Frei LuÍs de Sousa

Março no teatro: Lisboa

Revisitar de clássicos marcam o mês de março nos teatros lisboetas

Fazemos a pesquisa, lemos, vemos e falamos sobre teatro. Tudo para que possamos sair de casa sem nos perdermos no barulho publicitário feito por uma mão cheia de espectáculos (fazendo com que nos esqueçamos de outros), ou simplesmente para sairmos da nossa zona de conforto.

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Estas são as nossas sugestões de entre o que podes ver no mês de março:

MARÇO NO TEATRO | MISE EN ABYME

Mise en abyme

O espetáculo do Cão Solteiro parte de um texto de José Maria Vieira Mendes, utilizado por Vasco Araújo como base para a construção de uma das peças que integraram a sua exposição Morte Del Desiderio, na Galeria Francisco Fino, em Lisboa, 2018. O conceito de mise en abyme começa por ser aplicado com a utilização desse mesmo texto, que aqui serve a dramaturgia do espetáculo, trazendo consigo a memória de outra peça ou filme. Importa aqui também que o texto pertença ao universo das artes plásticas, já que esse é um objeto de análise recorrente do Cão Solteiro em vários contextos. Sobre a sua construção, escreve Vieira Mendes: “Há uma ideia de desejo que assenta numa certeza no futuro. Ou seja, quando persigo o desejo, procuro satisfazer ou cumprir qualquer coisa no futuro (mais próximo ou longínquo). Essa coisa que persigo é estabelecida no presente. Isto implica olhar para o futuro como concretização de um pensamento do presente. É uma ideia de futuro que não está disponível para o imprevisto. O texto que construí, argumento cinematográfico, é uma tentativa de encontrar uma outra ideia de desejo e de relação com o futuro, que torne os sujeitos de desejo mais disponíveis para o inesperado. Isto corresponde a uma libertação do sujeito, bem como a uma vontade (desejo) de viver o futuro que vier como um presente em construção. E a construção ficará sempre incompleta porque entretanto o presente passou.”

Até dia 3 de março estará na Sala Luis Miguel Cintra, no Teatro S. Luiz, a encenação de Vasco Araújo, “Mise en abyme“. Sexta e sábado às 21h e domingo às 17h30. Dia 3 haverá conversa com os artistas após o espectáculo moderada por Pedro Faro. Os bilhetes irão dos 12€ aos 15€, havendo descontos.




MARÇO NO TEATRO | FREI LUÍS DE SOUSA

Frei Luís de Sousa

Sete anos volvidos sobre a Batalha de Alcácer-Quibir, Madalena de Vilhena dá como morto o marido, D. João de Portugal, e desposa o bravo e patriota cavaleiro Manuel de Sousa Coutinho. Deste casamento aparentemente feliz, nasce Maria. Porém, a superstição e os presságios de Madalena ensombram a harmonia familiar. Mais ainda, quando, afinal, João de Portugal está vivo e regressa ao reino, agora sob dominação filipina, como Romeiro.

A encenação de Miguel Loureiro do texto de Almeida Garrett estará no palco principal do Teatro Nacional D. Maria II até 7 de Abril. Quartas e sábados às 19h, quintas e sextas às 21h e domingos às 16h. Os preços dos bilhetes do espectáculo vão de 9€ a 16€.




MARÇO NO TEATRO | UM OUTRO FIM PARA A MENINA JÚLIA

Um outro fim para a menina Júlia
“Júlia sai com um passo firme”. Esta é a didascália que August Strindberg escreve no final de Menina Júlia. Desde a estreia da peça, há 130 anos, em março de 1889, que atores de todo o mundo obedecem à ordem do autor e nos sugerem o suicídio de Júlia como o único desfecho possível desta história. Imaginar outro fim possível para estas personagens obriga-nos a mostrar em cena o que acontece depois da didascália de Strindberg. Obriga-nos a imaginar o futuro que não quis prometer às suas personagens. Em “Um outro fim para a Menina Júlia”, vemos Júlia, João e Cristina, que o mundo já viu tantas vezes, para depois os reencontrarmos 30 anos mais tarde, treinados pela vida a encontrar a felicidade nas pequenas coisas. Neste “antes e depois”, tentamos inventar uma alternativa e imaginar que o passo firme de Júlia pode ser o início da lenta e laboriosa caminhada da vida.

