Bastille Day – Missão Antiterrorista, em análise

Em Bastille Day – Missão Antiterrorista, Idris Elba e Richard Madden aventuram-se pelas ruas de Paris numa narrativa de ação com desconfortáveis paralelos à atualidade.

Bastille Day

Depois do sucesso de A Verdade da Mentira em 1994, James Cameron esteve durante alguns anos a considerar fazer uma sequela para o seu filme. No entanto, depois do 11 de Setembro, essa ideia foi rapidamente descartada porque, segundo o próprio Cameron, nos dias de hoje, o terrorismo já não consegue ser divertido. É claro que, apesar da aparente insensibilidade do cineasta canadiano, o terrorismo dificilmente poderá ser algo divertido em qualquer contexto, mas depois da guerra contra o terror chegar ao mundo ocidental, o cinema de Hollywood mudou muito a sua abordagem a essa polémica temática. Com o passar dos anos, começámos a ver projetos onde o terrorismo era usado como forma fácil de definir uma ameaça vilanesca e assim a tragédia humana foi mais uma vez tornada numa comodidade para a indústria dos grandes blockbusters.

Mas o sucesso desse tipo de abordagens depende de algo muito específico, uma distanciação da realidade que nos permite ver as obras de entretenimento sem nelas projetar as complexidades difíceis do mundo atual. É precisamente essa distância que foi violada por Bastille Day – Missão Antiterrorista. Quando o filme ia estrear internacionalmente no primeiro trimestre do ano, teve de ser adiado devido aos ataques a Paris. Já perto do feriado a que lhe deu o nome, este thriller de ação foi então distribuído em vários mercados, mesmo no francês. Parecia que os produtores tinham conseguido desviar-se do desastre, mas então aconteceu o ataque em Nice no dia da Bastilha de 2016 e, de repente, era impossível olhar para um filme sobre um esquema terrorista a acontecer nesse mesmo dia pelas ruas de Paris com qualquer tipo de distanciação açucarada. Em França, Bastille Day foi prontamente retirado dos cinemas e os países em que ainda não tinha estreado viram a sua estreia ser ainda mais atrasada e é exatamente por isso que só agora em setembro é que o público português pode ver esta obra.

Bastille Day

É certo que ver algo tão dolorosamente real como um ataque terrorista em França ser tornado em entretenimento barato é algo desconcertante, mas não vamos fingir que estamos perante uma grande mostra de apropriação desenvergonhada da parte dos estúdios. Mais do que uma capitalização do pânico mediático que se nota na atualidade, Bastille Day é uma espécie de filme de ação Euro Trash à moda antiga, relembrando projetos semelhantes dos anos 70 e 80, quando cineastas americanos e britânicos viravam as suas câmaras para a Europa continental para se luxuriarem nos seus cenários e dar aos seus projetos de ação um toque de relativo exotismo e ar de chique. O grande problema desta aventura é mesmo a sua estética pseudo realista, porque tirando isso estamos no mundo do irracional cinema escapista. Na sua essência, este filme é mesmo uma versão moderna das narrativas descabidas que tanto deliciaram espetadores no passado, quando tais histórias eram protagonizadas por James Bond ou outro aventureiro cheio de estilo.

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E por falar em James Bond, Idris Elba tem sido um dos nomes mais apontados como candidato a ser o próximo 007 do grande ecrã, e é neste filme que ele realmente parece estar a dizer ao mundo e a todos os produtores de Hollywood quão preparado ele está para esse desafio. O seu papel aqui é quase o que resultaria se alguém pegasse em Luther e no James Bond de Daniel Craig e os fundisse num híbrido musculado e sempre pronto a resolver qualquer situação com uma boa dose de precisa violência. Elba é Sean Briar, um agente especial sem paciência para regras em que se vê envolvido na investigação de um ataque terrorista em Paris e em que o principal suspeito é um carteirista americano, que na verdade apenas se envolveu nestas tramas porque roubou uma mala com uma bomba no seu interior.

