Grandes filmes sem distribuição em Portugal

Grandes filmes que nunca chegaram aos cinemas portugueses

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Apesar de boas críticas, aclamação popular e grandes orçamentos, há muitos filmes que não são distribuídos comercialmente em Portugal, nunca chegando aos nossos cinemas.

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Com o sucesso estrondoso de “Crazy Rich Asians” nos EUA, tanto a nível crítico como comercial, é frustrante verificar que o filme ainda não tem data de estreia para Portugal. Se esta comédia romântica seguir o mesmo caminho que outros triunfos populares americanos como “Straight Outta Compton” seguiram, então já podemos perder a esperança de que o filme alguma vez seja visto no grande ecrã neste país.

Com sorte, poderemos encontrá-lo em alguma plataforma online ou em DVD. Não desejamos que isto ocorra, mas, como já referimos, não seria a primeira vez. Tanto triunfos críticos que alcançaram sucesso nos festivais de cinema, como produções mais mainstream têm a ocasional infelicidade de não ser comprados por nenhum distribuidor de cinema em Portugal. Neste artigo, gostaríamos de listar alguns dos exemplos mais flagrantes deste fenómeno.

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Gostaríamos de ver CRAZY RICH ASIANS nos cinemas portugueses.

Para não acabarmos com uma lista com mais de mil títulos, tentámos restringirmo-nos a títulos estreados nos últimos dez anos, a maioria dos quais nem sequer chegaram às audiências portuguesas sob a forma de edições em DVD ou Blu-Ray. Foi também feita uma tentativa de evitar obras como documentários, cuja distribuição é uma raridade tão grande que a sua ausência das salas de cinema nacionais não é nenhuma surpresa.

Segue as setas para veres alguns dos melhores filmes que nunca chegaram aos cinemas portugueses. As obras estão ordenadas pela sua idade, estando os filmes mais velhos primeiro. Cada slide é acompanhado por uma explicação dos méritos dos filmes, que podes ler ou não.

Em todo o caso, vem descobrir esta nossa lista e vê se lá encontras alguma gema cinematográfica que gostarias de poder ter visto no grande ecrã.




CAIRO TIME (2009) de Ruba Nadda

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Uma carta de amor ao Cairo e ao charme de Patricia Clarkson.

Qualquer filme com Patricia Clarkson é um projeto que merece a nossa atenção. Quando se trata do raro caso em que a atriz tem direito a um merecido papel de protagonismo, então estamos perante algo verdadeiramente imperdível. “Cairo Time” é essa mesma joia de imperdível cinema, contendo em si uma das grandes prestações de Clarkson que aqui interpreta Juliette Grant, a esposa entediada de um oficial das Nações Unidas.

Ela está sozinha no Cairo, à espera do marido e em busca de algo que a distraia da sua solidão numa cidade desconhecida. Essa distração manifesta-se na forma de Tareq Khalifa, um amigo do marido, que decide mostrar a Juliette a cidade do ponto de vista de um dos seus residentes, salvando-a dos confins marmóreos e frios do seu hotel. Na boa tradição de filmes como “Antes do Amanhecer” e “Lost in Translation”, os passeios pela cidade estrangeira acabam por florescer em romance.

Não que “Cairo Time” seja uma repetição de clichés narrativos sem nada mais para oferecer que umas vistas do Cairo dignas de postal. De facto, o filme é uma carta de amor à capital egípcia, mas Clarkson e seu coprotagonista Alexander Siddig trazem nuance e maturidade ao romance. Nas mãos dos dois atores, muito ajudados pela gentileza de Ruba Nadda, esta história trespassa a perspetiva de duas pessoas desapontadas com o estado das suas vidas que encontram um no outro a chance de algo tão efémero quão fulgurante.




COMO MATEI A MINHA MÃE (2009) de Xavier Dolan

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Apaixonadamente imaturo.

Ao longo da última década, Xavier Dolan tem vindo a afirmar-se como um dos grandes cineastas do século XXI, portador de uma voz autoral de incomum exuberância estilística, assim como uma coleção de temas em constante repetição e evolução. Nesse sentido, a sua primeira longa-metragem é uma obra de particular interesse, representando a génese do seu discurso estilístico, mas também a primeira manifestação do seu já habitual registo de melodrama doméstico, onde as relações atribuladas entre mães e filhos se impõe sobre quaisquer outras dinâmicas familiares.

Para além de nos apresentar a apoteose desse conflito maternal-filial na filmografia de Dolan, “Como Matei a Minha Mãe” é também o filme mais deliciosamente imaturo do realizador. Isso é especialmente verdade a nível estilístico, onde existe uma qualidade quase experimental e estudantil na abordagem do realizador juvenil. Noutros casos, tal qualidade poderia trazer consigo o desastre, mas nesta história tão apoiada na perspetiva impetuosa de um adolescente, a imaturidade estilística torna-se em mais um mecanismo de visualização da realidade emocional das personagens.

O filme foi um triunfo em Cannes, mas não teve direito a distribuição nos cinemas portugueses. Felizmente, para fãs ávidos deste cineasta, “Como Matei a Minha Mãe” é um dos poucos filmes nesta lista que ainda teve direito a uma edição em DVD para o mercado nacional.




FOR COLORED GIRLS (2010) de Tyler Perry

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Extraordinárias atrizes, extraordinários desempenhos.

Os filmes de Tyler Perry, talvez pela sua suposta especificidade afro-americana, tendem a nunca encontrar distribuição fora dos EUA, não obstante a sua popularidade comercial. Em muitos casos, essa mesma falta de distribuição internacional não é nenhuma tragédia, sendo muitos dos seus esforços infelizes fracassos dramáticos. Contudo, é na filmografia de Perry que muitas das melhores atrizes americanas dos nossos dias têm vindo a encontrar o tipo de papéis carnudos a que, devido à sua etnia, raramente têm acesso em Hollywood.

For Colored Girls”, um épico mosaico de melodrama e tragédia livremente adaptado do poema homónimo de Ntozake Shange, é o suprassumo exemplo desta faceta na oeuvre de Tyler Perry. Afinal, aqui o cineasta reúne Loretta Devine, Kimberly Elise, Whoopi Goldberg, Janet Jackson, Thandie Newton, Phylicia Rashad, Anika Noni Rose, Tessa Thompson, Kerry Washington e Macy Gray num só filme onde todas elas têm direito a pelo menos um titânico monólogo em verso.

Por outras palavras, para fãs de grande trabalho de ator, este é um filme essencial. As prestações de Elise e Noni Rose são particularmente poderosas, encontrando um equilíbrio perfeito entre articulação poética e a visceralidade brutalista que o filme exige às suas destemidas intérpretes.




HIGHER GROUND (2011) de Vera Farmiga

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Vera Farmiga é uma grande atriz e uma grande realizadora.

Vera Farmiga é uma das melhores atrizes americanas da contemporaneidade, tendo já alcançado sucesso tanto no grande como no pequeno ecrã, em grandes produções, curiosidades de género e até em cinema independente de micro orçamento. O que poucas pessoas sabem é que a atriz também já experimentou fazer cinema do outro lado das câmaras e, surpreendentemente, os resultados foram tão ou mais admiráveis que os seus esforços como atriz.

Inspirado num livro autobiográfico de Carolyn S. Briggs, “Higher Ground” é o retrato da relação de uma mulher com a sua fé ao longo de vários anos, que englobam a sua juventude, matrimónio, maternidade e até a separação do marido e da comunidade religiosa no seio da qual vivia. O argumento, já por si, é uma maravilha, construindo complicadas interrogações espirituais sem nunca tornar as suas personagens em símbolos ou argumentos antropomorfizados, sempre mantendo uma perspetiva graciosamente humanista em relação a todo o drama que em si se desenrola.

A realização e direção de atores de Farmiga, que também protagoniza o filme e oferece uma das suas mais delicadas e complexas caracterizações, é igualmente soberba, mesmo que possa parecer diabolicamente simples. Para fãs de Vera Farmiga, é uma tragédia que este elegante drama sobre o papel da dúvida na vida religiosa nunca tenha sido distribuído em Portugal.




WEEKEND (2011) de Andrew Haigh

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O romance uma vida, em dois dias.

Ao longo das nossas vidas há uma infinidade de pessoas com quem nos cruzamos e que, se lhes déssemos oportunidade, talvez pudessem mudar tudo acerca da nossa existência. A história de uma vida é uma cronologia de oportunidades perdidas. Em “Weekend”, Andrew Haigh explora essa mesma realidade, construindo um dos mais belos duetos cinematográficos de sempre.

Nesta modesta narrativa, dois homens encontram-se num bar noturno, dormem juntos e passam um fim-de-semana juntos. Ao longo desses dois dias partilham com um relativo estranho coisas que nunca outrora teriam a ousadia de partilhar, como que se abrindo um ao outro. No fim destes dois dias, um dos homens vai partir para uma nova vida do outro lado do Atlântico e este não é o tipo de romance em que tais obstáculos sejam derrubáveis.

Apoiado na efemeridade desta ligação sexual e emocional, Andrew Haigh, que aqui assinava a sua primeira longa-metragem de ficção, constrói um dos mais lacerantes estudos de intimidade no cinema moderno, dissecando as suas personagens com tanta precisão como afeto. Na filmografia do cineasta, seguir-se-iam a este triunfo outras obras-primas, “45 Anos” e “O Meu Amigo Pete”, mas “Weekend” continua a ser a grande jóia triunfal na carreira de Haigh.




BELEZA OCULTA (2011) de Julia Leigh

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Perversamente belo.

Julia Leigh é o raro caso de uma escritora que fez a transição para o cinema, não somente através da escrita de argumentos, mas também com a realização de um filme. Essa obra, sua única longa-metragem até à data, foi “Beleza Oculta”, que foi selecionado para o Festival de Cannes em 2011 e, graças aos seus temas sexuais, acabou por se tornar num dos filmes mais discutidos e controversos dessa temporada de festivais de cinema.

