A Autópsia de Jane Doe, em análise

A Autópsia de Jane Doe cria uma experiência de terror tremendamente divertida onde a morte não é nada do que esperávamos.

Depois do tremendo sucesso crítico do mockumentário O Caçador de Trolls, o norueguês André Øvredal vira-se pela primeira vez para a língua inglesa para edificar um novo e curioso filme de terror ambientado ao setting de uma morgue familiar.

Afinal, ara Tommy e Austin, dois médicos legistas que são também pai e filho, esta é uma noite igual a tantas outras passadas na morgue, pelo menos até chegar um estranho cadáver sem identificação. Descoberta na cave de uma família que foi brutalmente assassinada, a jovem Jane Doe está assustadoramente bem preservada e envolta num enigmático mistério. À medida que trabalham noite fora para descobrir a causa de morte, os dois homens vão desenterrando os perturbadores segredos da sua vida e rapidamente, uma série de horrendos acontecimentos vão tornando algo cada vez mais claro que há algo de terrivelmente errado com Jane Doe.

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A A Autópsia de Jane Doe é um filme de terror curioso em diversas formas que não apenas uma.

Aqui o corpo humano não é apresentado como um milagre, mas antes como um puzzle a ser resolvido – o cadáver como enigma – colocando na linha da frente do enredo as personagens que usualmente não contam com mais de uma cena nos filmes do género para nunca mais serem vistas de novo: os médicos-legistas.

Além da abordagem diferenciadora destes dois dispositivos narrativos, vale a pena ressalvar que o filme de André Øvredal é particularmente delicioso no desenrolar do primeiro e segundo atos: uma experiência genuinamente arrepiante, alavancando-se numa criação de uma atmosfera muito específica e poderosa, num sinistro ensaio claustrofóbico que desenrola os seus enigmas de forma elegante e pausada.

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Esta abordagem tensa e paciente de desbravamento de quebra-cabeças é particularmente rara no habitualmente frenético género de terror, que procura o susto e a adrenalina a qualquer custo e com a maior celeridade possível. Ao contrário, o filme de Øvredal desenrola-se, em grande parte da sua duração, como uma sossegada porém perturbante experiência de terror, trabalhando de forma excecional as ansiedades humanas mais primitivas.

De facto, há uma simplicidade latente nos fundamentos de A Autópsia de Jane Doe que só pode ser venerada: o argumento de Ian B. Goldberg and Richard Naing disseca o género de terror e vai construindo um quebra-cabeças, peça a peça, sem recear tomar o seu tempo observando cada pequena mudança à minúcia do microscópio.

Infelizmente, acaba por ser o terceiro ato que condiciona A Autópsia de Jane Doe a uma categorização fácil e standardizada, embarcando numa sucessão de dispositivos de terror manifestamente familiares. A revelação e consequente explicação – que se enquadra no cânone das verdadeiros terrores norte-americanos – é largamente satisfatória, demonstrando um interesse redobrado de Øvredal pelos mitos, lendas e episódios bíblicos, mas a necessidade que tem de as anexar aos convencionais sustos contemporâneos é uma desilusão de efeitos moderados.

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Hirsch e Cox oferecem duas interpretações notáveis – especialmente se considerarmos a fasquia geralmente pouco elevada da maioria dos filmes do género – incutindo uma gravidade, ansiedade e timing cómico nos personagens que muito ajudam a construir e explanar a natureza da sua relação familiar.

Mesmo que fique longe da originalidade ou inovação de O Caçador de Trolls, a verdade é que a ideia de um grupo de cineastas fazer algo ligeiramente diferente com um género já tão convecionado nos seus clichés é verdadeiramente memorável, e A Autópsia de Jane Doe acaba por criar uma experiência de terror tremendamente divertida onde a morte não é nada do que esperávamos.

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O MELHOR: A construção minuciosa e paciente da tensão durante o primeiro e segundo atos.

O PIOR: A conclusão que perde força pelo recurso a sustos e dispositivos corriqueiros do género.



Título Original: 
The Autopsy of Jane Doe
Realizador:
André Øvredal
Elenco:
Emile Hirsch, Brian Cox, Ophelia Lovibond
NOS | Drama, Biografia | 2016 | 86 min

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