem pela simpatia barata do espectador. Nas mãos destas mulheres, “Asiáticos Ricos e Doidos” nunca seria algo menor que um triunfo.

Asiáticos Doidos e Ricos, em análise
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Movie title: Crazy Rich Asians

Date published: 30 de June de 2020

Director(s): Jon M. Chu

Actor(s): Constance Wu, Henry Golding, Michelle Yeoh, Awkwafina, Gemma Chan, Ken Jeong, Lisa Lu, Sonoya Mizuno, Chris Pang, Jimmy O. Yang, Ronny Chieng, Remy Hill, Nico Santos, Jing Lusi

Genre: Comédia, Drama, Romance, 2018, 120 min

  • Cláudio Alves - 75
  • Maggie Silva - 68
  • Inês Serra - 70
  • Marta Kong Nunes - 75
72

CONCLUSÃO:

Divertido, glamouroso e cheio de charme, “Asiáticos Doidos e Ricos” é um triunfo que todos os fãs de comédias românticas deviam ver. É bom saber que, mesmo quando o género deixou de ser moda, Hollywood ainda é capaz de produzir algumas romcoms de sucesso.

O MELHOR: O argumento é um fabuloso trabalho de adaptação que consegue resolver muitos dos problemas narrativos do livro. Além disso, os figurinos belíssimos e o elenco impecável são as maiores mais-valias do filme.

O PIOR: É óbvio quanto esta história foi pensada como o começo de um franchise, fazendo com que algumas partes do filme tenham a aparência de estar incompletas. A aparição, durante os créditos, de Harry Shum Jr. é particularmente infeliz nas suas intenções mercenárias. Antes de se pensar em sequelas, convém fazer um filme que funcione enquanto objeto singular de cinema.

CA

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  1. Maggie Silva 30 de Junho de 2020

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