Pervertendo vários temas e mecanismos dos contos de fadas clássicos, esta devassa obra-prima conta a história de uma estudante universitária que começa a trabalhar numa bizarra empresa que oferece serviços sexuais e eróticos. Leigh telegrafa o processo pelo qual a sua protagonista é tornada num objeto, como o seu corpo e sua interioridade são separados e sua submissão artificial é tida como um tesouro para quem paga por ela.

Este é um filme difícil e obsceno, uma tapeçaria de depravação, humilhação e jogos de poder que tanto fascinam como repugnam. É também um triunfo formal do mais alto gabarito, com a realizadora estreante a demonstrar uma atenção para com ritmos, dialética visual e sensualidade cinematográfica que muitos cineastas mais experientes nunca alcançam no seu trabalho. Frio e sedutor, um pesadelo e um sonho de mãos dadas, este é um filme assombroso e chocante que merece ser visto. Felizmente, para audiências portuguesas, o filme está disponível em plataformas online como a FILMIN, mesmo que nunca tenha sido comercialmente distribuído no grande ecrã.




MARGARET (2011) de Kenneth Lonergan

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Um épico nova-iorquino, um mito cinematográfico.

Em 2000, Kenneth Lonergan estreou aquele que foi o seu primeiro filme assim como a sua primeira obra-prima cinematográfica “Podes Contar Comigo”. O drama sobre a relação complicada entre uma mãe solteira e seu irreverente irmão mais novo, fez de Lonergan um dos grandes nomes no panorama do cinema independente americano e muitos eram os cinéfilos que esperavam ansiosamente a sua próxima obra. Tal projeto era “Margaret”, um retrato épico da Nova Iorque do pós-11 de setembro vista através dos olhos egocêntricos e moralmente absolutistas de uma adolescente.

As filmagens decorreram entre 2005 e 2006, mas quando chegou a altura de editar este monstro de ambição artística, Lonergan deparou-se com uma crise criativa. Quatro anos passaram na sala de montagens até que os produtores arrancaram o filme das mãos do seu realizador e foi preciso a intervenção de Martin Scorsese para que “Margaret” chega-se aos cinemas numa forma minimamente funcional.

No final deste doloroso processo, o filme é algo com uma reputação mítica e uma densidade concetual e humana que mais parece pertencer às páginas de um grande romance ao estilo de “Ulisses” de Joyce do que ao grande ecrã. Tal dimensão literária não implica que este não seja um triunfo assombroso de cinema, com uso de som e mise-en-scène tão ou mais impressionantes que o seu texto novelístico ou sua tapeçaria de perfeitas prestações, incluindo Anna Paquin a retratar uma das personagens adolescentes mais genuínas que a sétima arte já produziu.




DESPUÉS DE LUCÍA (2012) de Michel Franco

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Crueldade intolerável.

Después de Lucía” foi o filme que pôs o cineasta mexicano Michel Franco no mapa, tendo ganho a competição Un Certain Regard do Festival de Cannes e até foi exibido em Portugal no LEFFEST de 2012. Infelizmente, nada disso levou a que o filme tivesse grande distribuição internacional, não obstante a triste “universalidade” dos seus temas.

Afinal, esta é a história de uma rapariga a enfrentar o monstruoso abuso psíquico e físico dos seus colegas de escola, cujos jogos de humilhação vão desde brincadeiras cruéis de crianças a atos genuinamente criminosos. De certo modo, o filme segue o mesmo modelo traçado por obras passadas como “Carrie” e “Bully”, pelo menos na sua primeira metade, quando retrata a odisseia de sofrimento da sua protagonista.

Na sua segunda metade, contudo, o filme transforma-se em algo inesperado, transferindo o protagonismo da narrativa para o pai desesperado da adolescente titular. Ao passar a perspetiva para aquele que observa impotente as consequências do bullying, “Después de Lucía” vai caindo numa espiral de violência e vingança que Franco nos mostra com uma abordagem tão rica em precisão psicológica como num registo formal frio, quase clínico. Não há nada mais fácil que nos deixar cair na indulgência da crueldade, o que é perigoso para aqueles que nos rodeiam e para nós próprios.




MOTHER OF GEORGE (2013) de Andrew Dosunmu

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Um poema sobre solidão urbana, colisões culturais e um matrimónio em crise.

Andrew Dosunmu é um fotógrafo e cineasta nigeriano que, na última década, assinou três filmes tão estética e narrativamente sofisticados que, para um grupo seleto de cinéfilos, ele se tornou numa das vozes mais excitantes do cinema contemporâneo. Para se entender tal apreciação, basta ver o filme que se encontra no meio desse terceto, “Mother of George” estreado em 2013.

Esta é a história de Adenike, uma mulher nigeriana recentemente casada e a viver em Brooklyn e cujo matrimónio é ameaçado pela dificuldade do casal em engravidar. A narrativa ocasionalmente inclui alguns toques de melodrama, mas Dosunmu contorna os excessos que isso possa sugerir e constrói um registo entre o realismo urbano e a ópera psicológica, imergindo o espectador numa visão de angústia doméstica e cultural que é tão bela como assombrosa.

