Festival de Locarno | Il Nido, em análise

Numa localidade montanhosa, os segredos do passado vão ser desenterrados e trazer o caos a uma comunidade fortemente religiosa. Il Nido é um dos filmes disponíveis online no Festival Scope depois da sua passagem por Locarno.

Il Nido festival Locarno Festival Scope

Il Nido, a primeira longa-metragem da realizadora Klaudia Reynicke, pode ter bastantes mais-valias, mas a sua narrativa não é uma delas. Basicamente, este é mais o exemplo de uma história sobre uma pequena comunidade, aparentemente idílica, que tem segredos terríveis escondidos por detrás da sua fachada santa. Quantos filmes já vimos com esta exata premissa? E nem se fala da infinidade de séries de televisão, especialmente europeias. Para além disso, o filme ainda acrescenta mais uns quantos clichés ao ser também mais um daqueles retratos de uma família com segredos terríveis… Sempre a mesma coisa. Não há nada de criativo ou surpreendente nestes argumentos e Il Nido não escapa à regra. O filme ainda quase nem teve tempo de estabelecer a sua intriga e um espetador astuto já adivinhou toda estrutura do filme e, se for particularmente sagaz, também já desvendou todo o pueril mistério.

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Depois de já termos esclarecido como Il Nido seria um medalhado certo nas Olimpíadas da falta de criatividade, tentemos ver o que realmente o filme faz bem. Para uma história tão cansada e esvaziada de surpresa ou astúcia, tudo depende da sua execução e nesse aspeto os cineastas desta coprodução suíço-italiana mostram o seu virtuosismo. Basta vermos o início do filme – depois de uma críptica voz-off emparelhada com pormenores de uma paisagem invernal, Il Nido mergulha logo a sua audiência numa introdução sumária à comunidade em análise e sua identidade coletiva. Faz isto com uma excursão turística onde a nossa protagonista, Cora, conta a um grupo de peregrinos a mitologia religiosa de Bucco, onde há 90 anos, uma criança teve os seus olhos dilacerados por um lobo e foi salva pelo milagre de uma aparição da Virgem Maria.

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Mas, como seria de esperar, esta idílica imagem de santidade vai ser destroçada e esse processo de partir fachadas hipócritas começa com a chegada de um desconhecido à vila. Ele não é um turista religioso, mas sim um dos filhos da comunidade que há muito a abandonou.  Saverio era criança quando o seu irmão morreu, alegadamente atacado por um cão, e está agora de volta ao lugar do seu sofrimento para vender a casa em que cresceu. Toda a comunidade, com a exceção de Cora, parecem estremecer com a sua presença, mostrando-se ou defensivos ou hostis para com ele. Chamam-lhe estrangeiro e mentiroso, enquanto se escondem nas sombras das suas casas e o observam como um animal raivoso através das suas janelas cobertas por cortinas brancas. Ele, por sua vez, parece estar mais confortável na rua, a banhar-se no sol enquanto deixa que a sua presença seja uma acusação para toda a comunidade hipócrita.

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Esse contraste entre os aldeões que ficam na sombra e o intruso que se banha na luz é de particular interesse se considerarmos as escolhas fotográficas de Il Nido. Apesar de seguir uma estética próxima do realismo europeu, este é um filme cheio de cor saturada. O céu é de um azul que fere a vista e o verde das árvores parece radiar luz conferindo a esta localidade o aspeto de um postal turístico que ganhou vida. Essa manipulação da cor estende-se também ao sol que é doirado e nunca branco, parecendo que estamos sempre durante um glorioso crepúsculo, quase que conseguimos ver a luz solar como algo palpável. Em contrapartida, nas cenas noturnas, a escuridão é densa e consome tudo menos alguns detalhes, como as faces humanas que parecem sempre perdidas no meio da penumbra.

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Essa expressividade cromática é um dos melhores elementos de Il Nido, que tem nos atores os seus outros mais marcantes triunfos. Giovanni Franzoni, como o tio de Cora e um homem paralisado por uma culpa esmagadora, é de especial destaque, conseguindo trazer uma complexidade humana a um texto que não é particularmente rico em complicadas psicologias. Na verdade, a única atriz que não eleva o texto é a jovem Ondina Quadri no papel principal. Cora é uma filha da comunidade que é obrigada a reavaliar as suas crenças e certezas tanto em relação à sua comunidade, como à sua família ou à sua própria identidade. Todo o final, que é deliberadamente antidramático, contextualiza o filme como esta viagem de Cora da ignorância abençoada para o conhecimento adulto e doloroso, mas nem o guião nem a prestação da atriz construíram em Cora uma caracterização forte o suficiente para ela carregar nos seus ombros o peso da resolução de Il Nido. Mesmo assim, há que admirar a ambição destes cineastas a tentar injetar alguma novidade nestas narrativas padronizadas.

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O MELHOR: O contraste entre a beleza de postal e a trama humana – o enredo pode ser pobre mas a execução é bem construída e admirável.

O PIOR: O guião, seus clichés, e as caracterizações que são tão superficiais como banais.

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Título Original: Il Nido
Realizador:  Klaudia Reynicke
Elenco: Ondina Quadri , Fabrizio Rongione , Diego Ribon , Sonia Gessner , Giovanni Franzoni 
Festival Scope | Drama, Mistério | 2016 | 80 min

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