Outsiders 2023 | Krisha, em análise
Entre os dias 7 e 12 de março, a FLAD – Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento, organiza a segunda edição do Outsiders – Ciclo de Cinema Independente Americano. Uma vez mais na capital, a FLAD apresenta, no Cinema São Jorge, uma seleção de 10 longas independentes americanas. “Krisha”, de Trey Edward Shults, exibe no dia 11 de março, pelas 19h00.
A segunda edição do “Outsiders” traz, uma vez mais, à capital lisboeta, um conjunto de filmes relevantes ao pensarmos sobre o panorama do cinema independente feito nos Estados Unidos. E o que une as dez obras programadas? Nenhuma delas exibiu, em sala, em território português, e todas elas apresentam trajetos de festival notáveis e que pedem a sua exibição.
Em 2023, o Outsiders pode “gabar-se” de apresentar obras que encaixam em inúmeros géneros, do terror ao western, passando pelo drama ou pelas biografias. Quanto a “Krisha” (2015), editado, escrito, realizado e co-produzido por Trey Edward Shults (que viria também a criar os aclamados “It Comes At Night” e “Waves”), assume-se como um verdadeiro drama familiar independente.
Filmado numa só localização, com não-atores no papel dos protagonistas, na sua esmagadora maioria familiares de Trey Edward Shults, o realizador consegue criar uma narrativa bastante simples mas que, simultaneamente, se faz robusta através de um crescendo emotivo ao longo dos seus meros 80 minutos de duração.
Prova de que a simplicidade não contraria a complexidade, “Krisha” é simples em base narrativa e valor de produção, mas não deixa de envolver quem vê com a sua história universal acerca de expectativas familiares e promessas falhadas. Uma primeira obra para Shults, “Krisha” saiu premiado com o Grande Prémio de Ficção no festival Texano South by Southwest, e viu também a sua protagonista galardoada em Nashville. Além disso, o filme destacou-se nos círculos de críticos de Nova Iorque e LA e ainda foi selecionado em inúmeros festivais, nomeadamente a conceituada Semana da Crítica de Cannes.
“Krisha” localiza a acção num dos mais importantes feriados norte-americanas, o Dia de Acção de Graças. Há 10 anos afastada da sua família, e do seu filho Trey (interpretado pelo próprio realizador), Krisha (Krisha Fairchild) regressa a casa da sua irmã para tentar curar as feridas das suas relações familiares. Todavia, os seus demónios acabam por lançar uma sombra sob as festividades.
Aquela que parece, inicialmente, uma receção calorosa e sem limitações, depressa se mostra mascarada e antes repleta de ressentimentos bem palpáveis. Para lá do calor humano de uma grande família reunida, a fachada de aceitação começa a ruir. O ambiente torna-se progressivamente febril, à medida que o dia avança, e Trey Edward Shults é exímio na ilustração deste sufoco. Ora através dos planos sequência algo claustrofóbicos, ora através dos instantes em que todas as personagens, à exceção de Krisha, congelam.
Tal é o nível de inquietação, que a edição de Trey Edward Shults pede por vezes emprestados elementos do thriller e terror, com uma particular ajuda da banda-sonora, que instala estes códigos e consegue, sem grande esforço, tornar quem vê cúmplice deste receio enraizado, como se Krisha não fosse senão um barril de pólvora prestes a explodir.
Um climax inegável torna a longa-metragem ainda mais hipnotizante, e apesar de curto, o filme parece-nos ainda mais breve, à medida que o caos se instala e assistimos à verdadeira personificação de uma família à beira de um ataque de nervos.
Sim, a longa-metragem de estreia de Shults não é perfeita, uma vez que poderia ter beneficiado de algum contexto adicional que nos permitisse compreender melhor os vícios da nossa protagonista e o seu passado. Preso no aqui e agora, os fantasmas dos quais as personagens falam, e os quais definem a sua forma de agir, nunca se tornam totalmente compreensíveis para o espectador.
Quiçá uns 20 minutos adicionais pudessem enriquecer o desenvolvimento da narrativa, mas mesmo sem eles, o desempenho de Krisha Fairchild e companhia são mais do que empolgantes, capazes de nos prender ao ecrã e suscitar verdadeiro assombro e preocupação.
“Krisha” exibe, no âmbito do “Outsiders”, no Cinema São Jorge, no dia 11 de março pelas 19h00.
KRISHA | TRAILER OFICIAL (A24)
Krisha, em análise
Movie title: Krisha
Movie description: O acolhimento reservado pela família a Krisha, que reaparece para o jantar de Ação de Graças, após dez anos de ausência, é simultaneamente caloroso e inquieto. À medida que o dia avança, por entre a atividade febril de preparação do habitual peru e os jogos de lazer que ocupam os mais jovens, os demónios do passado ameaçam arruinar as festividades.
Date published: 11 de March de 2023
Country: EUA
Duration: 83'
Author: Trey Edward Shults
Director(s): Trey Edward Shults
Actor(s): Krisha Fairchild, Alex Dobrenko, Robyn Fairchild
Genre: Drama
-
Maggie Silva - 80
CONCLUSÃO
“Krisha” é uma estreia segura, com mestria abundante, capaz de reforçar uma história simples com uma edição e banda-sonora inquietantes.
Pros
- As prestações centrais dos não-atores;
- A estreia de um novo realizador e voz;
- A interpretação de Krisha no papel titular;
- A banda-sonora e edição exímias;
- Uma descida perfeita rumo ao caos.
Cons
- O realizador edita, escreve, produz e realiza com mestria, mas como co-protagonista, o filho Trey, falta-lhe alguma emotividade;
- A história de Krisha merecia mais contexto.