Stephen Thrower

Stephen Thrower à MHD | “É muito raro gostar de um filme se não gostar da sua música”

Stephen Thrower vai fazer parte do painel de jurados, nesta edição de 2018 do MotelX, e aproveitámos para lhe colocar algumas questões acerca do mundo do terror.

Famoso pelas suas bandas sonoras de filmes de terror, Stephen Thrower vai fazer parte do júri nesta 12ª edição do MotelX, que decorre de 4 a 9 de setembro, em Lisboa, passando por várias salas desta cidade: Cinema São Jorge, Cinemateca Portuguesa – Museu do Cinema, entre outros. Conhece alguns dos filmes de terror preferidos de Thrower e quais os desafios de compor para este género fílmico!

Stephen Thrower
Stephen Thrower (© IMDB)

MHD: Como é que surgiu a oportunidade de ser júri no MotelX e qual a sua opinião sobre este festival?

Stephen Thrower: As minhas áreas são jornalismo de cinema e música, e eu publiquei vários livros sobre terror e temas relacionados. A primeira vez que ouvi falar deste festival foi através do promotor e DJ Mário Valente, tendo posteriormente recebido um convite da Kier-La Janisse, pelo seu Instituto de Estudos de Terror de Miskatonic. Já tinha sido convidado por duas vezes para dar palestras em Miskatonic, em eventos que decorreram em Londres – Fix uma palestra sobre os filmes de Jess Franco em 2015 e outra sobre filmes slasher [tipo de filme de terror que incluí vários assassínios por um atacante, normalmente com facas ou navalhas] natalícios. Os organizadores do festival queriam que o Instituto de Miskatonic apresentasse um conjunto de palestras no MotelX, e quando a Kier-La sugeriu alguém do Reino Unido, posso dizer, muito alegremente, que me escolheram a mim. Fui convidado para participar numa discussão com o escritor/ator/realizador Andy Nyman e aceitei logo esta oportunidade porque o seu filme “Ghost Stories” é uma obra tão poderosa e inventiva.

Esta será a minha primeira vez neste festival, por isso não sei exatamente o que esperar, mas estou muito ansioso para descobrir! Já tinha vindo a Lisboa antes: no início deste ano participei numa visita às localidades portuguesas onde o Jess Franco filmou cenas dos seus melhores filmes: “Cartas de Amor de uma Freira Portuguesa” (na Sé de Lisboa), “Necromicon” (na Torre de Belém), “A Virgem e os Mortos” (no Palácio Conde Castro Guimarães, em Cascais) e “Die Marquise Von Sade” (no Palácio de Monserrate, em Sintra). É com grande entusiasmo que estou de volta a uma região tão bonita!

Lê Também:   As 10 Melhores Bandas Sonoras de Julho

MHD: Iremo-nos focar em questões mais centradas em bandas sonoras e filmes de terror. Quais são os seus filmes de terror preferidos, especialmente filmes recentes?

ST: “Hereditário” foi muito impressionante: um estudo do poder distorcido do luto e da culpa, envolvidos numa história sobrenatural de terror. A primeira parte do filme é mais Ingmar Bergman do que “Atividade Paranormal”! Quando o filme nos introduz ao sobrenatural, as emoções do espectador estão tão confusas e alteradas que isso dá mais profundidade aos clichés, porque já se viu o quão problemáticas e traumatizadas são aquelas pessoas. Coincidentemente, “Ghost Stories” toca nalgumas das mesmas questões, também de uma maneira muito inventiva e emocionalmente honesta. Os meus filmes de terror favoritos são tantos que nem dá para os numerar a todos: O “Massacre no Texas” do Tobe Hopper é o standard de excelência. “Martin” do George Romero é o meu filme psycho favorito porque faz-nos entender a dor e a desilusão da personagem principal, mesmo que ele cometa crimes terríveis, e é ainda incrivelmente bonito estiticamente falando e muito triste. “The Beyond” do Lucio Fulci é uma mistura alquímica de elegância e repulsa, e “Os Filhos do Medo”, do David Cronenberg é outro filme de terror onde o impacto é tanto de medo como de sofrimento. Alguns dos meus favoritos de sempre estão na linha entre os filmes de terror e a arte no cinema, ou eles acabam por fugir a esse género: “Império dos Sonhos” de David Lynch, “Possessão” de Andrej Zulawski, “Irreversível” de Gaspar Noé e “Synedoche, New York”, de Charlie Kaufman (que inicialmente eram projetos de filmes de terror). Recentemente, o filme mais perturbador que vi foi a versão de Lynch de “Twin Peaks”. Não é terror clássico, mas existem imagens, sons e sentimentos nesses episódios que igualam os presentes no género de terror.

VÍDEO | STEPHEN THROWER SOBRE O FILME BEYOND TERROR

MHD: Quais são as principais diferenças entre compor para um álbum e compor música especificamente para um filme?

