As duas irmãs Brangwen (Glenda Jackson e Jennie Linden). | ©Brandywine Productions

(Re)Ver os Clássicos: Mulheres Apaixonadas, em análise

‘Mulheres Apaixonadas’ (1969), de Ken Russell, inspirado no romance de D. H. Lawrence, é um dos filmes mais subversivos dos últimos 50 anos no que diz respeito às questões de género. A estreia de ‘O Amante de Lady Chatterley’, inspirada igualmente na obra do escritor, tornou-se um bom pretexto para rever esta bela obra-prima do cinema britânico. Disponível na plataforma MUBI.

‘Mulheres Apaixonadas’ (1969), baseado no romance homónimo do polémico romancista D. H. Lawrence e realizado por Ken Russell (‘Viagens Alucinantes’) foi lançado em Inglaterra, há pouco mais de cinquenta anos, mas curiosamente permanece extremamente actual e provocador. O filme significou então — e de certo modo perdurou ao longo destas cinco décadas — como uma soberba e trágica história de dois amores e cruzamentos entre dois homens e duas mulheres, no contexto do pós-Primeira Guerra Mundial e durante os culturalmente e turbulentos anos 20, da Belle Époque. ‘Mulheres Apaixonadas’, teve quatro nomeações aos Oscar (Melhor Realizador, Melhor Actriz, Melhor Argumento e Melhor Fotografia) mas foi a talentosa Glenda Jackson que, ganhou a estatueta de ouro, pela sua incrível interpretação como a desafiadora dos costumes, Gudrun Brangwen.

Mulheres Apaixonadas
©Brandywine Productions

‘Mulheres Apaixonadas’, centra-se na história dos romances das duas irmãs Brangwen (Glenda Jackson e Jennie Linden ) educadas e de classe média — filhas de um artesão que restaura móveis e miniaturas de madeira—, com dois jovens amigos da classe alta: um professor boémio (Alan Bates) e um herdeiro rico (Oliver Reed), filho de um poderoso industrial. As fortes diferenças de classe dentro do quarteto de amantes, os fortes preconceitos de casta no rígido sistema social inglês e os impulsos de sentimentos, compõem as tensões entre cada uma das histórias pessoais, onde se cruzam as explorações vitais de cada personagem, todas elas, aliás bastante complexas. O filme reflecte por um lado essas complexidades do romance de D.H. Lawrence, para quem as personagens nunca são inocentes; mas ao mesmo tempo consegue afastar-se dos parâmetros pré-estabelecidos da época, com questões bastante actuais e que ainda hoje permanecem: Até onde chegam os sentimentos de um homem por uma mulher? E de um homem para com outro homem? Quais os limites de uma amizade dentro do mesmo sexo? Qual o nível de liberdade que um casal é capaz de tolerar entre si? Ou como o amor se pode transformar numa obsessão?

VÊ TRAILER DE ‘MULHERES APAIXONADAS’

Em ‘Mulheres Apaixonadas’, embora à partida não pareçam, são as mulheres que têm poder, mas têm-no de um forma violenta e às vezes até bastante dura. Gudrun (Glenda Jackson) é uma rapariga com inclinações artísticas, que reflecte sobre os costumes sociais, os papéis femininos, além de ser capaz de pensar por si própria e conseguir superar as barreiras e preconceitos da sua classe trabalhadora. O amor obsessivo e impetuoso de Gerald (Oliver Reed), a princípio parece preenchê-la e completá-la, mas aos poucos começa a subjugá-la e sufocá-la. Por sua vez, Rupert (Alan Bates) e Ursula (Jennie Linden) partilham um romance, que com a mesma facilidade floresce como murcha, apesar da profunda atração que ambos sentem um pelo outro, mas num relacionamento, que não se percebe muito bem.

Mulheres Apaixonadas
Em ‘Mulheres Apaixonadas’, homens e mulheres vivem as suas cenas com as mesmas incertezas filosóficas. | © Metro-Goldwyn-Mayer Studios Inc. All Rights Reserved.

