Vikings | Terceira temporada em análise

 

Vikings continua a ser uma das melhores séries na televisão actual, assim como das mais subestimadas. Espero portanto que esta análise contribua, embora de forma modesta, a mudar essa situação. Vikings merece ser vista, merece ser apreciada, celebrada, comentada. Merece ser elogiada de forma veemente pela sua qualidade narrativa e estética, assim como pelo seu rigor histórico. (Não é por casualidade que se trata de uma produção do canal história).

Para quem ainda não viu as primeiras duas temporadas de Vikings, a série recria a aurora da Era Viking, quando os homens do norte começaram a aterrorizar os povos de toda a Europa. A primeira temporada narra a ascensão do grande líder viking Ragnar Lothbrok, que guiou os seus rumo às suas primeiras conquistas em terras inglesas. A segunda temporada continuou a explorar as temáticas introduzidas na primeira, nomeadamente, a transformação de Ragnar de campesino em senhor da guerra, o começo da Era Viking, a fascinante sociedade dos guerreiros do norte, assim como a influência da religião nas sociedades medievais, fosse ela viking, inglesa, francesa ou qualquer outra.

Estas temáticas centrais continuam a ser exploradas na terceira temporada. Ragnar permanece igualmente como foco central da narrativa, embora a galeria de personagens secundárias continue a expandir-se e a receber bastante atenção por parte dos criadores. Apesar disso, Ragnar continua a ser a grande estrela e a melhor personagem da série. Antes da estreia de Vikings há três anos quase ninguém conhecia este nome, Ragar Lothbrok. Espero que agora ele passe a fazer parte do vocabulário das novas gerações, tal como Napoleão, Espártaco, Che Guevara ou Alexandre. Ragnar personifica muitas das qualidades do seu povo, tal como coragem, audácia, astúcia força, beleza, curiosidade, inteligência e pragmatismo. Ragnar é um dos grandes homens do nosso passado, e a sua história merece ser contada de forma tão brilhante como o canal história tem feito até à data.

ragnar vikings

Se gostaram das duas primeiras temporadas, a terceira não dececionará. Talvez não chegue a ser tão brilhante como a segunda (a melhor até agora) mas em geral o nível foi mantido. Como tal, a terceira temporada de Vikings brindou-nos com dez horas de uma narrativa absorvente, logrando transportar-nos uma vez mais para uma Europa do norte brutal recheada de machados de guerra, homens e deuses vivendo em uma sangrenta comunhão, massacres esporádicos e grandes aventuras em terra e mar.

Porém, ao contrário das suas predecessoras, esta temporada carece de uma estrutura sólida. Está dividida em duas partes que pouco têm a ver uma com a outra. A primeira metade é passada maioritariamente em Inglaterra, enquanto os últimos episódios têm lugar em França, concretamente em Paris.

A ausência de uma narrativa clara, capaz de cobrir toda a temporada, pode e deve ser vista como uma falha e como o maior defeito desta terceira entrega. As duas primeiras assemelhavam-se a longos filmes, cada uma com um princípio, um meio e um fim e com uma trama central facilmente identificável. Algo que não se pode dizer desta temporada, na qual não tivemos direito realmente a nenhuma resolução definitiva.

Como em qualquer obra narrativa, ter uma estrutura sólida é fundamental, e como tal geralmente as melhores temporadas de séries de televisão conseguem oferecer aos telespectadores uma experiência razoavelmente completa sem destoar da narrativa geral da série em questão. Isto é algo que Vikings conseguiu realizar à perfeição em anos anteriores mas que desta vez não aconteceu. Mesmo assim, é importante repetir que, em termos gerais, a série reteve a sua qualidade habitual, dando-nos alguns episódios realmente fora de série nos últimos meses.