Com imagens que mais parecem pinturas vivas, muito graças aos esforços do diretor de fotografia Bradford Young e do figurinista Mobolaji Dawodu, uma paisagem sonora ostentosamente expressiva e uma titânica prestação central de Danai Gurira, “Mother of Goerge” é uma obra-prima. Ignorar tamanha jóia cinematográfica é um imperdoável crime para qualquer cinéfilo que se preze.




EASTERN BOYS (2013) de Robin Campillo

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Três atores em estado de graça.

Robin Campillo é um cineasta francês que construiu uma invejável carreira principalmente apoiada no trabalho de argumentista e montagem. As suas colaborações com Laurent Cantet são de particular destaque, incluindo o vencedor da Palme d’Or de 2008, “A Turma”. No entanto, das três vezes que Campillo se aventurou no campo da realização de cinema, os resultados foram extraordinários.

É verdade que somente o seu terceiro projeto como realizador, “120 batimentos por Minuto”, conseguiu alcançar ao cineasta grande reconhecimento internacional, mas os seus trabalhos anteriores são tanto ou mais merecedores de admiração. Gostaríamos de destacar “Eastern Boys”, outro projeto de temas LGBTQ+, que se foca na relação entre um homem de meia-idade francês e o jovem prostituto ucraniano com que este estabelece uma complicada relação de manipulação, mentira, obsessão mútua e algo parecido com amor.

Construindo uma tapeçaria cinematográfica onde se unem elementos do romance, do thriller criminal e do estudo sociológico de uma França onde imigrantes são sistematicamente explorados, Campillo assina aqui uma obra tão fascinante quanto ambiciosa. É também um filme com sequências capazes de nos injetar adrenalina nas veias e de nos intoxicar com o erotismo de dois estranhos a descobrirem o corpo um do outro. O melhor de tudo é o terceto de prestações espetaculares de Olivier Rabourdin, Kirill Emelyanov e Daniil Vorobyov que eximiamente caminham a corda bamba entre perversidade, superioridade moral e miserabilismo sociopolítico que o filme encontra nas dinâmicas das suas personagens.




CAMP X-RAY (2014) de Peter Sattler

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Kristen Stewart, atriz rainha do cinema de autor atual.

Algumas das mais excitantes experiências cinematográficas na história do meio envolvem a observação de pares de grandes atores em verdadeiros duetos de dança e combate conversacional. Ingmar Bergman praticamente construiu metade da sua filmografia com base nesse mesmo modelo e, nos anos 90, Jodie Foster e Anthony Hopkins até trouxeram tal dinâmica ao mundo do terror com fenomenais resultados.

Camp X-Ray” é um filme que segue tais exemplos, construindo-se à volta da relação entre dois indivíduos que, tal como em “O Silêncio dos Inocentes”, tendem a falar através das grades de uma prisão. Só que aqui não se trata de um manicómio fantasioso, mas sim do inferno bem real de Guantanamo, onde uma jovem militar é confrontada com a humanidade de um prisioneiro muçulmano que todo o seu treino a ensinou a encarar como uma criatura a ser odiada.

Os atores que dão vida a este dueto humano e ideológico são o iraniano Peyman Moaadi, principalmente conhecido pelas suas colaborações com Asghar Farhadi, e Kristen Stewart, cuja luminosa carreira em cinema de autor tem vindo a ser sistematicamente ofuscado pelos passos em falso do início da sua filmografia. Ambos os atores são espetaculares aqui, trazendo naturalismo interpretativo e explosividade retórica a um filme que, infelizmente, continua a ser politicamente relevante.




DEAR WHITE PEOPLE (2014) de Justin Simien

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Humor satírico de mãos dadas com raiva ativista.

Nos dias que correm, “Dear White People” é uma das séries mais politicamente destemidas da Netflix e um dos grandes focos de talento afro-americano em televisão. No entanto, foi no cinema que a ideia dessa série teve a sua génese, quando Justin Simien decidiu redirecionar a sua fúria em relação aos conflitos raciais do seu país, especialmente aqueles focados no universo académico das universidades americanas, para a construção de uma sátira tão divertida como cáustica.

A forma desta comédia é uma espécie de retrato coletivo das dinâmicas raciais numa faculdade de elite, focando-se na vida de quatro estudantes afro-americanos que lidam com esta faceta da sua existência de maneiras extremamente diferentes. O argumento nem sempre brilha pela coerência e síntese narrativa, mas a sua determinação panfletária e execução energética muito fazem para disfarçar os seus mais perniciosos problemas.

O elenco também muito faz para elevar o projeto, com especial destaque para as duas atrizes com os dois papéis mais centrais. Teyonah Parris filmou “Dear White People” quando o público em geral apenas a conhecia como uma das secretárias de “Mad Men” pelo que a sua presença e capacidade para retratar uma jovem cheia de contradições identitárias e ideológicas surpreendeu muita gente. Tessa Thompson, por outro lado, teve aqui o seu primeiro grande papel e com ele eletrizou o filme, sintetizando o seu discurso agressivo, fervorosa indignação e humor afiado.




BEYOND THE LIGHTS (2014) de Gina Prince-Bythewood

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Assim nasce uma estrela.

