69º Festival de Cannes (Dia 11) | A Festa (Quase) Acabou!
A competição fechou com dois dos melhores filmes a concurso: o thriller Elle do mestre Paul Verhoeven, com Isabel Huppert e Le Client, uma crónica social do iraniano Asghar Fahardi.
Elle de Paul Verhoeven (Dinamarca) com Isabelle Huppert, Laurent Lafitte, Anne Consigny (competição)
A história: Michele (Isabelle Huppert) é uma dessas mulheres fortes que nada a parece atingir. Ela vive sozinha numa bela casa cheia de janelas, num dos melhores bairros de Paris e dirige uma grande empresa de vídeojogos. Michele conduz os seus negócios como a sua vida amorosa: isto é com uma ‘mão de ferro’. A sua vida vai mudar quando é atacada na sua casa por um estranho encapuçado. Destemida, como sempre Michele começa a investigar à sua volta. Um estranho jogo de duplicidades começa a estabelecer-se e algo perigoso pode acontecer a qualquer momento.
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A análise: Depois da homenagem em Lisboa, o cineasta holandês Paul Verhoeven, fechou a competição Cannes 69, com Elle, um misterioso retrato de uma mulher, um mosaico social de perversidades ou antes um thriller psicológico com o Isabelle Huppert, mais uma vez num arriscado papel de violência, sadismo e duplicidade. Elle é uma espécie de antologia afrancesada no melhor dos sentidos, porque herda muito das figuras femininas de Instinto Básico (Sharon Stone), Showgirls (Demi Moore) ou O Livro Negro (Carice Von Houten), com um certo savoir-faire e refinamento dos thrillers psicológicos de Claude Chabrol, André Techiné ou mesmo Michael Haneke.
Filmado com duas câmeras digitais em simultâneo, cada plano é construído de uma forma soberba, para transmitir ambiguidade e perversão e uma serie de sensações diversas que oscilam entre o suspense, a violência formal e a farsa burlesca. Verhoeven não se esquiva a nada e mostra várias vezes a tentativa de violação desta mulher activa habituada a dominar e que se vê subjugada. O realizador de Instinto Básico, questiona novamente até que ponto chegam os limites morais da nossa sociedade, sempre com aquele seu jeito de ir mais longe que os outros.
Isabele Huppert é simplesmente fabulosa no papel da fria Michele, ao lado de um grupo de actores franceses improváveis num filme desta natureza e onde se destacam: Laurent Laffite, Virginie Efira e Anne Consigny. Elle é filme essencial para todos os cinéfilos que amam este cineasta-autor, que em tempos foi acusado de ’comercialão’, chamado Paul Verhoeven. Arriscava a dizer que pode bem estar aqui a Palma de Ouro 2016.
Le Client de Asghar Farhadi (Irão) com Shahab Houssein, Taraneh Allidousti (competição)
A história: Forçados a deixar seu apartamento no centro de Teerão devido a grandes obras que ameaçam a construção do seu edifício, Emad (Shahab Houssein) e Rana (Taraneh Alidousti) têm de mudar-se para uma nova casa. Um incidente relacionado com a antiga inquilina, vai mudar a vida do jovem casal, que partilha em comum entre outras coisas, o gosto pelo teatro e pela representação.
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A análise: É um grande regresso a Cannes dois anos depois de O Passado, e depois dea estreia de Uma Separação (2011), o filme que revelou Asghar Farhadi, à critica internacional em Berlim. De facto este Le Cliente não é tão forte e impactante como os dois filmes anteriores embora a formula de crónica social, maneira de filmar e modelos de discurso e representação se mantenham (talvez demasiado) idênticos. Le Client, evoca a história de um casal de intelectuais, que está em crise de relacionamento, e que além das suas profissões, interpretam a peça A Morte de um Caixeiro Viajante, numa companhia teatral amadora.
Le Client é na verdade um filme que pode ser visto por vários pontos de vista, e tudo depende daquilo que espectador quer tirar do ecrã: uma crónica social, das diferenças de classes e cultura na sociedade iraniana, nomeadamente na grande metrópole de Teerão; um filme sobre a moral e os costumes que assenta numa história de vingança que acaba de uma forma trágica e com problemas de consciência para os seus protagonistas.
Na verdade o filme é mais uma história de familia (ou de familias) ou de um casal em ruptura, (tal como em A Separação, mas o pretexto agora é outro), que trata sobretudo da complexidade das relações sociais. Para este exímio e cirúrgico Le Client, o realizador Asghar Fahardi, mais uma vez não arriscou trazendo para protagonistas um par dos melhores actores iranianos: Shahab Hosseini (Uma Separação) e a bela e discreta Taraneh Alidoosti (I am Taraneh, I am Fifteen Years Old de Rasoul Sadrameli).
JVM