Frances Ha, em análise

 

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  • Título Original: Frances Ha
  • Realizador: Noah Baumbach
  • Elenco: Greta Gerwig, Mickey Sumner, Adam Driver
  • Género: Drama, Comedy
  • USA | 2012 | 86 min

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Frances é descontraída na busca de uma maturidade que vê nalguns. Noutros, nem por isso. Nela, menos do que aquela maturidade que realmente contém em si mesma. Frances promete a si própria um futuro de sucesso sem, verdadeiramente, o alcançar. A não ser que o sucesso seja uma questão de perspectiva. Um raio de sol interior. Um passo de dança simples, mas que realiza quem o faz, sem necessidade de uma técnica imaculada.

Noah Baumbach e Greta Gerwig, sua musa do momento – também na vida real – assinam o guião que origina a realização de “Frances Ha“. Frances é Greta Gerwig – alguém se lembra de Sally, de “To Rome with Love” (Woody Allen), ou mesmo Hannah, de “Hannah Takes the Stairs” (Joe Swanberg)?

N. Baumbach, por seu lado, é conhecido por filmes como “Greenberg” e The Squid and the Whale”, este último baseado em experiências verídicas do próprio e do irmão. Quanto à relação entre as duas personalidades, não é esta a primeira vez que trabalham juntos, pois em “Greenberg”, Baumbach orientou Gerwig.

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E, a título de curiosidade, vale a pena reter uma frase deste realizador, sintomática da sua entrega ao plano emocional nas suas criações, um pouco em detrimento da teoria – “I grew up in the heat of 70s postmodern fiction and post-Godard films, and there was this idea that what mattered was the theory or meta in art. My film is emotional rather than meta, and that’s my rebellion.” Há, assim, que gostar de Baumbach, para começar.

Filmado a preto e branco, mostra claramente a tempestade de influências de indiscutível qualidade: New Wave francesa e filmes de Woody Allen, como “Annie Hall”, Manhattan” e “Broadway Danny Rose”. Com referências musicais aos filmes de Truffaut e trilhas sonoras dos sixties da autoria de Georges Delerue.

27 anos. É a idade de Frances. A saltitar (literalmente) pela idade adulta, não é muito diferente de todos nós, do que fomos nalguma fase, pelo menos. Com excepção, talvez, da sua postura, demasiado celestial no que respeita às suas reacções com o que a rodeia. Recebe com naturalidade. Poder-se-ia, aliás, substituir uma das suas t-shirts. Ao contrário de “Ask Me!”, porque não “I accept” ou “Who Cares?”

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Aprendiz de uma companhia de dança, encara a vida como uma inevitabilidade de momentos menos merecidos, e que se consubstanciam na falta de concretização do sucesso pessoal e profissional esperado. Frances passeia por Nova Iorque, Califórnia, Paris, de leggings pretas e cabelo apanhado e desgrenhado, aliando-se à natureza das pessoas que a cercam, suas atitudes e opções, por um lado, e não dramatizando as situações de menor reconhecimento com que tem de lidar diariamente, por outro. Transborda optimismo. Mas não deixa de transmitir que mesmo os optimistas não escapam às desilusões e fracassos. Simplesmente, para eles, a relativização é palavra de ordem. Um rosto triste é imagem desconhecida. Ou, pelo menos, se se dá a conhecer, surge fundido com um leve sorriso de aceitação e, possivelmente, uma piada oportuna. “Frances Ha” toca também em temas como a luta de classes, a auto-estima e a amizade – esta contada, essencialmente, através da franca relação entre Frances e Sophie (Mickey Sumner), uma ligação que nos traz à memória as noites de conversa com os melhores amigos, os cigarros de cumplicidade, os segredos partilhados.

A película poderá surpreender por não possuir propriamente uma evolução de acontecimentos que conduzam (pelo menos, claramente) ao cume da montanha, descrevam diversos pontos que, de modo gradual, levem a cortar a meta. Não. E quem for à espera de um script como este, não sairá, com certeza, agradado por aí além com “Frances Ha”. Este é um filme caracterizado pela sucessão de cenas quotidianas, ora indoor, ora outdoor, através das quais Baumbach não se inibe de, maravilhosamente, descrever uma jovem moderna, confrontada pela árdua realidade (questões sócio-económicas, realização pessoal e profissional, aceitação do ‘eu’).

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Independentemente dos lugares que visite ou onde se instale, Frances é uma alma indiscutivelmente diferente. Mas será que essa diferença é totalmente positiva? Esta interrogação faz-nos reflectir um pouco sobre qual terá sido a intenção de Baumbach. Defender acerrimamente o optimismo como caminho a seguir nos desafios diários? Inclinarmos as nossas tendências para uma postura de aceitação perante tudo, sem excepção? Porque, se foi só este o propósito de Baumbach, Frances conduz-nos por ruas perigosas. Não obstante termos plena consciência de que, muitas vezes, há que abraçar, com menor ou maior entusiasmo o que nos oferecem, existe uma ténue fronteira entre esse padrão de acção e aquele conformismo impeditivo do crescimento. De qualquer forma, Baumbach convida-nos à reflexão. E tal é de valorizar.

Tendo sido já salientado a ausência de cor na obra de Baumbach, poderemos retirar desta opção variadíssimas ideias e integrá-las numa interpretação lógica. Temos duas cores definidas, o preto e o branco. Mas as indefinições também são uma constante. E é o cinzento que as contempla. Umas vezes, o prato da balança pende para o branco, outras para o preto, enquanto a espontânea Frances anda, corre, dança, coreografa, ri, cai, diz o que lhe vai na mente, ouve o menos agradável, aceita e parte, descontraidamente, para outra.

Gostamos de um certo sabor nostálgico de Jean-Luc Godard, uma decoração de espaços onde se vêem livros, um ambiente onde se ouve falar de música, cinema e dança. Como se arte fosse aquele tesouro que restará sempre, mesmo que tudo vá à falência. “This flat is very aware of itself”, comenta Sophie acerca do local onde se encontra instalada Frances, uma casa de amigos.

Mas gostaríamos, sobretudo, que Frances, com aquela ligeira ingenuidade a despertar laivos de compaixão, fosse bem sucedida. Torcemos por ela. Mas, essencialmente, admiramos a sua tranquilidade e humor, que, se fosse uma canção, seria uma música de um dos filmes de Woody Allen.

Adoramos Greta Gerwig e a sua entrega belíssima a este papel. A comédia dramática é, a nosso ver, o seu elemento forte.

E, definitivamente, idolatramos David Bowie e o seu “Modern Love”, colados a cada esquina, no interior de um prédio, numa festa privada, num sorriso despreocupado.

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Numa mistura de confiança e desespero, expectativa e desilusão, espera crente e um encolher de ombros, Frances vai andando, provavelmente faltando-lhe sempre algo. Mas talvez seja exactamente por isso que o filme tem uma duração tão curta. Isto não é o fim. A três anos dos trinta, Frances poderá estar incompleta (Ha de Halladay). Não correspondida. Seja por Sophie, pela carreira, ou por um rosto liso e uma aparência mais leve para a idade.

Se o seu nome fosse traduzido em siglas, seria AVMD – Alegria de Viver Mesmo com Desapontamentos. Claro, ao som de “Modern Love”. 

  SME



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