Audrey Hepburn em “Férias em Roma”, James Dean em “A Leste do Paraíso”, Julie Andrews em “Mary Poppins”, John Travolta em “Febre de Sábado à Noite” e Jennifer Lawrence em “Despojos de Inverno” são alguns exemplos de interpretações que, do dia para a noite, tornaram certos atores em estrelas de cinema. Se houvesse justiça no mundo, poderíamos incluir nesta lista Gugu Mbatha-Raw em “Beyond the Lights”, mas tal não é o caso.

Seguindo o tipo de texto voluptuosamente melodramático que era mais típico nos anos 50 que nos nossos dias, o filme conta a história de uma cantora popular com uma difícil relação com a sua ambiciosa mãe e com a própria realidade da fama. Uma noite, ela tenta suicidar-se, mas é salva por um polícia com quem a jovem estrela acaba por desenvolver um intenso romance, que a ajuda a sair das garras controladoras da mãe e a afirmar-se como uma artista por conta própria.

Os detalhes raciais do argumento e sua contaminação do conflito familiar dão um toque de necessária nuance emocional ao filme, mas é na prestação de Mbatha-Raw que o filme vive ou morre e ela é simplesmente sublime. Ela eletriza a câmara e comanda os nossos olhos a segui-la, desmancha-se em epítetos de sofrida vulnerabilidade e brilha com a presença uma estrela. No seu trabalho, o melodrama clássico da premissa narrativa e as gradações sociopolíticas do argumento encontram perfeita síntese, sendo esta uma prestação tão rica em carisma e emoção como em inteligência e complexidade concetual.




THE FINAL GIRLS (2015) de Todd Strauss-Schulson

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Metacinema hilariante, assustador e comovente.

Nos últimos anos, muitos têm sido os filmes de terror que, depois de estrearem no circuito dos festivais, se tornam surpreendentes triunfos críticos. Há quem chame a este fenómeno a emergência do terror de prestígio, com filmes como “Hereditário”, “Vai Seguir-te” e a “A Bruxa”. Não obstante a vitória que este fenómeno representa para o cinema de terror, alguns dos seus subgéneros têm sido sistematicamente menosprezados, nomeadamente a comédia de terror. Uma das melhores comédias de terror dos últimos tempos é “The Final Girls”.

Nesta endiabrada obra de metacinema, a filha de uma scream queen dos anos 80 que recentemente morreu, acaba por entrar, juntamente com um grupo de amigos, no mundo de um dos filmes antigos da sua mãe. Presos nessa dimensão de clichés cinematográficos e fórmulas perigosas, estes nossos dois grupos de heróis tentam sobreviver a todo o custo, mesmo quando sabem que só pode haver uma ‘final girl’.

Para fãs de slashers, que bem conhecem as regras destas narrativas, o filme é uma deliciosa desconstrução cinemática. Para quem não tem tais conhecimentos, “The Final Girls” funciona à mesma como uma comédia irreverente, tingida pela dor de uma filha a lidar com a morte da sua adorada mãe. O melhor de tudo é o elenco perfeito, incluindo Malin Akerman que dá aqui a melhor prestação da sua carreira.




CHI-RAQ (2015) de Spike Lee

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Um cocktail Molotov de audacidade cinematográfica e indignação política.

Spike Lee é, simultaneamente, um dos mais interessantes e mais inconsistentes cineastas americanos da atualidade. A sua filmografia está tão recheada de obras-primas indisputáveis como “Não Dês Bronca” e “4 Little Girls” como de fracassos ambiciosos à la “Red Hook Summer” e umas poucas desgraças indefensíveis como “Oldboy”. Isso, juntamente com o seu estilo híper ostentoso, faz da sua filmografia algo difícil de julgar e celebrar, resultando na subvalorização de alguns dos seus sucessos artísticos menos falados.

Chi-Raq”, uma adaptação livre da comédia “Lisistrata” de Aristófanes, é uma das criações mais insólitas do cineasta. Aqui, Lee mescla o já mencionado teatro clássico com mecanismos musicais, cinema propagandista, comédia sexual e a fúria militante de um realizador positivamente doente pela epidemia de violência com armas de fogo que deflagra no seu país.

Este é um cocktail Molotov em forma de filme, um uivo de fúria urbana e indignação social. É também uma maravilha criativa com algumas das imagens mais inventivas e melhores prestações na filmografia recente do realizador. Um sermão desavergonhado e insano que é tão monumentalmente corajoso como imperdível.




HENRY GAMBLE’S BIRTHDAY PARTY (2015) e PRINCESS CYD (2017) de Stephen Cone

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O Jean Renoir do cinema americano contemporâneo.

Stephen Cone é um cineasta de Chicago cujos filmes parecem assinalá-lo como uma espécie de Jean Renoir da América moderna. Um artista profundamente humanista, suas obras são tapeçarias de empatia absoluta, encontrando até capacidade para simpatizar com os costumes de uma comunidade evangélica cristã cujas crenças fazem com que um adolescente viva uma crise identitária devido à sua sexualidade.

