Bohemian Rhapsody Figura de Estilo

As modas extravagantes de Bohemian Rhapsody

Um dos melhores elementos de “Bohemian Rhapsody” é o extravagante guarda-roupa que traz para o grande ecrã os estilos icónicos de Freddie Mercury.

Foi Freddie Mercury quem disse que os célebres espetáculos dos Queen não eram concertos, mas sim desfiles de moda. Escusado será dizer que o cantor foi um dos grandes ídolos de moda do século XX, sendo o seu estilo é uma parte tão integral da sua lenda como a voz que agraciou intemporais clássicos como “Love of My Life” e “We Are the Champions”. Como tal, era essencial para “Bohemian Rhapsody”, o primeiro filme biográfico sobre Mercury, que o seu guarda-roupa fosse tão ou mais preciso que as prestações dos atores ou mesmo o guião.

De facto, em contraste com o argumento que está cheio de manipulações cronológicas e grandes omissões na história dos Queen e de Freddie Mercury, os figurinos de “Bohemian Rhapsody” são um requintado esforço de recriação histórica ao mais alto nível. O figurinista Julian Day teve de investir num esforço quase arqueológico, procurando roupas vintage da época ou construindo elaboradas recriações que tentam copiar as peças originais até ao mais ínfimo detalhe. No que diz respeito aos outros membros da banda. Day chegou mesmo a usar roupas das figuras reais, como é o caso de alguns dos figurinos de Brian May.

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Brian May forneceu algumas das suas antigas indumentárias ao guarda-roupa do filme,

Como é sabido, os membros vivos dos Queen estiveram muito envolvidos com a produção do filme, tendo levado mesmo a Sacha Baron Coen abandonar o projeto devido aos seus conflitos criativos com os músicos. Esse envolvimento no panorama do guarda-roupa não se resumiu a May emprestar as suas roupas ao figurinista, sendo que Day lhes pediu auxílio na recriação dos muitos concertos da banda. Só depois de ter o selo de aprovação dos Queen é que os figurinos estariam suficientemente bons para aparecerem diante das câmaras.

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Comparação entre o desenho do figurinista, Rami malek no filme e Freddie Mercury em concerto.

Em certos casos, Day chegou mesmo a encomendar recriações exatas das peças vestidas por Freddie Mercury aos designers que criaram o seu guarda-roupa original. Para uma montagem em que aparecem imagens recriadas da Tour Sheer Heart Attack no Japão, o figurinista teve o auxílio de Zandra Rhodes, uma designer britânica que colaborou muito com Freddie Mercury e que, em 1974, ofereceu ao cantor a parte de cima de um vestido de noiva que tinha capturado a atenção dele. Essa blusa improvisada feita de metros de tecido plissado foi refeita para o filme, onde Rami Malek rodopia pelos palcos como um anjo do rock’n’roll de asas estendidas.

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O estilo de Mercury em palco era tão irreverente como icónico.

A recriação dos concertos não foi sempre tão fácil, contudo. Para os fatos-macaco híper espampanantes que Mercury envergou várias vezes nos anos 70, o ajuste ao corpo de Rami Malek era chave, resultando em dezenas de provas. O fato de arlequim, feito de losangos de tecido preto-e-branco, chegou mesmo a exigir mais de 30 sessões de provas com o ator até estar perfeito. Apesar disso, nem foi esse o figurino mais difícil de recriar. Essa honra recai sobre o conjunto de calças de ganga e camisa interior que Mercury famosamente envergou no concerto Live Aid, cuja glória tanto abre como encerra a narrativa de “Bohemian Rhapsody”.

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O figurino para o concerto Live Aid foi o que mais dores de cabeça deu ao figurinista do filme.

O cinto e a fita de cabedal que Mercury usou no braço foram comprados à mesma loja que vendeu os originais ao cantor. A Wrangler Jeans fez as calças de ganga baseadas no modelo descontinuado que Freddie Mercury tinha usado em palco, mas o top branco não foi assim tão fácil. Pelo fim, Day tinha já criado mais de 20 protótipos até acabar com uma versão que tem um pouco de nylon para ser mais flexível que as roupas verdadeiras do cantor e um decote mais acentuado a pedido de Rami Malek.

Bohemian Rhapsody Figura de Estilo
Alguns dos figurinos mais interessantes são os conjuntos mais casuais.

Como é evidente, nem todo o filme se passa em concertos ou na praça pública e o grande desafio estilístico de “Bohemian Rhapsody” foi precisamente a criação de Freddie Mercury e companhia na sua vida privada. Há que entender que o estilo pessoal do vocalista dos Queen era tão revolucionário como constantemente mutável. Ele era um dos pioneiros da androgenia, usando maquilhagem e trajes femininos dos anos 30 antes de adotar um estilo mais rock’n’roll e teatral e, depois disso, uma estética hipermasculina originada na subcultura gay da época.

De modo a traçar esta evolução, Day compôs paletas cromáticas específicas para representar cada ano que aparece em cena e tentou ir buscar as roupas às mesmas lojas frequentadas pelas figuras históricas. No caso de Freddie no início do filme e sua amada Mary Austin, o figurinista encontrou muito do guarda-roupa pesquisando pelos arquivos históricos da Biba, a loja londrina onde ambos trabalharam na década de 70. Foi aí que Day encontrou o blazer de veludo bordeaux com que Rami Malek se pavoneia num provador quando está a tentar seduzir Lucy Boynton, por exemplo. Essa peça era uma antiguidade dos anos 30.

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Este blazer de veludo é uma das muitas peças vintage no guarda-roupa do filme.

Na sua procura por peças vintage para construir o guarda-roupa de Rami Malek, Day chegou a encontrar um fato-de-treino que poderá mesmo ter pertencido a Freddie Mercury. Noutra cena, onde a banda conhece os seus managers pela primeira vez, Malek veste um casaco de cabedal com uma gola armada semelhante aos pescoços exuberantes de certas espécies de lagartos. Tal casaco pertenceu a Jimi Hendrix, um dos músicos que o próprio Mercury admirava e que poderá ter sido uma fonte de inspiração para a sua persona em palco.

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Se fosse mais musculado, Rami Malek poderia ser uma versão viva das ilustrações de Tom of Finland.

Chegadas as cenas na década de 80, Day virou-se para as ilustrações pornográficas de Tom of Finland e para as indumentárias BDSM de uma certa parte da subcultura gay da época. O filme “Cruising” com Al Pacino e as fotografias de Robert Mapplethorpe foram referências essenciais para o figurinista que, a certa altura, teve de vestir cerca de uma centena de figurantes para uma cena passada num clube gay que acabou por ser quase completamente cortada do filme. Ainda bem que, segundo Day, vestir figurantes é a sua parte favorita do trabalho, pois para a cena do Live Aid foi preciso vestir ainda mais gente, com cerca de 600 pessoas a requererem roupas apropriadas à época.

O próximo projeto de Julian Day é “Rocket Man”, onde o figurinista voltará a vestir uma estrela do rock britânico dos anos 70 e 80. Desta vez será Elton John. Com sorte a sua atenção ao detalhe e ao verismo histórico continuará a marcar presença nessa produção. Entretanto, já há quem fale da possibilidade de este figurinista alcançar a sua primeira nomeação para o Óscar este ano com “Bohemian Rhapsody”. Apesar das críticas ao filme não serem muito favoráveis de forma geral, o trabalho de Day tem sido amplamente elogiado e, como bem sabemos, boas críticas em nada servem de indicativo para quem ganha Óscares.

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Cheira a Óscar?

Gostarias de ver Julian Day a receber um prémio no palco do Dolby Theatre para o ano que vem? Ou preferias que o Óscar caísse nas mãos de outro figurinista? Deixa a tua resposta nos comentários.

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