Sound of Metal, em Análise
Darius Marder apresenta-nos “Sound of Metal”, um filme com um conceito interessante que é dolorosamente desperdiçado.
Enquanto os logótipos das várias produtoras entram e saem do ecrã, ouve-se o feedback de uma guitarra eléctrica e subitamente, o filme abre num plano de uma bateria, atrás da qual há um jovem rapaz, que curvado sobre a mesma, aguarda pelo primeiro acorde, que dará o mote para o início da sua performance, à sua volta há o escuro e de cima, uma luz ilumina o músico e o seu instrumento. Chegado o seu momento, Ruben, baterista de um duo de garage punk , toca com uma energia intensa. A cena é filmada de igual forma, a câmara, à mão, passeia de um personagem para o outro entre as batidas rápidas de Ruben, os gritos da vocalista e os sons distorcidos da guitarra, a fotografia tem um certo grão, que dá ao espaço um ar sujo e vibrante, como se os sinais distorcidos dos gritos e da guitarra fizessem tremer a imagem com a sua força. A performance prossegue e no fim da mesma, voltamos a ter o feedback da guitarra, enquanto a câmara é quase que empurrada para o lado revelando o título do filme.
Nesta primeira cena, tudo é perfeito, é uma cena intensa, filmada com mestria e que nos dá a conhecer, não só o personagem principal, mas também o ambiente com o qual ele convive no seu dia a dia, um ambiente sonicamente caótico mas onde ele se sente bem.
Sobre “Sound of Metal”, pode-se dizer que é uma pena que a intensidade da primeira cena, não continue no resto do filme, no papel, um músico que perde a audição apresenta-nos um forte conflito interno, conflito esse que seria extremamente proveitoso de um ponto de vista dramático, mas infelizmente, o filme optou por não se centrar tanto nesse conflito, mas mais no processo de aprendizagem pelo qual o personagem principal passa, agora que é surdo e precisa de reaprender muito daquilo que tomou por garantido durante a sua vida.
Após o primeiro acto no qual Ruben vai, aos poucos, perdendo a audição, o jovem é levado para uma comunidade de surdos, onde poderá contactar com outras pessoas na sua situação e é aqui que as coisas começam a dar para o torto. Uma grande percentagem do filme é passada nesta comunidade ou em linhas narrativas associadas à mesma e a verdade é que, apesar de no início ser interessante ver Ruben a tentar ambientar-se à sua nova situação, impedido de o fazer de forma absoluta pela ideia de um eventual implante auditivo que acredita ser a sua salvação, esta é uma ideai cujo interesse se esgota rápido e pouco tempo depois de chegarmos à comunidade, estamos só a assistir a cenas e mais cenas de encontros carregados de um positivismo exagerado que torna a experiência aborrecida e até certo ponto irrelevante.
A progressão da narrativa é genérica, seguindo uma fórmula cansada e não fazendo nada de novo com ela, um personagem é posto numa situação adversa, tenta lutar contra ela, mas aos poucos vai aprendendo a aceitá-la, tem uma recaída, aprende mais um pouco e no fim volta ao de cima. Esta viagem seria relevante, se pelo caminho fossemos encontrando personagens interessantes, mas infelizmente, a grande maioria delas são apenas modelos pré feitos que estão presentes, apenas para ajudar o protagonista e consequentemente, o espectador a perceber o universo do filme.
“Sound of Metal”, tem, no entanto, pontos positivos, e aqui é importante falar de Riz Ahmed que, mais uma vez, nos dá uma interpretação brilhante, tal como tem vindo a ser seu hábito, seja como protagonista na mini-série da HBO, “The Night Of” ou como co-protagonista em “Nightcrawler- Repórter na Noite.”. Note-se também Paul Raci que interpreta o papel de Joe, o líder da comunidade, à semelhança de Ahmed, Raci faz um trabalho muito bom na sua interpretação e as conversas entre os dois personagens ao longo do filme ganham um grande valor por isso.
No que toca a realização, deve-se também falar de Darius Marder, nesta que é a sua primeira longa, o realizador, despido de diálogos, conta uma grande parte da história, por meios visuais, uma prática que se tem vindo a perder, apesar de o cinema ser, na sua génese, um meio visual. “Sound of Metal”, fá-lo de forma muito competente, recorrendo à linguagem cinematográfica e nunca nos deixando confusos com o que se está a passar, infelizmente, Darius Marder fica-se pela competência e acaba por não fazer nada mais interessante com a câmara, servindo a mesma, só e apenas para filmar o guião.
De um ponto de vista técnico é essencial louvar o design sonoro da longa. Num filme onde o som tem um papel fulcral, a maneira como o mesmo é trabalhado confere-lhe todo um conjunto de novas dimensões, que se fazem notar nas cenas em que Ruben começa a perder a sua audição ou nas infindáveis cenas onde o silêncio é apenas quebrado pelo som ambiente e pelos sons dos movimentos causados pelos gestos através dos quais as personagens comunicam. A fotografia, não é má, mas mais uma vez, apresenta apenas qualidade suficiente para se auto-intitular competente, não trazendo no entanto nada de extraordinário. As cores são frias e desinteressantes e apesar de superarem o desafio de representarem as cores naturais dos espaços, não fazem muito mais pelo filme ou pela sua narrativa.
No final, “Sound of Metal” não nos deixa com um mau filme, mas também não nos deixa com um bom filme. Deixa-nos com uma história sobre mudança e sobre a inevitabilidade da mesma, uma história que é bastante relevante nos dias de hoje e que nos aconselha a apreciar o silêncio numa época convoluta de informação, em que nos nossos sentidos estão constantemente a ser abalroados. Apesar de a mensagem ser relevante, é pena que a mesma não seja passada de forma mais imaginativa, causando assim um filme que tem os seus momentos, mas que não é essencial e será, provavelmente, um tanto esquecível.
O que achaste de “Sound of Metal?”
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Duarte Gameiro - 57
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Virgílio Jesus - 60
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Maggie Silva - 75
CONCLUSÃO
Sound of Metal preconiza um conflito interessante, mas escolhe outro caminho que dá ao filme uma certa irrelevância, não havendo muito para apreciar.
O MELHOR: A incrível cena inicial
A mensagem do filme, que é muito actual
As interpretações dos actores
O trabalho de som.
O final
O uso da linguagem cinematográfica
O PIOR: A falta de criatividade na fotografia
A narrativa e personagens genéricas
A irrelevância da narrativa e do conflito principal