ST: Principalmente é o facto de que estás a trabalhar através dos requisitos de outra pessoa. Tens de encontrar algo que tanto é satisfatório para ti como para essa pessoa. Nos meus projetos como “Cyclobe” e “UnicaZürn”, há obviamente menos restrições porque nós podemos fazer as coisas à nossa maneira. Mas isto não quer dizer que é insatisfatório trabalhar em bandas sonoras – antes pelo contrário. Eu acho-o bastante estimulante. É tanto um desafio como uma maneira nova de inspiração. As imagens e a visão do realizador dão-te ideias que provavelmente não apareceriam por ti próprio, por isso é como uma colaboração para lá da fronteira entre imagem e som. De qualquer modo, comecei a trabalhar com bandas sonoras de filmes porque sou um grande admirador de Ennio Morricone, Fabio Frizzi, Bernard Herrmann, Berto Pisano e Bruno Nicolai, e se eu adoro um filme, as probabilidades de adorar também a sua banda sonora são muitas. De facto, é muito raro gostar de um filme se não gostar da sua música. Algumas pessoas dizem que não reparam na música do filme, mas eu reparo sempre, e se eu não gostar da música isso pode estragar o filme todo para mim. Nunca concordei com a ideia de que as melhores bandas sonoras são as que nem notas. Isso apenas me parece bizarro – tão bizarro como dizer que um filme tem uma boa banda sonora quando nem reparas nas suas imagens!

MHD: Concorda que o processo de criar uma banda sonora para um filme de terror é mais difícil ou desafiante, em comparação com os outros géneros?

ST: Não, até acho mais libertador! A palete de sons é maior e pode-se realmente soltar das tonalidades. Mas eu acho que tem mais a ver com a predisposição da pessoa como compositor. Eu iria achar escrever música para uma comédia romântica com um final feliz difícil, porque o meu registo emocional está mais inclinado para o lado obscuro. Posto isto, a coisa mais difícil em qualquer banda sonora, penso eu, é evitar o cliché, e isto aplica-se a qualquer caso. Existem certas estruturas musicais que se aplicam na perfeição ao terror, mas elas podem também cair no cliché. O maior desafio para qualquer pessoa que quer fazer algo individual e especial, é evitar cair numa atmosfera sonora assustadora e com linhas chocantes. Existe um mundo enorme de textura e timbre e surpresa disponível para os compositores, e o terror é uma plataforma ótima para o explorar.

MÚSICA | OUVE UMA MÚSICA DO GRUPO DE STEPHEN THROWER, CYCLOBE

MHD: Tem algum novo projeto em mente e/ou existem planos futuros de compor para filmes?

ST: Eu estou sempre em aberto para trabalhar em bandas sonoras de filmes. Recentemente compus uma suite de 20 minutos para uma curta-metragem chamada “Trouser Bar”, um filme humorístico e erótico baseado no trabalho do conhecido como o “avô da pornografia gay”, Peter De Rome. Este trabalho envolvia escrever uma banda sonora inteira no estilo de um álbum da música disco de 1976. O produtor deu-me como referência a fantástica “Try Me, I Know We Can Make It” da Donna Summer, e entretanto ocorreu-me a ideia de criar uma suite de quatro partes no idioma clássico da música disco. Foi um prazer enorme, e estou muito orgulhoso do resultado. Relativamente aos novos projetos, estou envolvido num filme experimental muito interessante, e existem algumas possibilidades de trabalhar em cinema narrativo. Ainda é muito cedo para nomear estes projetos, mas os próximos 12 meses deverão trazer alguns desenvolvimentos.

(Podes ler a entrevista original na próxima página / You can check the original interview in the next page)




MHD: How did the oportunity to be a jury in MOTELX arised and what are your thoughts on this festival?

Stephen Thrower: My background is in film journalism and music, and I’ve published numerous books on horror and related genres. I first heard about the festival from the promoter and DJ Mário Valente, after which I received an invitation through Kier-La Janisse and her Miskatonic Institute of Horror Studies. I’ve been a guest instructor for Miskatonic twice before, at events in London – I gave a presentation on the films of Jess Franco in 2015 and a talk on Christmas-themed slasher films last year. The festival organisers wanted Miskatonic to present some talks at MotelX, and when Kier-La suggested someone from the UK I’m delighted to say they asked for me. I’ve been invited to host a discussion with writer/actor/director Andy Nyman, and I jumped at the chance because his film Ghost Stories is such a powerful and inventive piece of work.

This will be my first time at the festival, so I don’t know precisely what to expect, but I’m very much looking forward to finding out! I’ve been to Lisbon before: earlier this year I took part in a documentary visiting the Portuguese locations where Jess Franco shot some of his best movies: Love Letters of a Portuguese Nun (at the Sé de Lisboa), Necronomicon (at the Torre de Belém), A Virgin Among the Living Dead (at the the Palácio Conde Castro Guimarães in Cascais) and Die Marquise Von Sade (the Palácio de Montserrate in Sintra). It’s a huge thrill to be back in such a beautiful region!