Esse filme é “Henry Gamble’s Birthday Party”, que, se continuarmos a nossa comparação com Renoir, se trata de “A Regra do Jogo” de Cone, tanto em termos estéticos como narrativos. Não menos precioso que esse filme de 2015 é “Princess Cyd”, mais uma obra-prima do realizador que desta vez se foca na figura sexualmente ambígua de uma adolescente charmosa e sua tia escritora.

Sem nunca forçar os eventos na vida das suas personagens a assumir a forma dramática de um enredo cinemático, Cone deixa que os seus filmes flutuem numa espécie de fluída amorfia, capturando momentos e impressões humanas de um modo gentil e estranhamente incisivo. Como tal, as suas obras são tão leves e calorosas como uma brisa de verão. Contudo, tais trabalhos também têm o gosto de densidade intelectual de um grande romance social, cuja beleza sensorial só é superada pelas deliciosas prestações dos seus atores que nunca parecem atuar, simplesmente existem em frente aos nossos olhos.




A QUIET PASSION (2016) de Terence Davies

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Cynthia Nixon nunca esteve melhor.

Aquando da sua estreia no Festival de Berlim de 2016, “A Quiet Passion” foi recebido com críticas mistas. Na sua ambiciosa biografia da autora americana Emily Dickinson, Terence Davies havia integrado a obsessão da poetisa oitocentista com a morte às preocupações e estilos típicos da sua filmografia, resultando numa obra difícil. Não é um docudrama biográfico comum, mas sim o ponto de encontro de dois artistas, cuja união produz um dos mais fulminantes retratos do cinema recente.

O retrato é, pois claro, o de Emily Dickinson, a mulher, a artista, a mente e a lenda. Ela é aqui uma mulher inteligente, com uma língua afiada e um sentido de humor apurado que por vezes resvala para o território da crueldade. É um génio e uma pensadora proto-feminista frustrada com o mundo que a rodeia e incapaz de articular tudo aquilo que a apoquenta, pois o vocabulário para explicar particulares injustiças sociais ainda não existia. Ela é uma figura triunfal e uma mártir autocriada que vive em constante sofrimento. Ela é, em resumo, uma figura que tanto fascina como lacera.

Davies, seu texto e lirismo visual, muito fazem para complicar e clarificar a nossa perceção de Dickinson, mas é a fabulosa Cynthia Nixon que realmente faz o filme, dando vida à poetisa com tanto ardor como densidade psicológica. Tanto para Davies como para Nixon, este é o melhor trabalho que fazem há décadas e algo que merecia ter sido apreciado nos cinemas pelas audiências portuguesas.




NOCTURAMA (2016) de Bertrand Bonello

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Nem o Festival de Cannes se atreveu a exibir este filme.

Com uma narrativa protagonizada por um grupo de terroristas que executam um ataque bombista em Paris, “Nocturama” é uma obra de entendível controvérsia no clima político atual. De facto, tão polémica é a premissa do filme, que o Festival de Cannes se recusou a inclui-lo entre a sua seleção oficial em 2016, quando França ainda vivia o rescaldo dos ataques de novembro de 2015 em Paris.

Nem mesmo os críticos pareceram capazes de engolir o retrato de terroristas adolescentes que o filme propõe, declarando a obra de Bonello como um crime de amoralidade artística. Tais reações são particularmente interessantes, quando consideramos o modo como o realizador intencionalmente distancia as suas personagens da nossa realidade, efetivamente despindo os seus atos de inteligíveis ambições ideológicas e sintetizando o seu crime e existência a um estudo de alienação.

Através de inspirada montagem, cenários espantosos, mecanismos do cinema thriller e de terror, assim como um elenco capaz de construir caracterizações tão específicas quão misteriosas, Bertrand Bonello torna “Nocturama” num filme que é politicamente urgente por meio de uma recusa em dialogar com a nossa específica realidade. Esta é uma tempestade de juventude sem rumo, de dessatisfação generalizada, de violência epidémica e de irracional crueldade, tanto a nível do indivíduo como do coletivo. É um filme assustador que todos deviam confrontar, um pesadelo que todos devíamos vislumbrar.




QUEEN OF KATWE (2016) de Mira Nair

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Uma história inspiradora para toda a família.

Normalmente, quando um ator alcança a glória do Óscar, segue-se um período na sua carreira em que portas outrora fechadas se abrem e seus horizontes profissionais se expandem. Isso não aconteceu a Lupita Nyong’o, que, após ter ganho o Prémio da Academia por “12 Anos Escravo”, parecia só conseguir encontrar papeis a dar a voz a criações digitais. Nos palcos da Broadway ela ainda conseguiu encontrar alguma aclamação, mas foi somente três anos depois da sua vitória que esta atriz teve direito a um papel do grande ecrã merecedor dos seus talentos.

Esse papel encontra-se em “Queen of Katwe”, o raro filme mainstream americano passado em África e cuja história, longe de ser uma crónica de guerra e miséria, constitui um conto inspirador de triunfo juvenil. Trata-se de um relato de como a jovem ugandesa Phiona Mutesi se tornou, aos 14 anos, numa campeã de xadrez de renome internacional.