Repleto de subtilezas técnicas dignas do melhor realismo do cinema britânico — apesar de ser um filme de época — Ken Russell — na altura um realizador escolhido quase de improviso, para realizar este filme, mas isso é outra história… — enche-nos o ecrã (é um daqueles filmes que vale a pena ver em grande), com cenas absolutamente memoráveis: o casamento da irmã mais nova de Gerald (Reed), a subsequente boda, o brinde dos trabalhadores na grande casa da família do patrão, pai de Gerald, o enterro do pai, o grande industrial e a loucura da mãe de Gerald (Reed), a luta corpo-a-corpo entre os dois amigos (Reed e Bates) nus em frente ao fogão a lenha da sala — uma cena aliás com muitas conotações homoeróticas — a louca corrida de Gudrun (Jackson) entre o gado bravo e varias outras sequências, absolutamente notáveis, que culminam numa sesta para a eternidade de Gerald (Reed), na neve de uma estância alpina da Suíça.

Mulheres Apaixonadas
O amor impetuoso de Gerald (Oliver Reed), a princípio parece preencher Gudrun (Glenda Jackson). ©Brandywine Productions

Em última análise, em ‘Mulheres Apaixonadas’, homens e mulheres vivem as suas cenas com as mesmas incertezas filosóficas e tentam seguir um destino marcado tanto pelos seus demónios, como pelos seus arrebatamentos angelicais. Porém é um filme sensual, atraente e uma história de amor intensamente romântica, mesmo com um toque de tragédia. ‘Mulheres Apaixonadas’ está disponível na plataforma de streaming Mubi, mas vi-o em DVD com um conjunto extraordinário de extras e em cópia restaurada em 4K, pelo BFI National Archive, comprado na Amazon. 

JVM

Mulheres Apaixonadas, em análise

Movie title: Women in Love

Movie description: Gudrum (Jackson) e Úrsula (Linden) são duas letradas irmãs, criadas na modesta Inglaterra dos anos 20. Uma é professora e a outra escultora, mas ambas sabem muito pouco sobre o amor. Porém acabam por embarcar nuns complicados casos amorosos: uma com Rupert (Bates), um notório boémio e a outra com Gerald (Reed), um rico e obscuro conquistador. O que descobrem sobre si mesmas e sobre os seus amantes vai ser muito mais fascinante e perigosamente mais avassalador do que imaginavam antes dos seus relacionamentos.

Date published: 16 de December de 2022

Country: Reino Unido

Duration: 131 minutos

Director(s): Ken Russell

Actor(s): Glenda Jackson, Alan Bates, Oliver Reed, Jennie Linden, Eleanor Bron, Alan Webb, Michael Gough,

Genre: Drama,, 1969,

  • José Vieira Mendes - 90
90

CONCLUSÃO:

’Mulheres Apaixonadas’, de Ken Russell (1969) é sem dúvida um clássico absoluto e indispensável da história do cinema, que conseguiu envelhecer sem perder o mínimo de encanto, elegância e sobretudo sem diminuir a força dos seus argumentos ou do seu extraordinário ritmo narrativo de drama trágico; além de se destacar para altura, nos vários temas que aborda, na realização, direcção de fotografia, reconstituição de época e principalmente na arrojada interpretação dos actores. ’Mulheres Apaixonadas’, foi e continua a ser um filme bastante ousado, sobre as questões de género, que defende a independência da mulher, diante da pressão e arbitrariedade masculina. É também um belo ensaio que procura avançar para os territórios menos firmes ou mais profundos da mente e da natureza humana. É um grande filme, subversivo e efectivamente de uma enorme actualidade!

JVM

Pros

É uma das poucas adaptações de uma obra literária, que consegue eficazmente manter-se fiel ao material original, combinando ao mesmo tempo, com o extraordinário estilo visual único do realizador.

Cons

Apesar do estilo impressionantemente provocador de Ken Russell, há que o ache, sobretudo na crítica da altura, um filme apenas episódico e muito controlado, comparado com outros mais radicais do realizador.

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