Sin City: Mulher Fatal, em análise
Mulheres, umas atormentadas, algumas heroínas, outras calculistas. Noite. Crime. A preto e branco, gráfico e a 3D. Esse ‘neo-noir’ que tantos de nós, cinéfilos apreciadores da arte de Frank Miller, ansiámos por ver chegar aos ecrãs neste espaço temporal de nove anos. E eis que a Cidade do Pecado não perdeu o jeito.
A nível de argumento, a dupla de realização adaptou duas histórias da novela de F. Miller –“Just Another Saturday Night” e “A Dame to Kill For” – e fez nascer dois enredos originais – “The Long Bad Night” e “Nancy’s Last Dance”.
Marv (Mickey Rourke) é um autêntico tanque de guerra, ávido por matar, preparado para morrer, deliciosamente presenteado por F. Miller com tiradas espirituosas e reveladoras da sua sabedoria. Relembrando as palavras de Dwight, em “Sin City”, ali na pele de Clive Owen, o lugar de Marv deveria ser em Roma, como gladiador, ou num campo de batalha, fazendo uso do seu machado na face de alguém. O regresso de Marv é um dos ‘highlights’ desta sequela.
O outro destaque é, obviamente, o veneno e sensualidade inquestionáveis de Ava Lord (Eva Green). Ava, uma mulher que fará qualquer homem transgredir, agredir, matar. Um Dwight (Josh Brolin) martirizado e contido (“Never lose control. Never let the monster out”), mas simultânea e contraditoriamente determinado, rude e corajoso, será o herói de uma das narrações.
Nancy (Jessica Alba) volta, mais mulher que menina, mais perturbada do que na primeira história, mas sempre com um anjo da guarda. Deste ou do outro mundo.
A sede de vingança direccionada ao maléfico e gélido Senador Roark (Powers Boothe), a (quase) imparável travessia de Johnny (Joseph Gordon-Levitt), a lealdade das ‘old town girls’, a quem escolhem como merecedor da sua protecção, e a interessantíssima porque subtil dicotomia Ava/Nancy – pois, em conclusão, por que tipo de mulher vale mesmo a pena… lutar? -, fazem deste trabalho um agradável sucessor do pecado original.
Esperar que esta sequela tenha o mesmo efeito surpresa do seu antecessor é meio caminho andado para a frustração. Não pode haver reacção idêntica, mesmo após tantos anos volvidos e, porventura, esquecida tanta da magia e decalque que se fizeram sentir entre a bd e o film noir.
A verdade é que a qualidade visual, cast, e coerência do script fascinam, permitindo apagar da nossa memória, durante quase duas horas, derrapagens cinematográficas das quais, injustamente e sem se perceber porquê, talvez não exijamos tanto.
Quem sabe estejamos perante um custoso desapego às origens. De uma nova forma de resistência às sequelas. E que, noutros casos, bem sabemos, se justifica.
Quem sabe – e sem prejuízo dos casos em que, sem mais, não se tenha apreciado a película, o que há que respeitar -, se trate de um Difícil Adeus.
“Well, I’m gonna find that son of a bitch that killed you, and I’m gonna give him the hard goodbye.”
Marv in “Sin City”
Sofia Melo Esteves
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