Nyong’o dá vida à mãe de Mutesi e insufla o filme com o calor do afeto maternal, ao mesmo tempo que telegrafa as dificuldades de uma viúva empobrecida a criar os filhos sozinha. O resto do elenco é tão exemplar como a atriz Oscarizada, mas é a realização elegante de Mira Nair e toda a conceção visual do filme que realmente elevam o filme acima de muitos outros projetos semelhantes. Infelizmente, esta modesta joia de cinema familiar da Disney nunca chegou aos cinemas portugueses.




GOD’S OWN COUNTRY (2017) de Francis Lee

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O romance floresce nas paisagens de Yorkshire.

God’s Own Country” é um filme muitas vezes apelidado, de modo injusto e redutor, como o “Brokeback Mountain” da Inglaterra do Brexit. De facto, este é um filme sobre dois criadores de gado homossexuais que começam a sua relação quando estão a cuidar de ovelhas, e é verdade que Francis Lee até faz alguns piscares de olho ao filme de Ang Lee. Contudo, se o romance americano é uma história de repressão destrutiva, o projeto britânico representa uma celebração de como o afeto pode ser a chave para quebrar a cela de repressões comunitárias e pessoais, abrindo caminho para algo semelhante à salvação.

Este é um filme em que o afetuoso toque de dedos para com um punho cerrado numa mesa de hospital representa um gesto de cataclísmico poder, onde colocar umas esquálidas flores no centro da mesa de jantar é algo capaz de mudar o modo como alguém encara o mundo. É também uma obra de inclassificável beleza e sensualidade, tão pronto a encontrar espetacularidade estética nas paisagens de Yorkshire como nos corpos despidos e cobertos de lama dos seus atores principais.

E que atores! E que química romântica que eles têm! Josh O’Connor e Alec Secareanu praticamente incendeiam o ecrã com o calor contido nos seus olhares e toques passageiros e a complexidade humana que trazem aos papéis é igualmente intensa, mesmo fora do contexto amoroso. É, portanto, uma pena que, para além de passar pelo Queer Lisboa, este seja um triunfo cinematográfico que a maioria das audiências portuguesas não tiveram o privilégio de ver.




BEATRIZ AT DINNER (2017) de Miguel Arteta

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Um dos primeiros grandes filmes da era Trump.

Beatriz at Dinner” foi desenvolvido e filmado antes das eleições americanas de 2016. No entanto, é muito difícil não encarar este filme como uma destilação da fúria dos seus criadores para com a eleição de Donald Trump. Afinal, esta é a história de uma imigrante mexicana nos EUA que passa uma noite num jantar dado por uma das suas clientes ricas, cujos convidados incluem um magnata ganancioso e amoral que não se importa com a destruição do meio ambiente se isso lhe permitir aumentar a fortuna.

Como um drama de câmara onde personalidades contrastantes são colocadas num espaço limitado até que a fricção por si criada explode em epítetos de drama, “Beatriz at Dinner” é um grande triunfo. Pequenos detalhes de design e mise-en-scène são particularmente eficazes na criação de uma aura de sobriedade dramática, tão capaz de mitigar os excessos textuais da premissa como de salientar os conceitos mais politicamente urgentes da obra.

No entanto, é como um grito de protesto sublimado através da colisão entre duas figuras simbólicas que este filme realmente brilha. Os atores, pela sua parte são sublimes na sua caracterização, meio humana, meio panfletária, especialmente Salma Hayek no papel titular. A indignação de Beatriz e sua retitude moral não fazem dela uma heroína charmosa, mas sim uma criatura complicada e abrasiva, assustadoramente insuflada pelo fogo destrutivo de uma defensora do planeta face a um dos maiores responsáveis do presente apocalipse ecológico.




O ESTRANHO QUE NÓS AMAMOS (2017) de Sofia Coppola

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A guerra dos sexos numa casa de espectros sulistas.

É difícil entender como é que este filme não foi distribuído comercialmente em Portugal, tendo somente tido direito à passagem pelo circuito dos festivais e subsequente lançamento em DVD e Blu-Ray. Afinal, trata-se de uma obra de prestígio, premiada em Cannes, realizada por Sofia Coppola, com um elenco de luxo cheio de nomes sonantes e até algumas controvérsias críticas a apimentarem o objeto final. Enfim, essa falta de distribuição em nada retira qualidade ao projeto, sendo “O Estranho Que Nós Amamos” uma das obras mais interessantes da sua realizadora.

Adaptado do mesmo romance que já havia originado um clássico de Don Siegel, este é um drama psicossexual passado numa escola para raparigas no Sul dos EUA durante o auge da Guerra da Secessão. Quando um soldado ferido da União aparece em necessidade de auxílio, a paz entre a comunidade feminina é quebrada, sendo que desejos ainda por descobrir ou há muito reprimidos são libertos e a insanidade latente a algumas personagens mostra a cara com consequências sanguinárias.

