foto de Margarida Ribeiro

The Jesus & Mary Chain ofuscam e iluminam no Coliseu

Não é segredo que, aqui na MHD, gostamos de shoegaze. Imagine-se o que foi para nós ouvir The Jesus & Mary Chain, pais do género, imersos no seu lusco-fusco iridescente.

Entrando no palco do Coliseu dos Recreios sem demoras nem longas introduções, The Jesus & Mary Chain regressam aonde sempre foram bem vindos. Enquanto esperava pelo início do concerto, não pude deixar de reparar no ambiente acolhedor que se tinha instalado. Como amigos de longa data que se reuniam após anos sem se ver. Atrevo-me a dizer que até estava presente uma fã grávida e, ironicamente, outro fã com uma t-shirt que dizia “Jesus loves the stooges”, deixando-me a pensar quem seriam os stooges neste caso, se a banda ou o público.

The Jesus & Mary Chain (© Margarida Ribeiro)

Com cinco músicas de Damage and Joy, The Jesus & Mary Chain não só deram a conhecer este mais recente álbum, como também não faltaram músicas de outros, assim como as mais associadas ao nome da banda.

Lê Também:   A Vitória do Shoegaze

Por trás dos artistas, as letras que formavam “The Jesus & Mary Chain” sobrepunham-se com três sombras umas às outras, cada uma com a sua cor. Eram o único elemento decorativo, para além dos instrumentos presentes. Em simultâneo e, de certo modo, em contraste com esta simplicidade, um impaciente e ofuscante jogo de luzes esteve presente o concerto inteiro, todas elas projectadas por detrás dos membros da banda, ficando estes em contraluz a maior parte do tempo.

The Jesus & Mary Chain (© Margarida Ribeiro)
The Jesus & Mary Chain (© Margarida Ribeiro)

A iridescente penumbra fez-me pensar que estes amigos de longa data se reuniam ali não pela companhia uns dos outros, mas pela companhia que lhes era proporcionada pela música. Este encontro não era senão a oportunidade (bastante irrecusável) de presenciar o espectáculo sublime da distorção do som e do alto volume dos amplificadores a gerarem um complexo conjunto de harmonias, a transmitirem muito mais do que aparente ruído.

The Jesus & Mary Chain (© Margarida Ribeiro)
The Jesus & Mary Chain (© Margarida Ribeiro)

Após o júbilo do público ao reconhecer “April Skies”, a atmosfera estava já mais do que orientada. O só muito raramente vermos a cara dos artistas ou o solo em “Head On” ser tocado de costas para o público poderia indicar uma certa indiferença ou até mesmo arrogância por parte da banda. No entanto, bem pelo contrário, a sensação com que nos deixam os The Jesus & Mary Chain é a de dar lugar à música, sem se ostentar a si ou querer-nos conquistar a nós.

The Jesus & Mary Chain (© Margarida Ribeiro)
The Jesus & Mary Chain (© Margarida Ribeiro)

Jim Reid, a seguir a um “obrigado”, chega a admitir que esteve a aprender algumas palavras em português, mas pedia desculpa por se ter esquecido delas, rindo com o público. Com uma excelente performance em “All Things Pass” e “Some Candy Talking”, o público não deixou nem por um momento de acompanhar e cantar, fosse com o copo na mão, fosse com as mãos no ar. A miríade colorida de luzes, alternando constantemente entre si, seguindo tantas vezes a batida da bateria, e o som da guitarra, a acompanhar a pulsação dos nossos corações, contribuíam para que o tempo passasse sem que déssemos por isso.

The Jesus & Mary Chain (© Margarida Ribeiro)

Ao som da “Darklands”, dá-se uma erupção entusiástica do público, não podia deixar de ser. Terminada a canção, Jim anunciou calmamente “This is the last song”. Frustração do público, desolação geral. “I’m gonna say this again. This could be the last song”, riu-se. Enquanto saíam do palco, abandonados os instrumentos, reverberava o som distorcido de uma guitarra, que continuou a tocar mesmo quando já nenhum deles estava lá, deixando-nos no incerto desejo do que viria, mesmo estando conscientes de que voltariam para o encore.

The Jesus & Mary Chain (© Margarida Ribeiro)
The Jesus & Mary Chain (© Margarida Ribeiro)

Reentraram. Ilumina-se, revoluciona-se o público. Ao som dos primeiros nebulosos acordes, permeados de estática ensurdecedora, da “Just Like Honey” morri. A morte não me impediu de olhar em torno e perceber que nem todos partilhavam da minha paixão por shoegaze, outras canções do encore foram recebidas mais clamorosamente. Também não me impediu de sacar do telefone e filmar a canção. Escusado. Só se ouvem os meus gritos. Felizmente, não foi a única coisa que ficou para a memória. Acabado o concerto, na tristeza do fim, uma só pergunta me confortava e acompanhava: “So what if I run? Where would I run to?”

The Jesus & Mary Chain (© Margarida Ribeiro)
Lê Também:   Francisca & Mariana trauteiam no Guitarras ao Alto

The Jesus & Mary Chain no Coliseu dos Recreios, 28 de Maio de 2018 (alinhamento)

  1. Amputation
  2. April Skies
  3. Head On
  4. Blues From a Gun
  5. Black and Blues
  6. Mood Rider
  7. Far Gone and Out
  8. Between Planets
  9. Snakedriver
  10. Teenage Lust
  11. Cherry Came Too
  12. All Things Pass
  13. Some Candy Talking
  14. Halfway to Crazy
  15. Darklands
  16. Reverence
  17. Just Like Honey (encore)
  18. Cracking Up (encore)
  19. In a Hole (encore)
  20. War on Peace (encore)
  21. I Hate Rock ‘n’ Roll (encore)
The Jesus & Mary Chain ofuscam e iluminam no Coliseu
  • Carolina Ferreira - 85
85

Leave a Reply