Provavelmente os melhores episódios da temporada foram os últimos três ou quatro, ou seja, aqueles ambientados em Paris. Embora os capítulos centrados em Inglaterra tenham sido razoavelmente bons, a série só descolou realmente quando os vikings chegaram a França, com a intenção de “estabelecer contacto” com uma nova civilização. Estes últimos episódios foram dedicados à conquista de Paris, e certamente não dececionaram. Por mais interessante que possa ser observar os costumes dos vikings em tempo de paz, a verdadeira expressão desta cultura só se pode encontrar na ponta afiada de uma espada ou na lâmina sangrenta de um machado. Não é de estranhar portanto que a série encontre os seus melhores momentos nos campos de batalha da Europa do norte. A carnificina dos últimos episódios foi explorada de forma igualmente realista e poética, misturando o horrendo com o sublime de forma magistral. Essa talvez seja a maior qualidade da série e voltou a ser exibida nos episódios “parisinos”.

Isto não quer dizer que os episódios ambientados em Inglaterra não tenham sido bons, simplesmente não foram tão bons como aqueles passados no outro lado do canal. Enquanto os episódios “franceses” foram marcados pela guerra, os “ingleses” mostraram-nos uma situação de suposta cooperação entre duas civilizações extremamente diferentes: a Inglaterra cristã e a Escandinávia pagã. A verdade é que mesmo numa situação teoricamente de paz, acabamos por ter direito a um massacre, que deixou claro que as alianças forjadas entre os dois reis e os dois povos eram na verdade traições planeadas. (Certamente no caso dos ingleses e possivelmente no caso dos vikings) O rei saxão Ecbert erigiu-se nesta temporada como o maior rival de Ragnar, mostrando ser extremamente carismático, complexo, traiçoeiro. Ecbert parece ter ganho o primeiro round da guerra fria contra Ragnar, o seu suposto aliado.

ragnar ecbert vikings

Como praticamente todas as grandes séries, uma das prioridades de Vikings é claramente o desenvolvimento das suas personagens. Embora Ragnar seja inequivocamente o personagem principal, ao longo de três temporadas a série desenvolveu de forma lenta mas constante um leque amplo e variado de personagens secundárias complexas e bem trabalhadas. Lagatha, Rollo, Bjorn, Floki e Athelstan são as mais destacadas (além do já mencionado Ecbert), mas não são as únicas.

Gostaria de terminar por destacar Floki e Athelstan que desde o início da série têm competido pela honra de ser considerados o melhor amigo e confidente mais próximo de Ragnar. Esta disputa tem-se tornado progressivamente mais intensa e amarga, e nesta temporada alcança o seu auge. O que é interessante é que Floki e Athelstan são, na verdade, símbolos. Inglaterra contra Escandinávia. O deus cristão contra os deuses pagãos. O duelo entre ambos não é somente um duelo entre dois homens, é também um duelo entre os deuses. Ragnar, o rei pagão, vê-se, através de Athelstan, exposto e seduzido por uma nova religião que ameaça a sua própria identidade. Neste sentido, o próprio Ragnar pode ser visto também como um símbolo. Um símbolo da civilização viking como um todo, dividida entre os seus deuses pagãos e o deus estrangeiro que eventualmente decidiram adotar.

ragnar cristianismo vikings

Conclusão:

A última temporada de Vikings não é perfeita. Apesar de contar com alguns episódios excelentes, a temporada como um todo não apresenta a consistência das suas predecessoras. Não há realmente um fio condutor capaz de unir todos os episódios, e essa falta de consistência parece-me suficiente para deduzir-lhe alguns pontos. Ainda assim, uma temporada razoável de Vikings é melhor do que uma temporada excelente de praticamente qualquer outra série actual. Se ainda não começaram a ver esta série não percam mais tempo, asseguro-vos que não ficarão decepcionados.

 

Aspetos Positivos:

  • Ragnar vs Ecbert
  • Floki vs Athelstan
  • Vikings em Paris!

 

Aspetos Negativos:

  • Pouca consistência

 

Nota: 8/10

 

Bruno Vargas

 

 

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