Bastille Day

Esse carteirista é interpretado por Richard Madden e, tem que se admitir, o ator escocês é completamente ofuscado pelo carisma de estrela de cinema que Elba irradia naturalmente e sem esforço nenhum. Só mesmo nas suas cenas a solo é que o ator famoso por ser Robb Stark consegue exibir alguma presença marcante, nomeadamente numa cena em que o carteirista provoca o caos dentro de um bar, e a sua introdução na escadaria em frente ao Sacré Coeur onde ele serpenteia por entre a multidão e esvazia os bolsos dos turistas enquanto uma colaboradora sua desfila despida pelo espaço público. Na verdade, as introduções dos dois protagonistas dizem-nos logo tudo o que precisamos de saber sobre o seu impacto no filme, pois enquanto Madden vai aparecendo e desaparecendo por entre as massas de gente, Elba é uma presença estática e imponente, cujo reflexo se sobrepõe à Torre Eiffel sobre a cidade noturna. Aí Elba parece um predador a observar o seu futuro terreno de caça e, sem mover um músculo, ele captura a nossa atenção completa.

A comparação de Elba a um predador é bem apta quando mais tarde os dois protagonistas se encontram numa sequência de perseguição que tem vindo a ser muito celebrada pela crítica internacional. De telhados, a escadas apertadas de prédios até um mercado local, a câmara do realizador James Watkins muda de registo com uma ousadia tremenda, criando um pandemónio visual ao estilo dos primeiros filmes de Jason Bourne sob a direção de Paul Greengrass. Tal comparação não é de todo injusta pois Bastille Day está praticamente a suplicar às suas audiências que pensem nele como o próximo Bourne, copiando alguns planos de um modo tão descarado que quase se poderia insinuar o plágio.

Bastille Day

A grande diferença entre as perseguições de Jason Bourne por cidades europeias e essa prolongada corrida entre Elba e Madden pela paisagem urbana parisiense, é que Greengrass sempre demonstrou uma mestria e precisão que Watkins simplesmente não consegue reproduzir. Um dos maiores problemas da sequência, por exemplo, é o modo como o realizador não consegue telegrafar de modo coerente a distância entre os dois elementos humanos, fragmentando os acontecimentos de um modo não imersivo (como em Bourne), mas sim desastradamente caótico. Muito melhor que a perseguição nos telhados é, na verdade, uma luta dentro de uma carrinha em movimento, onde a claustrofobia do espaço móvel dá um toque frenético ao momento e torna o caos visual e sonoro numa boa tradução da experiência sofrida pelas personagens.

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Apesar dessas fragilidades, há que dizer que, enquanto filme de ação, Bastille Day – Missão Antiterrorista é uma obra perfeitamente eficiente e prazerosa. Este é o tipo de filme que foi construído para ser visto com o cérebro desligado e nesse contexto há pouco que ofenda na sua execução. Apenas algumas coisas como a sua incompetência em lidar com personagens femininas ou a sua triste ligação à realidade presente é que pedem algum escrutínio mais abrasivo, pois mesmo as suas mais fracas facetas narrativas são desculpáveis quando consideramos o tipo de Euro trash cheio de ação, lutas e gritaria de que estamos a falar. Está longe de ser original, mas Bastille Day é um aceitável objeto de entretenimento e uma grande showcase para os talentos e carisma de Idris Elba.

Bastille Day

O MELHOR: Idris Elba.

O PIOR: Para além das fragilidades da montagem e a estupidez do argumento, onde o terrorismo é só uma ferramenta para um convoluto assalto ao banco nacional de França, o modo como James Watkins desperdiça a presença da atriz Kelly Reilly é imperdoável.


 

Título Original: Bastille Day
Realizador:  James Watkins
Elenco: Idris Elba, Richard Madden, Kelly Reilly, Charlotte Le Bon, José Garcia
NOS | Ação, Thriller, Drama | 2016 | 92 min

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CA

 

2 thoughts on “Bastille Day – Missão Antiterrorista, em análise

  • Bastille Day – Missão Antiterrorista: 4*

    Um thriller intenso com muita ação, recomendo pois é bastante bom.

    Cumprimentos,

    Frederico Daniel!

  • O enredo foi muito bom, o filme é altamente recomendado. Idris Elba fez um excelente trabalho, seus trabalhos sejam impecáveis e sempre conseguem transmitir todas as suas emoções. A torre negra filme é um dos seus filmes mais recentes dele, é maravilhoso! Este ator nos deixa outro projeto de qualidade, de todas as suas filmografias essa é a que eu mais gostei, acho que deve ser a grande variedade de talentos. O ritmo é bom e consegue nos prender desde o princípio.

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