Berlinale 67 (Dia 4): ‘Una Mujer Fantástica’ no caminho de vencer!
‘Una Mujer Fantástica’, o novo filme do realizador chileno Sebastián Lelio (‘Gloria’) é para já uma dos maiores candidatos a um Urso de Ouro da Berlinale e ainda estamos a meio da competição oficial.
Atrás desta afirmação há um historial deste realizador com festival, pois Sebastián Lelio regressa agora à competição da Berlinale, quatro anos depois do êxito que foi Gloria, — tinha merecido na altura o Urso de Ouro — e que valeu a Paulina García, um Urso de Prata de Melhor Actriz 2013. Lelio é sem dúvida um dos realizadores mais prometedores e inteligentes da América Latina — recordo os seus filmes Navidad, (2009) ou El Ano del Tigre (2011). Depois de um período que viveu aqui em Berlim para escrever o argumento de Una Mujer Fantástica, está agora em Londres a terminar a rodagem de Disobedience, o seu novo filme e o primeiro em inglês com Rachel Weisz e Rachel McAdams, seguindo de certo modo as pisadas do compatriota e sócio Pablo Larraín.
Vê trailer de: Una Mujer Fantástica
Em Una mujer fantástica, tal como no anterior, Lelio filma com grande sensibilidade e intimidade o universo feminino, com grandes planos de rosto e desta vez através do olhar poderoso e belo de Marina (interpretada pela cantora lírica e actriz Daniela Vega no seu primeiro papel como protagonista). Marina é uma mulher transexual que trabalha como empregada de mesa e aspirante a cantora, que tem de enfrentar a morte inesperada do seu namorado, Orlando (Francisco Reyes), um homem separado e 20 anos mais velho. Além do luto, Marina vai ter que lidar com a familia conservadora do namorado, inclusive com a agressividade psicológica da ex-mulher (Aline Kuppenheim) e do filho. E todos parecem insinuar a participação de Marina na surpreendente morte do seu familiar.
Embora haja inegáveis semelhanças com Gloria no que diz respeito ao magnetismo de ambas as personagens femininas, Una Mujer Fantástica está longe do impressionismo agridoce do filme anterior. É muito mais duro e sensível. A temática do transgénero coloca outro tipo de questões e estas não passam apenas pelas de um filme queer ou de orgulho LGBT. Una Mujer Fantástica é uma bela história de amor, perda, luto e resiliência, com uma grande dimensão humana e uma estrutura narrativa firme e ajustada, muito semelhante aos grandes melodramas do cinema clássico. Poder-se-ia dizer que há algumas piscadelas de olho a Almodóvar ou a Louis Malle, mas há de facto muito mais autenticidade do cinema de Lelio.
E depois Una Mujer Fantástica não é apenas um filme no feminino, pois desta vez Lelio explora ainda com muita subtileza a ideia de um personagem masculino de meia-idade, — embora tenha uma escassa participação, está sempre presente — com vontade de viver intensamente o último terço da sua vida, e tendo como pano de fundo o ambiente da classe média-alta e o conservadorismo burguês da sociedade chilena, extrapolando-os depois para uma dimensão universal. Sobretudo faz passar a ideia de que o mundo tem em relação à igualdade de géneros: Marina está preparada para o mundo, o mundo é que não está ainda preparado para ela! Portanto vamos a ver se é desta que Lelio leva para casa um já mais que merecido Urso de Ouro.
JVM em Berlim