Tiago Rodrigues dá continuidade a um dos clássicos do texto teatral, na sala estúdio do TNDMII, até 24 de março. Quartas e sábados às 19h30, quintas e sextas-feiras às 21h30 e domingo às 16h30. Os bilhetes custarão 11€.



MARÇO NO TEATRO | A CRIADA ZERLINA

A Criada Zerlina
A Criada Zerlina

Não se pode fazer bom teatro sobre alguma coisa. Só se pode fazer bom teatro com algumas belas coisas. Um texto sublime sobre a mais bela e terrível história de amor, uma bela e prodigiosa atriz que transformará em verdade o intenso monólogo da velha criada Zerlina, um magnifico canapé onde o senhor A está no meio de um amontoado de móveis, a estender os seus inquietos pensamentos, a falar pouco e a ouvir muito, numa tarde quente de um domingo de verão, uma sala negra, íntima, uma janela alta com gelosias corridas que apenas deixa passar um pequeno raio de luz para ferir a obscuridade onde a revelação e o triunfo do texto devem acontecer. Tudo isto me oferecem.
A filosofia de um cineasta reside na luz, nas sombras, no enquadramento, na direção dos atores. Mas aqui o enquadramento está já decidido (o teatro acontece sempre em plano geral). Restam-me a luz, as sombras e a comunhão com a maravilhosa Luísa Cruz. O que não é pouco. – João Botelho

O cineasta João Botelho, leva ao palco do CCB o monólogo a partir de Hermann Broch “A criada Zerlina”. Com interpretação a cargo de Luísa Cruz, até 6 de março, terça a sábado às 21h e domingo às 16h. Os bilhetes têm o custo de 14€.




MARÇO NO TEATRO | HAMLET(A)

Fevereiro no teatro: Hamlet(a)
Hamlet(a)

Um elenco inteiramente feminino num Hamlet de Shakespeare, quase 500 anos depois da primeira encenação da peça, quando em pleno período isabelino apenas homens podiam subir a um palco. Poderíamos, citando Camões, concluir que “mudam-se os tempos, mudam-se as vontades”, e ainda bem que assim é. Mais a mais, o legado de Shakespeare ultrapassa géneros e, como bem refere a Comuna, que assume a produção deste Hamlet(a), o “Príncipe” da Dinamarca “não é um homem e também não é uma mulher. Hamlet é uma forma de estar porosa que, pode e deve absorver quem nele entra”. Assim, sete atrizes sobem ao palco para protagonizar aquela que será, talvez, a mais estudada e celebrada tragédia de Shakespeare, e dar corpo a personagens, homens e mulheres, que encarnam como poucas em toda a história da criação humana, a loucura, a traição, a vingança e a procura da verdade.

Na Comuna – Teatro de Pesquisa, Hamlet será revisitado com encenação de Hugo Franco até 10 de março. Quarta a sábado às 21h e domingo às 16h. Os bilhetes terão o preço normal de 10€ ou 5€ (caso se assista ao espectáculo numa quarta ou quinta-feira).




MARÇO NO TEATRO | A SACALINA

A Sacalina

Um homem vive momentos de grande excitação. Voa mais alto que as torres das igrejas e, de repente, a sua vida dá uma volta completa. Curvado, gasto, preso, o homem é provocado… distendem-lhe a paciência já escassa. Uma fatalidade esperada devolve-o às amarras, à casa da anterior partida. O homem responsabiliza a culpa, culpa o autoflagelo mudo interior. Precisa de espaço, de paisagem, de vistas desafogadas para se compreender. A angústia é uma sereia polifónica do fracasso, da culpa, do egoísmo, da inutilidade, de ser ou fazer-se maior que a vida. O homem é o desassossego, o eco ténue de um dever de sangue abstrato. O homem é uma bala em ricochete entre duas cidades. Num ímpeto, atira tudo para dentro do malão de viagem. Não vai mais curvado, segue viagem, atravessa o deserto, paira sobre as águas. Navega até à ilha do desterro. Sacalina, estância penal russa. O homem renovado, e cheio de força vital, esgota-a de imediato percorrendo, pedindo, perguntando, contando, anotando e descrevendo tudo, e de tudo, todos na ilha. Enterra as palavras, e numa ação lavra a atitude de mudança em prol dos negligenciados. O homem é um asceta, o seu dogma e o seu mosteiro é Sacalina.

