Mapas para as Estrelas, em análise
FICHA TÉCNICA
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O suor escorre em bica enquanto se convulsa na cama, às voltas, aos gritos desesperados e presos a uma realidade fabricada, cada vez mais fictícia e desumana. No novo filme de David Cronenberg, Hollywood vive e respira o seu pior pesadelo.
A família Weiss é um arquétipo do show biz andante: o pai, Strafford, é um analista e life-coach que fez uma fortuna com os seus manuais de autoajuda; a mãe, Cristina, é a manager da carreira do filho de ambos, Benjie, uma criança-estrela de 13 anos acabada de sair de um programa de reabilitação pelo consumo de drogas. A chegar perigosamente perto do “núcleo familiar” está ainda a filha afastada Agatha, agora maior de idade, que foi recentemente liberta do hospício onde foi tratada e internada na infância. A juntar ao mix explosivo, introduz-se Havana, uma atriz cliente de Strafford que sonha protagonizar o remake do filme que tornou a sua mãe famosa nos anos 60.
Se ALL ABOUT EVE, SUNSET BOULEVARD e MULHOLLAND DRIVE se envolvessem numa noite de excessos, é muito provável que o fruto bastardo fosse algo muito semelhante a MAPAS PARA AS ESTRELAS.
Impiedoso e implacável, é um murro no estômago de uma Hollywood entorpecida pela ilusão de paraíso glamouroso e trabalhador que furiosamente tenta exteriorizar. O acídico comentário de Cronenberg sobre o narcisismo oco da cultura da celebridade, embrulhado numa sensação de sonho febril povoado por aberrações e perversão é constantemente polvilhado por um humor negro sórdido, no limite do depravado, que abocanha violentamente a mão que o tem vindo a alimentar.
Ao tema em questão (também abordado, de outro ponto de vista, pelo mais recente filme de Sofia Coppola – BLING RING: O GANGUE DE HOLLYWOOD), pouco se acrescenta de novo, mas o filme de Cronenberg acaba por se diferenciar por ultrapassar o limite da sátira para cavalgar ferozmente para o campo do cruel e selvagem.
É verdade que a perturbação sempre fascinou o realizador canadiano, desde os primórdios da sua sórdida carreira, em meados dos anos 70. E se é igualmente rigoroso afirmar que este agente do caos pode ter modificado drasticamente a sua abordagem à sétima arte na entrada do séc. XXI, por outro lado, o deslumbramento pela facilidade de derrubamento dos frágeis sistemas sociais continua a ser a força motriz por detrás do seu cânone cinematográfico.
As motivações ou pontos de ligação para tal desmoronamento têm sido várias, desde a tecnologia (Videodrome, 1983) ao crime (Promessas Perigosas, 2007), passando pelo romance (A Mosca, 1986), a psicologia (Um Método Perigoso, 2010) ou até, veja-se os automóveis (Crash, 1996). Em MAPAS PARA AS ESTRELAS, o agente acaba por ser, por ventura, o mais assustador de todos: os nossos piores impulsos.
As performances são, de um modo geral, competentes na retenção da insegurança e ansiedade extremas das personagens. Julianne Moore é especialmente bem-sucedida no complexo retrato de uma mulher com tiques de diva e com mais do que ligeiros traços de neurose e crueldade.
John Cusack agarra o melhor papel que lhe foi disponibilizado na última década para emprestar toda a monstruosidade a Strafford, enquanto Mia Wasikowska é maravilhosamente distante como Agatha, o verdadeiro anjo da destruição.
Apesar de pouco subtil e nem sempre especialmente gracioso, o argumento de Bruce Wagner é especialmente apto a manter um bom ritmo ao longo de duas horas de assombrações, revelações, twists e drama. É, à semelhança de COSMOPOLIS (ainda que por diferentes razões), uma narrativa relativamente impenetrável e fria, mais crítica e cerebral do que emocional, mas é impossível negar o seu charme de b-movie no coração enegrecido.
As conclusões não são propriamente satisfatórias, mas para um filme sobre a superficialidade existe sempre o risco de ser… superficial. Resta agarrar o mapa de Cronenberg, degustar o delicioso fruto proibido e aceitar como escabroso destino o caos da moralidade.
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