Este filme com Blake Lively é o thriller mais intenso dos últimos anos da Netflix
Há atores que conseguem extraordinariamente carregar um filme nos ombros, mas Blake Lively fez mais, sobreviveu a um tubarão.
A solidão no cinema raramente é tão literal — ou tão letal. Imaginem uma narrativa em que o protagonista não tem aliados, vilões secundários ou sequer figurantes para trocar olhares. Só ele, a câmara e uma situação insustentável. É um território onde apenas os mais carismáticos sobrevivem. Figuras como Tom Hanks (“Náufrago“) ou James Stewart (“The Spirit of St. Louis“) já provaram que, com talento, até uma bola de voleibol se torna um coprotagonista memorável. Mas e quando o desafio não é conversar com uma bola, mas escapar às mandíbulas de um tubarão?
Como Blake Lively redefiniu o seu legado
Se “Gossip Girl” (Netflix) consagrou Blake Lively como ícone de estilo, “The Shallows” (Netflix) devia tê-la elevado ao panteão das grandes intérpretes do cinema de género. A premissa é simples: uma surfista (Nancy Adams) fica presa num recife, a 200 metros da praia, enquanto um grande tubarão branco patrulha as águas. Nancy Adams, a médica em luto que enfrenta o tubarão, não é uma heroína invencível. Ela sangra, hesita, desespera. Lively não recua em mostrar a fragilidade física: o sal racha os lábios, as feridas infecionam, os músculos tremem de exaustão. É uma performance que exige mostrar, não dizer — e aqui, cada olhar de pânico ou suspiro rouco é mais eloquente que um monólogo.
O paralelo com Ryan Reynolds, o seu marido, é inevitável. Em “Enterrado Vivo” (2010), Reynolds passou 95 minutos dentro de um caixão, dependendo apenas da voz e expressões faciais. Ambos os filmes são exercícios de claustrofobia, mas Lively enfrenta um adversário adicional: o espaço aberto. O oceano é, ao mesmo tempo, prisão e ameaça. E enquanto Reynolds usou o humor para aliviar a tensão, Lively não tem essa muleta. A sua personagem não brinca com o perigo; ele é palpável, visceral.
Assim, o sucesso de “The Shallows” reside na credibilidade. Não há truques de CGI excessivos ou diálogos forçados com gaivotas (sim, “Náufrago”, estamos a olhar para ti). Blake Lively comunica através do corpo: uma mão a tremer ao costurar uma ferida, os ombros que se curvam sob o cansaço, os olhos que alternam entre determinação e desespero. É inegavelmente uma aula de atuação económica.
A anatomia de um filme de um só ator
Para que um filme solitário funcione, três elementos são cruciais: um ator carismático o suficiente para prender a atenção, um físico que conte uma história silenciosa e um contexto plausível que justifique a solidão. Blake Lively acerta nos três. Nancy não está isolada por acaso; a sua luta é uma metáfora para o luto que a trouxe àquela praia. Cada ferimento no ecrã reflete uma ferida emocional. E, tal como James Franco em “127 Horas” (2010), a degradação física é gradual, quase documental.
Mas há um quarto elemento invisível: a realização. Jaume Collet-Serra (“A Orfã“) usa planos aéreos para enfatizar a insignificância da protagonista no oceano, e planos tão apertados que quase sentimos o sal na pele. A câmara nunca a abandona, criando uma intimidade claustrofóbica. E, no entanto, é Blake Lively quem comanda cada cena. Até o tubarão, quando finalmente aparece, parece secundário perante a sua determinação.
Curiosamente, estes filmes revelam inegavelmente mais sobre um ator do que uma carreira inteira. Reynolds, em “Enterrado Vivo”, mostrou uma dramaticidade rara; Hanks, em “Náufrago”, provou que até uma bola pode roubar cenas. Assim, Lively demonstrou que o seu alcance vai muito além de comédias românticas.
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