Com direcção de Tiago de Faria “A Sacalina” estará no Teatro Meridional de 6 a 17 de março. Quartas a sábados às 21h30 e domingos às 17h30, com bilhetes dos 5€ aos 10€.




MARÇO NO TEATRO | TIO VANYA

Fevereiro no teatro: Tio Vanya
Tio Vanya

Com o subtítulo Cenas da Vida no CampoTio Vanya é, provavelmente, a mais abstrata das peças de Anton Tchékhov. Há um acontecimento que se pode resumir em poucas linhas: a chegada do Professor Serebriakov, acompanhado pela sua jovem mulher Yelena, à quinta de campo da família, que Sonya (filha do professor e da sua primeira mulher, entretanto falecida) e o seu tio Vanya gerem. É este o acontecimento que faz nascer uma sombra de destruição sobre o aparente fresco do campo, na qual Vanya se perderá como a mais injustiçada e iludida das suas vitimas. Nesta peça, personagens excecionais são também homens e mulheres comuns, que dialogam entre si falando quase sempre de si mesmos. As falas mais prosaicas são também diferentes pontos de vista filosóficos sobre o sentido e o absurdo da existência humana. O ócio e a monotonia, o deleite do campo, é também a inaptidão, a não ação, o tempo suspenso, a morte, talvez. “É preciso fazer as coisas”, ouve-se repetidamente. Um eco que não se sabe se chegará à revolução que se adivinha.

A nova produção de Primeiros sintomas, leva ao palco do Centro de Artes de Lisboa “Tio Vanya“. A encenação de Bruno Bravo poderá ser vista até 16 de março, quarta a sábado (excepto dia 16 que será às 17h) às 21h30 e domingo às 17h. Os bilhetes têm o preço único de 8€.




MARÇO NO TEATRO | O NOME QUE TINHA, PERDI-O

O nome que tinha, perdi-o

Em novembro de 2018, estreei em duas partes (primeiro na Latoaria – “o lado solar”, a segunda no Incógnito – “o lado lunar”) Que Pena Ter Ficado Adulto Para Sempre, a primeira de um ciclo de criações que tem por base o universo proposto por Al Berto – cuja obra revelou-se essencial no meu percurso artístico e biográfico, desde os tempos de adolescente aos de jovem adulto. Em março de 2019, regresso ao Incógnito para apresentar a segunda criação desde ciclo: O Nome Que Tinha, Perdi-o. Se na Latoaria apresentei a minha visão sobre o lado solar – relacionado com a Infância e com a ideia de Regresso – voltar ao Incógnito é dar continuidade ao lado lunar – sobre a noite, o amor e a ideia de deserto.

Marco Lima dá continuidade ao seu percurso a partir de Al Berto no Incógnito, com música ao vivo de João Galelo e Miguel Décio. Uma produção de Teatro.fermento, de 8 a 29 de março, às sextas-feiras, pelas 23h30.




MARÇO NO TEATRO | TERROR E MISÉRIA

Terror e miséria

Escrita durante o exílio de Brecht, na Dinamarca, Terror e Miséria no Terceiro Reich é uma profunda reflexão para teatro sobre a ascensão do nazismo na Alemanha. Das 24 cenas “independentes, aparentemente desconexas” do texto original, António Pires encena neste espetáculo 17, sublinhando que “cada uma [delas] reflete uma faceta” do regime de Hitler. Como aponta o encenador, “são cenas de julgamentos, da vida dos trabalhadores socialistas e comunidades judaicas e da vida escolar da juventude hitleriana” que ilustram como o mal permeabilizou toda uma sociedade, encarnando em “gente que facilmente nos venderia um café, nos prestaria um serviço, nos daria aulas e nos seria igual enquanto cidadão comum”.

No Teatro do Bairro, António Pires leva à cena o texto de Brecht, “Terror e miséria“. Quartas a sábados às 21h30 e domingos às 17h. O preço dos bilhetes será de 12€. Uma produção de Ar de Filmes com interpretação a cargo de Adriano Luz, Rita Blanco, João Barbosa, Mário Sousa, Rafael Fonseca, Francisco Vistas, João Maria, Mafalda Rodrigues, Carolina Serrão e Jaime Baeta.

Alguma destas sugestões te fará ir aos teatros durante o mês de março?

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