"Batman Regressa" | © Warner Bros.

Cinema Natalício | Batman Regressa (1992)

Nestes tempos festivos, vamos celebrar o cinema natalício aqui pela Magazine.HD com uma minissérie sazonal. Assim daremos destaque a várias fitas apropriadas para as festas e disponíveis para o público português, quer sejam escolhas mais tradicionais ou algumas seleções mais inusitadas. Para começar, temos um desses filmes inesperados que, no entanto, está repleto de imagética do Natal. Trata-se de “Batman Regressa” de Tim Burton, um deslumbrante sonho de Expressionismo à la Hollywood com prestações inesquecíveis por parte de Danny DeVito e Michelle Pfeiffer, como o Pinguim e Catwoman respetivamente.

Depois do sucesso de “Batman” em 1989, a Warner Bros. estava desejosa por repetir a proeza, dando todos os recursos possíveis a Tim Burton para realizar uma sequela blockbuster. A liberdade artística deu aso a um filme que funciona melhor como um objeto de cinema de autor do que como seguimento às aventuras do Cavaleiro das Trevas em Gotham City. Não quer dizer, contudo, que seja mau trabalho. Pelo contrário, trata-se de um dos mais originais filmes de super-heróis já feito, em parte porque faz com que o heroísmo de banda-desenhada seja secundário a uma narrativa de figuras ostracizadas, grotescas personalidades renegadas às sombras.

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© Warner Bros.

Aliás, no primeiro quarto do filme, o Bruce Wayne de Michael Keaton raramente aparece, sendo uma presença periférica aos antagonistas virados protagonistas. Note-se como a história começa, bem longe desse homem-morcego, seus lares e mistérios. Ao som de uma banda-sonora mirabolante de Danny Elfman, “Batman Regressa” abre com uma tragédia natalícia. A câmara aproxima-se de uma mansão imensa, penetrando a paisagem invernal como se estivesse entrando numa bola de neve agitada por mão miúda. Essa ideia de inocência é depressa contrariada pelos epítetos de crueldade que nos esperam dentro do casarão.

Estamos perante as origens vilanescas de Oswald Cobblepot, mais conhecido como Pinguim, cujas deformidades físicas levaram à rejeição parental. Tentando livrar-se do bebé com aspeto de monstro, os pais atiram a criatura no rio, mas sua cesta flutua em jeito de Moisés. Perdido nos esgotos, o menino é encontrado por pinguins, também eles abandonados nos resquícios de um jardim zoológico arruinado. Passam trinta e três anos num corte judicioso e observamos como o Oswald crescido testemunha a folia do mundo superior através dos seus confins, mãos em forma de barbatana em silhueta perante uma enorme árvore de Natal em praça pública.

Ao longo de “Batman Regressa,” iremos testemunhar como o abandono e preconceito da gente ‘normal’ fomenta o ódio em Oswald. Como um terrorista manipulador, ele sobe as hierarquias sociais de Gotham, torna-se candidato à câmara e chantageia um milionário antes de retornar às ambições terroristas. Sua missão é castigar uma cidade que a câmara observa com semelhante escárnio. A beleza moribunda de 1989 foi substituída por algo mais ameaçador, como se toda a metrópoles fosse um monumento fascista coberta com esquálidas decorações natalícias. De facto, o cenário festivo serve para salientar a hipocrisia daqueles no poder.

Em paralelo à narrativa do Pinguim, perscrutamos outra origem de inimigo icónico. Trata-se de Selina Kyle, futura Catwoman, cujos dias são passados em subalterna humilhação para com Max Schreck – um industrialista desumano e o antagonista mais irredimível do filme. Quando, certa noite, ela descobre planos ilícitos, o chefe trata de a silenciar, atirando-a janela fora de um arranha-céus. Disposta morta na neve, ela é ressuscitada por estranhos poderes felinos, uma vida de desrespeito e memórias dolorosas desvendando a rebeldia sanguinária dentro do âmago. A sequência de transformação é quiçá o píncaro do cinema de Tim Burton e ainda nem ultrapassámos o primeiro ato da história.

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© Warner Bros.

O Batman lá aparece, funcionando como um reflexo distorcido dos outros dois. Somos levados a crer que, noutra vida, Bruce Wayne se podia ter tornado em gente semelhante, amargurado e levado à violência. Bem, isso é mais ou menos o que lhe aconteceu, mas o enquadramento da banda-desenhada define-o como herói justiceiro. Assim temos as três estrelas do conto: o vilão Pinguim, a anti-heroína Catwoman, e o putativo super-herói Batman. Burton, seus atores e equipa criativa passarão mais de duas horas explorando a relação dos três, encontrando um ponto médio entre a ação bombástica, o conto-de-fadas gótico e um estudo de personagem em triplicado.

Liberado pela riqueza de recursos, o realizador dá asas à imaginação e não poupa em nada, sendo especialmente indulgente no estilo requintado e obscuro. A negrura típica do cineasta molda-se aos verdes e vermelhos do Natal, um toque de inocência contrastante e perversa, insidiosa em jeito de gémeo mau do “Estranho Mundo de Jack” que estrearia um ano depois. O formalismo é brilhante, feito em prol do entretenimento de massas que, não obstante o apelo comercial, é uma expressão de visão pura, singular, extremamente pessoal. Contudo, se forçados a escolher o melhor elemento do projeto, teríamos de prestar homenagem ao elenco, com especial destaque para a bizarria de DeVito e o melodrama dolorosamente humano de Pfeiffer. Esta última aqui oferece um dos melhores desempenhos na História do cinema de super-heróis. Diríamos mesmo que nunca ninguém a superou, tal é o génio da caracterização, desde os resvalos no romance até à euforia mórbida da vingança final.

Em Portugal, podes comprar ou alugar “Batman Regressa” através da Apple iTunes e da Rakuten TV. O filme também está disponível em Blu-Ray e DVD.


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