Lê Também:   As 10 Melhores Bandas Sonoras de Julho

MHD: We will focus the questions a little bit more on soundtracks and in horror movies. Which are you favourite horror movies, specially recent ones?

ST: Hereditary was very impressive: a study of the distorting power of grief and guilt, wrapped up in a supernatural horror story. For the first half of the movie it’s more Ingmar Bergman than ‘Paranormal Activity’! When it does introduce the supernatural, your emotions are so bruised and battered that it gives the clichés more depth, because you’ve seen how damaged and troubled these people are. Coincidentally, Ghost Stories touches on some of the same issues, also in a very inventive and emotionally honest way. My favourite horror films are too numerous to mention: Tobe Hooper’s Texas Chain Saw Massacre is the gold standard. George Romero’s Martin is my favourite psycho movie because it makes us understand the pain and delusion of the central character even as he commits terrible crimes, plus it’s incredibly stylish and beautiful, and so sad. Lucio Fulci’s The Beyond is an alchemical blend of elegance and repulsion, and David Cronenberg’s The Brood is another horror film where the impact is as much to do with sorrow as fear. Some of my absolute favourites are on the borderline between horror and ‘art’ cinema, or they’re films that escape genre: David Lynch’s Inland Empire, Andrzej Zulawski’s Possession, Gaspar Noé’s Irreversible, Charlie Kaufman’s Synecdoche New York (which began life as a horror project). Recently the most disturbing thing I’ve seen is Lynch’s new version of Twin Peaks. It’s not ‘horror’ per se, but there are sights and sounds and feelings in those episodes that equal anything in the horror genre.

VIDEO | STEPHEN THROWER TALKS ABOUT BEYOND TERROR

MHD: What are the main differences between composing for an album and composing music specifically to a movie?

ST: Principally it’s the fact that you’re working towards someone else’s requirements. You have to find something that is both pleasing to you and pleasing to them. With my own projects, such as Cyclobe and UnicaZürn, there’s obviously less restriction because we can steer the ship wherever we like. But that’s not to say it’s unsatisfying to work on soundtracks – quite the opposite. I find it very stimulating. It’s both a challenge and a new source of inspiration. The images, and the director’s vision, give you ideas that you would not have arrived at on your own, so it’s like a collaboration across the border between image and sound. I’m steeped in movie soundtracks anyway: I’m a long-time admirer of Ennio Morricone, Fabio Frizzi, Bernard Herrmann, Berto Pisano, Bruno Nicolai, and if I love a film the chances are I love the soundtrack too. In fact it’s very rare that I fall in love with a movie if I don’t like the music. That’s probably because, as a musician, I can’t just ignore the soundtrack. Some people say they don’t really notice film music, but I always do, and if I don’t like the music it can really spoil the film for me. I’ve never agreed with the idea that the best movie soundtracks are the ones you don’t notice. That just seems bizarre to me – as bizarre as saying that if a film has a good soundtrack you shouldn’t notice the images!

 

MHD: Do you think the process of creating an horror movie’s soundtrack is more difficult or demanding, compared to the other genres?

ST: No, if anything it’s more liberating! Your sound pallette is bigger and you can really cut loose from tonality. But I guess it’s mostly about your predisposition as a composer. I would find a cheerful romantic comedy difficult to write music for, because my emotional register is tilted towards the darker side. That said, the hardest thing with any soundtrack, I should think, is to avoid cliché, and that’s true for anything. There are certain musical structures that work perfectly in horror, but they can also feel kind of clotted and silted up with cliché. The biggest challenge, for anyone who wants to make something individual and special, is to avoid falling into off-the-peg ‘shock cues’ or ‘spooky atmospheres’. There’s an enormous world of texture and timbre and surprise available to composers, and horror is a great platform from which to explore it.

MUSIC | LISTEN TO A SONG FROM STEPHEN THROWER’S GROUP, CYCLOBE

MHD: Do you have any new projet in mind and/or are there any future plans to compose for movies?

ST: I’m always open to working in film scoring. I recently composed a twenty-minute suite for a short film called Trouser Bar, a humorous erotic film based on the work of the celebrated ‘grandfather of gay porn’ Peter De Rome. The commission involved writing an entire musical score in the style of a 1976 disco record. The producer gave me Donna Summer’s amazing “Try Me, I Know We Can Make It” as a reference point, and then I ran with the idea and created a four-part suite in the classic disco idiom. That was just a huge pleasure, and I’m very proud of the result. As for new projects, I’m involved in a very interesting experimental film at the moment, and there are a few more possibilities for narrative cinema on the horizon. It’s too early to name these projects but the next twelve months should see some exciting developments.

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *