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15ª Festa do Cinema Italiano | Promises, em análise

“Promises”, a longa-metragem de Amanda Sthers, é um dos filmes em cartaz na 15ª edição da Festa do Cinema Italiano.

Adaptado a partir de um romance homónimo da autoria da própria realizadora, Amanda Sthers, “Promises” é uma espiral em que o tempo é manipulado, dando a conhecer ao espectador a narrativa numa dança constante entre o passado, o presente e o futuro. Neste exercício temporal, o público é confrontado com a inocência e as descobertas da adolescência, mas também com as desilusões das escolhas feitas na idade adulta e a falta de perspetiva e remorso característico da velhice. A longa-metragem inicia-se in media res, apresentando ao público a dupla que formaria o par perfeito, não fossem as vicissitudes da vida o principal entrave deste amor.

Mas recuando ao início do enredo, Alexander (Pierfrancesco Favino) é um jovem rapaz que está habituado a passar os meses de verão em Itália, juntamente com o avô (Jean Reno), a figura mais importante na vida deste adolescente. Porém, a felicidade e inocência tão características dos mais novos estão prestes a chegar ao fim para Alexander. Quando a família decide partilhar um momento, participando numa corrida em que ele e a mãe dariam um sprint, enquanto as figuras masculinas nadariam até ao ponto de encontro, o mar acaba por devolver o corpo do pai já sem vida. Fica aqui marcado o primeiro luto da vida do rapaz. Numa cena tão impactante e inesperada como esta, o espectador é desafiado a relembrar em que momento a sua própria inocência terá chegado ao fim.

Promises
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Num segundo momento, o tema do luto cruza-se com a principal temática do filme, o amor. A partir deste ato, a perda surge nas mais variadas formas, enaltecendo as mais diversas maneiras de amar alguém. Aqui, uma vez mais, a espiral do tempo surge de modo descontínuo, mostrando ao espectador que o ser-humano ama de maneira diferente nos vários estádios da vida. Ainda na adolescência surge o primeiro grande amor de Alexander e com ele a descoberta do primeiro beijo. Naquela fase, o sentimento vem em forma de amor proibído e limitado pela distância espacial que separa os dois amantes. Alexander vive em Inglaterra, enquanto a jovem por quem se apaixonou, uma amiga de infância, habita em Itália. Entre os dois países, os quilómetros são encurtados pelas cartas e por chamadas fugazes que mantém viva a esperança do reencontro. Porém, no momento em que o público é convidado a viajar pela lembrança do que é amar alguém pela primeira vez, um dos telefonemas que chega a Londres põe fim à ilusão, pois a jovem cedera à pressão e pusera fim à própria vida. Uma vez mais, Alexander é confrontado com o luto, desta vez perdera para sempre a pessoa que o ensinara a amar.

Mas a vida continua, e Alexander chega à idade adulta recuperando a vontade de amar. Nesta etapa, vemos um indivíduo que atingiu os pressupostos do homem-feito. O jovem sofredor de amor, deu lugar a uma pessoa casada e com uma filha, num momento em que o comodismo surge como principal premissa. Neste estádio, o amor é uma rotina que existe porque é a norma e porque é estável. Ademais, as próprias relações sexuais existem apenas para satisfazer e não pela paixão. Mas o filme de Sthers ensina-nos, de novo, o quão fácil é perder quem mais amamos. Desta vez o luto não surge em forma de morte, mas sim sob o manto do divórcio. Alexander, que tanto pensou em abandonar a relação, viu os laços serem cortados pela própria mulher de forma inesperada. Com isto, “Promises” esbofeteia o espectador relembrando-o que nada dura para sempre e que as normas da sociedade nem sempre ditam o destino.

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A partir deste ponto, a bifurcação surge no momento em que o coração de Alexander volta a palpitar de forma fugosa como se de um primeiro amor se tratasse. E atenção, relembro o leitor que esta sucessão de acontecimentos surge de forma atemporal, sendo que a nova paixão aparece num período em o protagonista é ainda um homem casado, daí a bifurcação. Uma inocente ida à casa-de-banho numa festa de amigos dá o mote para o aparecimento deste novo ardor. Ao conhecer Laura (Kelly Reilly), Alexander conhece uma nova forma de amar, sob o formato de amor platónico. Aqui, o protagonista recua à adolescência, uma vez que o par trava conhecimento num momento algo caricato e bastante inocente, mas basta uma troca de palavras para surgir o chamado “amor à primeira vista”. Agora a proibição não se deve à distância, porque ela é parca, mas sim ao estatuto familiar que acompanha as personagens. Enquanto ele é um homem de família, Laura está prestes a casar-se com outro indivíduo, impossibilitando a concretização desta relação.

