Questões de Género e Identidade em debate no Espaço Nimas

Entre 15 de fevereiro e 19 de junho, o Espaço Nimas vai acolher um ciclo de cinema focado em questões e debates sobre Género e Identidade.

 

tudo sobre a minha mae ciclo de cinema genero e identidade
TUDO SOBRE A MINHA MÃE (1999) de Pedro Almodóvar

 

Na conjetura atual, olhamos para o mundo em que vivemos e cada vez mais nos apercebemos do crescente poder e influência de pensamentos antiprogressistas na nossa sociedade global, tanto dentro como fora da esfera política. Parte desse catastrófico movimento reacionário tem-se focado em algo que, nos últimos tempos tem recebido o nome, por vezes usado de modo derrogatório, de “políticas de identidade”. Tais políticas englobam uma miríade de questões identitárias, mas uma parte central do seu enfoque recai sobre temas de género e sexualidade, e, como se poderia esperar, tal enfoque vai marcar a sua presença, incluindo o cinema que, não obstante a opinião de muitas pessoas, é muito mais que mero entretenimento esvaziado de significados mais profundos.

Lê Também: Moonlight, em análise

Na verdade, desde o seu nascimento, que o cinema se tem vindo a afirmar como uma ferramenta importante na representação e subsequente subversão de códigos sociais, incluindo aqueles associados e género e sexualidade. Veja-se, por exemplo, as filmagens experimentais do século XIX que nos mostram dois homens a dançar juntos, sua aparência claramente masculina numa pose codificada de interação de sexos opostos. Mesmo que acidentalmente, isto representa uma contradição de códigos vigentes de heteronormatividade e limitadas noções de masculinidade. Não se tratava de nenhum manifesto radicalizado ou panfletário, mas estas filmagens indicam uma possibilidade transgressiva inerente ao cinema desde a sua génese, uma apresentação de imagens que questionam aquilo que foi socialmente calcificado como o “normal”.

 

 

Com o desenvolver e crescente interesse económico latente à atividade cinematográfica, a sétima arte veio a converter-se numa indústria e como tal, preocupações populistas passaram a tomar conta de muito do cinema mais conhecido e publicitado. Apesar disso, mesmo em Hollywood, cineastas propunham-se a representar ideias transgressivas de sexualidade e género, rompendo com tabus sociais, especialmente no que dizia respeito à sexualidade feminina. É claro que depois veio o código moralista, o “Hayes Code”, que veio censurar a indústria, mas, como a história tem testemunhado uma e outra vez, na opressão nasce algum do material mais subversivo imaginável e, de modo subtil, a transgressão continua a marcar presença.

 

wanda ciclo de cinema genero e identidade
WANDA (1970) de Barbara Loden

 

Fora de Hollywood, o mesmo acontecia de modo muito mais intenso, com as ideias de hierarquia social, poder patriarcal, preconceito, repressão sexual e pensamento normativo a serem abertamente questionados. Mesmo assim, a representação de certos tipos de pessoas continuou a ser raro e o mesmo perdura até aos dias de hoje, onde filmes explicitamente preocupados com tais temas são relegados a um estatuto de “nicho”. Esta falta de representação é em si uma crueldade que afeta inúmeras pessoas que crescem numa cultura de massas onde a sua identidade pessoal é como que obliterada ou renegada ao estatuto de “outro”, de “estranho” de “alien”.

 

o diabo e uma mulher ciclo de cinema genero e identidade marlene dietrich
O DIABO É UMA MULHER (1935) de Josef von Sternberg

 

Com todo este contexto histórico e cultural em mente, chamamos a atenção para um novo ciclo de cinema que vai ser feito entre 15 de fevereiro e 19 de junho no Espaço Nimas sobre os temas de Género e Sexualidade. Ao todo serão exibidos 12 filmes acompanhados por debates com investigadores e críticos de Cinema, especialistas em Estudos de Género, escritores, artistas e muitos outros. Cada bilhete para este ciclo, organizado pela Leopardo Filmes e pelo Instituto de História de Arte da FCSH/Nova custará quatro euros.

 

minha me isabelle huppert ciclo de cinema genero e identidade
MINHA MÃE (2004) de Christophe Honoré

 

A primeira parte do ciclo, (Re)definições do feminino, vai incluir A Academia das Musas de José Luis Guerin, Asas da cineasta soviética Larisa Shepitko e Minha Mãe, um chocante drama erótico protagonizado por Isabelle Huppert e realizado pelo provocateur francês Christophe Honoré. De seguida, teremos um trio de obras focadas em Subjugação e violência. Elas serão o célebre estudo de personagem Wanda de Barbara Loden, O Círculo do transgressivo autor iraniano Jafar Panahi e Martha, uma das obras seminais de Rainer Werner Fassbinder.

 

uma mulher para dois homens design for livingciclo de cinema genero e identidade
UMA MULHER PARA DOIS HOMENS (1933) de Ernst Lubitsch

 

‘Women Power’ é o nome dado à terceira parte do ciclo, onde estarão em evidência obras de autores classicistas do panorama de Hollywood e do Japão. Serão exibidos O Diabo é uma Mulher de Josef von Sternberg, onde o ícone queer Marlene Dietrich dá a prestação que ela mesma caracterizava como sua favorita, Uma Mulher Para Dois onde Ernst Lubitsch se atreve a vender um romance poliamoroso à Hollywood dos anos 30, e Quando Uma Mulher Sobe as Escadas, um dos dramas proto feministas de Mikio Naruse.

Lê Ainda: Uma Nova Amiga, em análise

Finalmente, o ciclo termina com três filmes centrados no tema Queer e Trangénero, que são assinados por três dos mais vanguardistas autores da atualidade. As obras de que falamos são Tudo sobre a minha Mãe que valeu a Pedro Almodóvar o Óscar de Melhor Filme Estrangeiro de 1999, Felizes Juntos, o poema pop sobre a relação amorosa entre dois homens chineses a viver em Buenos Aires, que Wong Kar Wai levou a Cannes em 1997, e finalmente Uma Nova Amiga, onde François Ozon aplica o seu estilo caracteristicamente melodramático a uma trama quase Hitchcockiana protagonizada por uma mulher transgénera que começa a sair do armário após a morte da sua esposa.

 

FELIZES JUNTOS WONG KAR WAI ciclo de cinema genero e identidade
FELIZES JUNTOS (1997) de Wong Kar Wai

 

Para saberes mais informações sobre este imperdível ciclo visita o site da Medeia Filmes. Entretanto, fica a saber que, para o primeiro debate, os convidados serão Clara Rowland e Elisabete Marques, e a moderação será feita por Luís Mendonça, doutor em Ciências da Comunicação pela Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa e um dos curadores deste ciclo.


Também do teu Interesse:


Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *