J. R. R. Tolkien odiava Dune – mas qual a razão?
J. R. R. Tolkien é o criador de uma das maiores sagas de fantasia do mundo. O seu trabalho, com “O Hobbit” e “O Senhor dos Anéis” sendo os mais populares, inspirou dezenas e centenas de autores, incluindo George R. R. Martin, autor de outro franchise bastante lido, “A Song of Ice and Fire”, que deu origem a “Game of Thrones” da HBO.
Ao longo dos anos, o autor britânico partilhou as mais diversas opiniões com amigos e fãs através de milhares de cartas. Atualmente, a maioria permanece em coleções privadas ou até compiladas em livros dedicados a si.
Por exemplo, sabe-se que J. R. R. Tolkien não gostava de Walt Disney pelo facto de danificar os contos clássicos, bem como de tornar tudo num produto a ser comprado, possuindo um maior sentido de marketing do que de arte.
De igual modo, o escritor não concordou com o seu editor, Rayner Unwin, no que toca ao nome do terceiro livro de “O Senhor dos Anéis”. Enquanto Tolkien preferia “A Guerra do Anel“, virando o foco para o Anel e a guerra que termina com a tirania de Sauron, o editor era a favor de “O Regresso do Rei“, indicando ao leitor um final feliz e onde “o bem vence”.
Tolkien recusou-se a falar sobre “Dune” de Frank Herbert
“Tolkien’s Library: An Annotated Checklist” de Oronzo Cilli é um projeto do qual possivelmente nunca ouviste falar mas é consultado pelos estudiosos da obra de Tolkien. Publicada em 2009, a obra apresenta ao leitor uma lista dos livros que estavam na posse de Tolkien, fossem eles adquiridos, emprestados, ou consultados.
Com 2600 entradas, a obra inclui, além dos livros, outros documentos úteis como, por exemplo, entrevistas, reviews, trabalhos dos seus estudantes e publicações na Early English Text Society – da qual era membro. No meio destes textos, consegues encontrar a chamada Entry 964.
Aqui é mencionada uma carta datada de 12 de março de 1966, no qual Tolkien agradece a um fã, John Bush, o envio de “Dune”, acrescentando não ter gostado do livro. Publicado o ano antes, o título nasce pelas mãos de Frank Herbert, e atualmente conta com duas adaptações ao cinema. A mais recente protagonizada por Timothée Chalamet e Zendaya, contando com a realização de Denis Villeneuve.
“Obrigado por me enviar uma cópia de ‘Dune’. Eu recebi uma o ano passado do Lanier e já sei alguma coisa sobre este livro”, começa J. R. R. Tolkien. “É impossível para um autor ainda no ativo ser justo perante outro autor a trabalhar em linhas semelhantes. Pelo menos, assim penso. Na realidade, eu não gosto de ‘Dune’ com alguma intensidade, e nesse caso infeliz é melhor e mais justo para com o outro autor, manter o silêncio e recusar o comentário…”
Mas… Qual a razão?
Não seria de estranhar que Tolkien deixasse a sua opinião se apenas desgostasse de um elemento ou outro. O autor não era estranho à crítica, e nenhum autor levaria a mal uma opinião objetiva sobre uma ou outra coisa de que não gostaram. Contudo, e se a opinião fosse bem mais brusca?
A realidade é que ninguém sabe ao certo qual a razão do autor de “O Senhor dos Anéis” aparentemente odiar – ou nas suas palavras, “não gostar com alguma intensidade” -, uma das maiores obras-primas da ficção científica. Mas isso não travou a comunidade de partilhar as suas opiniões e uma delas destaca-se.
Frank Herbert recebeu uma educação católica por parte das tias. Sabemos isso através de fontes como, por exemplo, “Dreamer of Dune: The Biography of Frank Herbert“, escrito pelo filho do autor. Na sua idade adulta, ele direcionou-se para o Budismo Zen. A sua visão da religião, não era muito positiva. E isso vê-se em “Dune“, onde a religião serve como arma de manipulação e controlo dos povos.
Já Tolkien era um católico devoto. De um modo bastante simplificado, a Terra Média de “O Senhor dos Anéis” rege-se por um Deus protetor chamado Eru Ilúvatar. De igual modo, o Mal é representado por Melkor, uma espécie de “diabo” ou “Lúcifer”. Os seres bons são recompensados por Deus, recebendo a sua “Graça”, e são inúmeros os outros paralelismos que podemos fazer.
Assim, é possível que o desdém de Tolkien perante a obra de Herbert tenha nascido do facto de “Dune” mostrar a religião como a manipulação do povo, enquanto o autor de “O Hobbit” vê na religião a salvação. Criticar o autor americano seria envolver-se em debates religiosos acessos que certamente desejava evitar.