Mais do que tudo, este é um retrato impressionista de uma ostentação sulista há muito mitificada pela literatura e cinema americano, mas que é aqui representada com tanta beleza como podridão espectral. A polémica ausência da única personagem preta do livro foi uma decisão arriscada, mas Coppola justifica-a amplamente, traçando subtis linhas de consequência entre a ausência de mão escrava e o degredo em que as protagonistas vivem, inebriadas em sonhos de um passado cuja fartura foi adquirida à custa do sofrimento de tantos outros.




GIRLS TRIP (2017) de Malcolm D. Lee

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Tiffany Haddish devia ter sido nomeada para o Óscar.

Em muitos sentidos, “Girls Trip” é uma comédia perfeitamente banal. Contudo, o projeto brilha no que diz respeito às personagens que representa e, mais importante ainda, ao espetacular elenco que reúne em frente às câmaras.

A interpretarem um quarteto de amigas, onde se inclui uma celebridade televisiva à la Oprah e a editora de um site de mexericos de Hollywood, temos Regina King, Queen Latifah, Jada Pinkett Smith e Tiffany Haddish. Todas elas são exemplares, mas, como se pode ver pela adoração crítica e várias nomeações para prémios prestigiados, é Haddish quem rouba o holofote e domina o filme. Com um estilo de comédia tão indecoroso como anárquico, ela parece um cartoon a passar como um furacão por esta história, mas também sabe pausar em momentos chave e revelar-nos a humanidade da sua personagem.

Esse é, na verdade, um dos grandes trunfos do filme, que engloba essa mesma qualidade de Haddish na sua tonalidade emocional e assim consegue ser tão divertido como inesperadamente genuíno e sóbrio. Note-se, por exemplo, como “Girls Trip” consegue conter em si uma cena em que duas mulheres penduradas por cabos urinam sobre uma multidão na rua e outro momento em que as quatro amigas rezam antes de irem para a cama, revelando as suas preocupações espirituais e os laços afetuosos que as unem.




ROMAN J. ISRAEL ESQ. (2017) de Dan Gilroy

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Um dos melhores desempenhos de Denzel Washington.

Para grandes seguidores da Awards Season a viver em Portugal, os Óscares cuja cerimónia decorreu este ano tiveram um particular objeto de frustração sob a forma de “Roman J. Israel Esq.”. É que, não obstante a sua nomeação para o Óscar de Melhor Ator em honra da inspirada prestação de Denzel Washington, esta obra de Dan Gilroy não recebeu qualquer tipo de distribuição comercial nos cinemas portugueses.

Agora é possível apanhar-se o filme a passar na televisão, mas a sua ausência do grande ecrã continua a ser irritante. Afinal, este é um dos mais interessantes dramas de advogados dos últimos anos, construindo um retrato complexo, por vezes convoluto e problemático, da conflagração entre ambições profissionais e ideologia ativista. Certamente a personagem titular representa uma das personagens mais complicadas na filmografia recente de um dos grandes atores da Hollywood dos nossos dias, o já mencionado Washington.

Para além de tudo isso, o filme tem ainda uma série de notas de graça que merecem ser celebradas. Desde a prestação subtil e insuflada de compaixão de Carmen Ejogo à gradação de dinâmicas sociais e económicas nos figurinos, este é um trabalho de cinema comercial cheio de ambições valerosas e o tipo de eficiente execução interpretativa, formal e textual que normalmente recebe justificada apreciação crítica e popular.




A WRINKLE IN TIME (2018) de Ava DuVernay

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Será que há livros impossíveis de adaptar ao cinema?

Com “A Wrinkle in Time”, Ava DuVernay tornou-se na primeira mulher não caucasiana a ter nas mãos um projeto multimilionário de um dos grandes estúdios de Hollywood. Depois de ter feito nome em obras realistas carregadas de indignação sociopolítica, esta fantasia juvenil recheada de vistosos efeitos visuais representou uma cataclísmica mudança de registo na filmografia da cineasta. Para a maioria dos críticos e espectadores, os resultados de tal salto estilístico não foram particularmente positivos.

De facto, “A Wrinkle in Time” prova ser daquelas obras literárias verdadeiramente inadaptáveis ao grande ecrã, sendo que muitas das ideias concebidas por Madeleine L’Engle no seu livro são tão especificamente literárias e concetualmente abstratas, que a sua visualização em cinema é impossível. Pela sua parte, DuVernay tenta domar a densidade textual do projeto e consegue conjurar algumas imagens espantosas, por entre tantas outras que simplesmente não funcionam.

Os píncaros deste filme são extraordinários, tanto que são capazes de ocasionalmente ofuscar os seus maiores problemas, como é o caso das prestações terríveis do elenco infantil. No entanto, a qualidade errática do projeto em nada diminui a sua ambição ou sua obstinada sinceridade e sentimentalismo. Oxalá todos os blockbusters de Hollywood fossem tão corajosos como este, onde uma cineasta especializada em cinema político tenta desvendar como é que uma escadaria feita de matemática pode ser apresentada visualmente, entre muitas outras propostas insólitas.

Já agora, como é que um blockbuster da Disney não tem direito a distribuição em Portugal?

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One thought on “Grandes filmes que nunca chegaram aos cinemas portugueses

  • O Christopher Robin, aquele com o Pooh também não vai estrear cá. O que se passa com a Disney?

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