"Gremlins - O Pequeno Monstro" | © Amblin Entertainment

Cinema Natalício | Gremlins – O Pequeno Monstro (1984)

Produzido por Steven Spielberg, escrito por Chris Columbus e realizado por Joe Dante, “Gremlins – O Pequeno Monstro” é uma delirante comédia negra, perfeita para a época festiva. O filme que introduziu o mundo ao conceito dos monstros mogwai foi um sucesso comercial, apesar de ter perdido a guerra do box office contra “Ghostbusters,” estreado no mesmo dia em 1984. Os críticos foram menos unânimes na aclamação, mas “Gremlins” tem vindo a ser reapreciado e ganha estatuto de favorito para gregos e troianos. Seis anos depois, Joe Dante viria a assinar uma sequela estrambólica ainda melhor que o original. Entretanto, fala-se de um terceiro filme no horizonte, mas ainda não há nada confirmado.

Em meados de 1984, a Amblin Entertainment tinha uma imagem de marca muito própria, associada a entretenimento familiar saído diretamente da imaginação de Steven Spielberg. Em retrospetiva, muita da atual nostalgia pela cultura dos anos 80 é, na realidade, saudade pela era doirada da Amblin. Ou seja, sem esse estúdio, não teríamos o “Stranger Things” tão popular na Netflix. Dito isso, logo desde cedo, os cineastas começaram a subverter as expectativas, usando as presunções da audiência para lhes passar uma valente rasteira. Em certa medida, o estúdio já fazia esses jogos desde a sua génese. Afinal, “Poltergeist” é tão importante para a fundação da marca como o extra-terrestre adorável do logotipo.

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© Amblin Entertainment

Só que, tanto em “E.T.” como no terror de Tobe Hooper e nas aventuras de Indiana Jones, havia uma apologia pelos valores familiares dos subúrbios, uma sinceridade afetiva muito própria para uma América resvalando para novos conservadorismos com Reagan na Casa Branca. Rebeldia era conceito incompatível e humor subversivo ainda mais. Vem então “Gremlins,” um filme promovido como mais uma sobremesa leve da Amblin, com o adorável Gizmo em destaque e o ambiente natalício a trespassar todos os anúncios. Só depois da estreia é que se revelou o verdadeiro tom da fita nos posters e afins. Os pais que levaram os meninos ao cinema à espera de comédia extremosa estavam prestes a ter uma grande surpresa.

Apelando a absurdismo tonal e humor cruel, o primeiro grande triunfo de Joe Dante na cadeira de realizador representa uma tentativa bem-sucedida de cuspir nos preceitos do entretenimento familiar em voga na altura, Disney incluída. Seu contexto natalício é a piada mais cortante de todas, usando as festividades como cenário para contrariar toda a sua pureza. Decorações de Natal são armas do crime e um monólogo hilariante reconta como um homem morreu preso na chaminé quando tentava fazer uma surpresa aos filhos. A domesticidade suburbana é também vítima, feita para ser decepada e explodida em colorida carnificina.

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A verdade é que, na sua essência, os cineastas têm mais afinidade com os vilões do que os putativos heróis. Talvez por isso todo o enredo resulte tão bem, pois há amor a delinear até as mais horríveis façanhas. Afinal, nas boas festas, o homicídio é a melhor piada e o caos é bendito. O que são os Gremlins senão a manifestação física do caos? Convém, é claro, dar algum contexto narrativo à coisa e definir o que são os monstrinhos do título. Historicamente, um gremlin era um pequeno intruso que desmantelava aviões na Segunda Guerra Mundial. Em suma, era um símbolo demoníaco para a negligência de pilotos descuidados.

Chegados a 1984, a imaginação de Dante e companhia veio dar uma nova visão dos bichinhos traquinas. Eles são agora mogwais, um animalzinho que, na sua forma original, é como um peluche vivo. Gizmo é a mascote do filme, um presente de Natal dado ao protagonista para ser seu animal de estimação, seu novo melhor amigo. Com olhos enormes e orelhas igualmente desproporcionais, um sorriso meigo a traçar características humanoides e pelagem vermelha e branca, ele parece um sonho tornado realidade. Além disso, também é o perfeito monstrinho para um estúdio criar com a intenção de vender brinquedos. Que fã nunca desejou ter o seu próprio Gizmo?

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© Amblin Entertainment

Só há duas regras. Jamais se pode dar comida à criatura depois da meia-noite e ainda mais proibido é o contacto com a água. Já se calcula o que acontece nesta história. Quando a ofensa capital se abate sobre o idílio do monstro e seu companheiro humano, o horror brota do bicho querido. Multiplicando-se em jeito imparável, saem de Gizmo novos seres sobrenaturais. Só que estes mogwai disformes não são afáveis de todo. Eles são a desordem cósmica, máquinas de matar que só querem estragar tudo e retorcem a comédia de tal modo que o entretenimento familiar se converte em filme de terror para o público juvenil.

Não que os horrores dos “Gremlins” careçam de sangue e vísceras. Joe Dante, cineasta que adora metatextualidades e classicismo invertido reuniu aqui uma equipa de luxo, com alguns dos técnicos de efeitos especiais disponíveis na Hollywood contemporânea. Os monstros são bestiais, mas suas façanhas violentas são igualmente impressionantes. Além desses criativos, os restantes artistas por detrás deste Natal diabólico também merecem aplausos. Columbus jamais escreveu melhor argumento, misticismos Orientalistas aparte, e a banda-sonora representa uma sublime paródia da musicalidade de John Williams e seus seguidores. Jerry Goldsmith usa os sons tradicionais para contrastar com o tema dos vilões. Trata-se de uma energética composição com traços de ragtime e sintetizadores abrasivos, mostrando mais uma vez, como a história nasce do amor aos mauzões ao invés da idealização heroica. Nesta época festiva, que reine a balbúrdia e se tornem os bons costumes em pandemónio.

“Gremlins – O Pequeno Monstro” está disponível na HBO Max. Também podes alugar o filme através da MEO, Rakuten TV, e Apple iTunes.

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