10 musicais para ver antes de La La Land | Serenata à Chuva

Serenata à Chuva, o mais alegre e perfeito musical que Hollywood já produziu, é um ponto de referência incontornável em La La Land. O filme de Chazelle chega mesmo ao ponto de reimaginar um dos diálogos do filme de 1952 e copiar o cenário de um clube de jazz para o seu espetacular epílogo, tão descarada é a homenagem!

 


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Muitos pressupostos especialistas da Awards Season têm vindo a apontar La La Land como o garantido vencedor do Óscar de Melhor Filme, justificando a sua escolha com o facto do musical de Damien Chazelle ser um filme sobre Hollywood e a Academia recompensa sempre filmes sobre a sua indústria. Isso pode ser verdade ultimamente (vejam-se as vitórias de Argo e O Artista), mas temos de admitir que é um fenómeno muito recente. Na verdade, os Óscares historicamente demonstraram uma certa antipatia para com obras tão focadas no mundo do cinema e não há melhor exemplo disto que aquele que é talvez o melhor musical de sempre, Serenata à Chuva. Para quem não saiba, a magnum opus de Gene Kelly e Stanley Donan recebeu duas nomeações para os Óscares, no fim da cerimónia, saiu de mãos a abanar.

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É óbvio que os prémios da Academia estão longe de ser uma meritocracia e que a falta de homenzinhos doirados em nada altera a qualidade de Serenata à Chuva, mas esse continua a ser um dos grandes crimes dessa instituição. Afinal, haverá em toda a história de Hollywood um filme tão perto da pura perfeição (e estamos a incluir nesta consideração a enorme sequência sonhada que irrita muitos fãs do filme)? Será que existe uma melhor síntese dos prazeres do escapismo cinematográfico? Será que alguma vez houve uma mais inebriante carta de amor ao cinema americano? A resposta a todas estas perguntas pode variar de pessoa para pessoa mas, a nosso ver, “não” é a única que é válida. Se têm dúvidas, maravilhem-se com o número musical titular em que a face sorridente do ator é possivelmente a melhor representação de alegria alguma vez capturada em celuloide.

Para uma análise crítica e temática, essa cena de orgástico jubilo dançado é de particular importância, especialmente quando começamos a analisar a sua construção. Atentem que Kelly não está a dançar em nenhuma rua de Los Angeles, mas sim num cenário de estúdio. A chuva não é real e nem sequer é apenas água, pois tiveram de misturar leite para que as gotas fossem mais percetíveis. Além de tudo isso, a cena demorou tanto tempo a ser preparada que Kelly, encharcado até aos ossos durante horas a fio, estava a arder de febre quando filmou a sua icónica dança. Apesar de toda essa falsidade e miserável esforço, o resultado final é o derradeiro antidepressivo cinematográfico e, numa época em que Hollywood se virou para o pseudo realismo como registo standard, momentos como este são uma boa lembrança do poder que o artificio descarado pode ter. Por vezes, é através da falsidade que a arte consegue criar as mais genuínas reações emocionais no seu público.

Com tudo isso em consideração, uma das facetas mais interessantes de Serenata à Chuva é o modo como o filme não se fica pelo produto final dessa mesma construção artificial, mas atreve-se a tornar isso num dos seus temas principais. Apesar da sua nostalgia pela Hollywood do final dos anos 20 – uma época de revolução sonora que, como o filme demonstra resultou na destruição de inúmeras carreiras – Kelly e Donan não têm medo de revelar quão a magia do cinema passado e presente é um esforço estudado. Não estamos perante nenhuma dissecação ou subversão (Kelly não é Godard!) mas sim de uma celebração inteligente. Reparem como uma das cenas mais românticas da história é um passeio pelo backlot que termina com o casal principal num estúdio vazio, onde, através de luz, efeitos especiais e cenário, um ídolo de matiné transforma uma inocente figurante na imagem luminosa de uma estrela de cinema.

Não é por acaso que um dos primeiros momentos de real entendimento romântico entre os dois protagonistas de La La Land constitua um passeio pelo backlot onde a personagem de Emma Stone trabalha. Tanto na sua ingenuidade musical como no seu artificialismo escapista e reverência à Hollywood do passado, o filme de Damien Chazelle é um incontornável herdeiro do legado deixado por Serenata à Chuva. Basta olharmos para uns minutos de La La Land para percebermos o júbilo dos seus cineastas apaixonados por cinema a criarem uma homenagem a tudo o que mais adoram e o mesmo é percetível em Serenata à Chuva, onde todos os artifícios da Hollywood da época funcionam como perfeitos criadores de entretenimento para as massas.

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Tal forma de artifício descarado, desenvergonhado e desejoso por agradar ao público, custo o que custar, é algo que nem todas as audiências apreciam, especialmente se estiveram presas a cânones e estéticas firmemente contemporâneas, mas nada disso invalida os méritos dos dois filmes em questão. Como nota final, contudo, temos de referir algo que em nada tem que ver com a alegria de Gene Kelly a dançar à chuva ou com a beleza de Ryan Gosling e Emma Stone a dançarem através do céu noturno. Devido à recente morte de Debbie Reynolds será difícil ver Serenata à Chuva, o filme que a tornou uma estrela, sem reduzir o visionamento a uma elegia lacrimosa à atriz. Mesmo assim, continuamos a recomendar este clássico e a afirmar, sem dúvida, que não há filme mais alegre na história de Hollywood, mesmo com o peso da perda da sua estrela a pesar-lhe em cima.

 


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Na próxima página deixamos Gene Kelly para voltar a Fred Astaire, desta vez na companhia de uma companheira de dança bem diferente de Ginger Rogers. Não percas!

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