Mr. Holmes, em análise
UMA PERSPECTIVA ORIGINAL E DRAMÁTICA DE UM REFORMADO SHERLOCK HOLMES. DESTAQUE PARA A PERFORMANCE EXÍMIA DE (SIR) IAN MCKELLEN E PARA O RITMO LEVE E PAUSADO QUE TORNA A NARRATIVA HISTÓRICA FÁCIL DE DIGERIR.
Sherlock Holmes é um dos ativos mais icónicos da indústria do entretenimento. O famoso detetive criado pela mente do escritor Sir Arthur Conan Doyle tem sido enriquecido em cada nova adaptação, seja no sentido louco e brilhante do mundo do cinema (Sherlock Holmes de Robert Downey Jr.) ou sobre a forma de sociopata explorado na televisão (Sherlock de Benedict Cumberbatch). ‘Mr. Holmes’ oferece por isso uma nova visão sobre o homem por detrás da personagem.
Sherlock Holmes (Ian McKellen) é um homem de 93 anos, reformado e que aproveita os seus últimos tempos de vida para tratar das suas colmeias de abelhas. Consequente da idade avançada, o detetive combate problemas de memória para conseguir recontar os fatos do seu último caso, previamente embelezado pelo seu falecido parceiro e escrivã das aventuras Dr. John Watson. Sherlock conta com a ajuda de Roger (Milo Parker), o filho da sua governanta Mrs. Munro (Laura Linney), um jovem rapaz que admira o detetive e que preenche a vaga de parceiro e de catapulta emocional para o desenvolver do trama. O grande mistério desta vez não é apanhar um criminoso, mas sim descobrir onde realmente assenta o legado e a identidade do detetive mais famoso do mundo.
LÊ AINDA: Mr. Holmes | Nos cinemas a 23 de julho
O filme é uma adaptação da obra literária A Slight Trick Of The Mind de Mitch Cullin. O argumento esteve nas mãos de Jeffrey Hatcher (“Casanova”) e apresentou três enredos principais sobre a forma de flashbacks e que ultimam no tempo presente. Os flashbacks surgiram sempre de forma orgânica e bem ancorado pelo argumento, e foram ainda oportunidades para vermos algum do poderio de atuação de Ian McKellen enquanto que a personagem de Sherlock Holmes sofria certas mudanças contextuais. Mais do que uma história sobre o detetive, ‘Mr. Holmes’ é um filme que explora a temática de identidade e que trabalha na ambiguidade do que é “certo e errado”, sem esquecer os acenos aos perigos da solidão.
A leveza anti-cultura do argumento é uma óptima opção para aqueles que se querem afastar de um ano preenchido de blockbusters e do mundo dos comics. ‘Mr. Holmes’ consegue em 104 minutos atingir uma audiência mais matura, explorando ao máximo a performance de Ian McKellen para que no fim, consiga criar um sentimento de tempo bem passado. Para aqueles que procuram o mistério inerente às últimas adaptações de Sherlock Holmes, provavelmente a trama de “descobrimento humano” não lhes é tão apetecível. Mas o belo elenco, a bela caracterização (na sua maioria) e a fotografia/som do filme são razões mais do que suficientes para levar os verdadeiros amantes de cinema às salas para experimentarem Mr. Holmes na sua plenitude.
LÊ AINDA: Os filmes mais vistos em Portugal | Primeiro semestre 2015
As performances para “Mr. Holmes” foram todas satisfatórias, mas o filme quase nunca se desviou do seu protagonista. Roger é uma personagem quase não-existente, na medida em que é algo simplista como uma criança que idolatra Holmes e que serve para a integridade do filme como um meio para atingir um fim. Do mesmo se pode dizer de Mr. Umezaki (Hiroyuki Sanada) e de Ann Kelmot (Hattie Morahan). Mrs. Munro de Laura Linney teve os seus momentos, seja como reflectora de algumas piadas, seja como um dispositivo de avanço emocional – que atingiu o ápice no terceiro acto do filme num belo momento ao lado de McKellen.
O realizador Bill Condor (“Gods and Monsters”) correspondeu às expectativas do que se pedia, interligando de forma eficiente os três enredos da trama e trazendo com isso o melhor que esta história poderia contar. Momentos em que o verdadeiro Sherlock Holmes saboreia a sua identidade fictícia são metáforas para o dilema da verdade e da mentira, e se todos saírem do cinema a pensar que “há desculpa para a mentira” lembrem-se que o objectivo foi esse. O cinematografo Tobias A. Schliessler divide os louros com o realizador na captação das belas imagens da paz e quietude de Sussex, e de um cenário ainda em uso de uma Inglaterra vitoriana. Os figurinos estiveram em destaque, como é já habitual em dramas de período histórico.