Em certa medida, o espectador é agora confrontado com a mais bela história de amor que, na verdade, nunca chegará a existir. E um amor que nunca foi vivido é um amor que jamais poderá morrer. Talvez por isso mesmo, a autora viu-se obrigada a conceder a morte a Laura, já na idade sénior, de modo a materializar a dor da perda de algo que nunca chegou a pertencer a Alexander. E já nesta idade avançada, o protagonista dá-se conta de que a solidão foi sempre a sua maior companheira e, por isso mesmo, obriga-se a tentar experienciar um novo amor, mas este é um meio para fugir ao vazio. Quando Alexander percebe que de nada vale acreditar no amor, é a amizade dos companheiros de infância que se vai afirmar como o verdadeiro amor que para sempre perdura.

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Dito isto, há dois aspectos técnicos fundamentais em “Promises”. Em primeiro lugar, seria muito fácil o público perder-se na espiral do tempo utilizada na longa-metragem. Mas há um ponto fulcral que nos ajuda a manter a cronologia dos acontecimentos. Sempre que é necessário contextualizar temporalmente o enredo, surge o protagonista rodeado dos companheiros a ver um jogo do Mundial em que, através do anúncio do vencedor, conseguimos sempre adivinhar em que ano estamos. Em segundo lugar, e talvez o aspecto mais importante e impactante, as imagens de “Promises” fazem um jogo de cores extraordinário. Sempre que surgem cenas passadas em Itália, com o protagonista numa idade muito precoce, a tela é invadida por cores quentes e muito vivas que representam a máxima energia da juventude e a sua inocência colorida. Por outro lado, quando Alexander tem já uma idade adulta, a paleta de cores torna-se empalidecida e bastante carregada, com cores frias que representam o coração gelado da personagem principal. Porém, no último estádio da sua vida, a matiz volta a assumir uma coloração mais viva e em tons verdejantes, fazendo um paradoxo perfeito com o tema da morte. Afinal, a finitude da vida é descrita em “Promises” como a terra das segundas oportunidades.

Em suma, estamos perante uma obra cinematográfica que ensina o espectador a parar e a refletir sobre as próprias escolhas. Através do desempenho verdadeiro dos atores, somos obrigados a assumir a desilusão e os desamores do protagonista. A própria instabilidade da vida de Alexander é refletida através da instabilidade da câmara, o olho por onde acompanahmos a narrativa. Talvez por isso mesmo a escolha do elenco não tenha sido feita de forma aleatória. Se por um lado temos um ser masculino bastante sedutor, do tipo galã de Hollywood, mas com um olhar bastante frágil, consequência das vicissitudes da vida, por outro lado surge uma femme fatale capaz de destabilizar a vida do protagonista. Está, assim formado o casal perfeito e altamente cinematográfico.

Já tiveste a oportunidade de ver algum filme em cartaz na 15ª Festa do Cinema Italiano?

Promises, em análise
Promises

Movie title: Promises

Movie description: Quando Alexander conhece Laura durante uma festa de amigos, o sentimento que surge entre eles é instatâneo. Porêm, os caminhos de ambos está prestes a seguir rumos diferentes. Com o passar do tempo, as memórias de infância invadem o seu consciente, fazendo Alexander refletir sobre o rumo da sua vida e sobre aquilo que esta poderia ter sido caso as decisões tivessem sido outras. Após todas as desilusões de amor, será a amizade pelos companheiros o único sentimento verdadeiro que persistirá ao longo da vida.

Date published: 6 de April de 2022

Country: França/Itália

Duration: 113'

Director(s): Amanda Sthers

Actor(s): Pierfrancesco Favino, Kelly Reilly , Jean Reno, Cara Theobold, Deepak Verma, Kris Marshall, Leon Hesby, Ethan Hunsinger, Marie Mouté

Genre: Drama Romântico

  • Jéssica Rodrigues - 60
60

CONCLUSÃO:

“Promises” é um projeto ambicioso, mas o contínuo jogo com a temporalidade acaba por aborrecer o espectador que espera algo mais da narrativa. Nota-se um certo descuramento no que concerne à etapa mais idosa da vida do protagonista, gerando uma teia de acontecimentos que nos leva a questionar qual a conclusão da sua vida amorosa. Porém, a longa-metragem torna-se um bom exercício para todos aqueles que procuram refletir sobre os vários estádios da própria vida.

Pros

  • Desempenho dos atores, principalmente Pierfrancesco Favino;
  • Paleta de cores utilizada ao longo do filme;
  • Jogo com a ordem cronológica do enredo.

Cons

  • Apesar de contribuir para o efeito de vulnerabilidade, a instabilidade da câmara desconcentra-nos da narrativa;
  • Enredo com uma conclusão abstrata.
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